Lembrança de um porre no Pará

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Por Roberto Ferreira, jornalista
Quando disserem pra você que o povo paraense é hospitaleiro e bem-humorado pode acreditar.
É verdade. Uma prova foi meu vexame ao acordar numa casa totalmente desconhecida durante férias que passei em Belém.
Acordei com calor, suando, vestido com as mesmas roupas da véspera e apenas sem os tênis.
Estava deitado numa cama de solteiro no que me pareceu ser um quarto de empregada.
No aposento apenas mais um armário de madeira e uma mesa com um aparelho pequeno de TV.
Consultei o relógio de pulso e vi que ainda não eram 8 horas da manhã.
Dia de sol forte e já muito quente àquela hora da manhã.
Levantei, olhei pela janela e percebi que estava nos fundos do segundo andar de uma casa.
Vi um quintal com um gramado bem cuidado, uma piscina pequena e, no extremo, uma construção de madeira rústica que abrigava uma churrasqueira, uma mesa e bancos também de madeira, além de uma aparelhagem de som.
Anexo ao quarto, um banheiro de dimensões reduzidas.
Lavei o rosto, molhei e penteei o cabelo, coloquei na ponta do dedo um pouquinho de uma pasta de dentes que estava sobre a pia e fiz um bochecho.
Calcei os tênis, saí do quarto e no final de um corredor encontrei uma escada.
Desci e saí na copa onde uma família, um homem e uma mulher de meia idade e três jovens (dois rapazes e uma moça) tomavam café da manhã.
Cumprimentei e imediatamente me mandaram sentar, ofereceram café com leite, suco de fruta, pão, queijo, presunto, doces, um banquete matinal.
Ainda muito confuso e constrangido aceitei apenas um café puro, enquanto eles conversavam animadamente.
Eu continuava atordoado.
Depois de alguns instantes tomei coragem e perguntei:
– Desculpem, mas quem são vocês?
Provoquei a primeira gargalhada do dia.
Um dos rapazes tomou a iniciativa de explicar.
– Você não é amigo da Léa? Não lembra que ontem de noite foi com ela para um bar? Nós chegamos pouco depois, vieram mais uns amigos e fizemos uma mesa grande. O namorado da Léa chegou logo depois, ficaram algum tempo, foram embora, mas você continuou conosco. E tomou um porre danado!!!
Aí entrei em pânico, pois não há nada pior do que alguém dizer que você tomou um porre e não lembra de nada.
Perguntei se tinha feito algo errado, se tinha sido inconveniente.
O rapaz  me tranquilizou.
– De modo algum. Você falou sobre o Rio de Janeiro, contou casos, piadas e a gente riu muito. O pessoal gostou muito de você. Só teve um problema na hora de ir embora.
Voltei a entrar em pânico.
Qual teria sido o problema?
Resposta:
– A gente ofereceu carona e perguntou para onde queria ir. Mas você só repetia que não queria dar trabalho, que morava em Copacabana. Bastaria a gente deixar você na Barata Ribeiro ou na Nossa Senhora de Copacabana e de lá você se viraria pra chegar em casa. Aí achamos melhor trazer você pra cá.
Nova gargalhada na mesa…rsrsss
Mais relaxado, agradeci, conversei mais um pouco e disse que estava na hora de ir embora.
Aí foi a vez de o dono da casa se pronunciar, em tom brincalhão e impositivo.
– Quem disse que você vai embora? Precisa pagar o favor que meus filhos fizeram resgatando você. Vão fazer um churrasco hoje, chamar os amigos e você tem que participar. É o mínimo que pode fazer em agradecimento. Estive no Rio há muitos anos, quero saber como está agora e você pode me contar.
Não tive como recusar.
O churrasco rolou a tarde toda e quando saí, já ao anoitecer, continuaram bebendo, cantando e dançando.
Mas nada de carimbó.
A rapaziada curtia mesmo era rock…rsrsss.
Isso se passou de uma noite de sexta-feira para um dia de sábado.
Ao ir embora anotei o endereço deles e, na segunda-feira de manhã, mandei flores com um cartão de agradecimento para a dona da casa.
Ainda vou voltar àquela cidade de gente alegre e bonita.
Mas só vou beber água mineral e suco de fruta.
Já gastei todos os vexames que podia dar lá…rsrsss

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