O tão falado longo passado que o Brasil tem pela frente está encontrando ambiente para ser limpo, ou seja, pacificado pela punição justa e necessária como bem observou o advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay. Nessa perspectiva, gabinete da transição em curso, comissões formadas e sendo ampliadas, a Cultura volta à institucionalidade sem medo de dar de cara com o revólver engatilhado pronto para abate-la.
Por Maria Luiza Busse, diretora de Cultura da ABI, compartilhado do site da ABI
A equipe da comissão de Cultura conta até agora com três coordenadores que são Juca Ferreira, ex-ministro da área em períodos dos dois governos do PT, a atriz Lucélia Santos, veterana das lutas democráticas e embaixadora informal das relações entre China e Brasil, e Márcio Tavares, secretário nacional de Cultura do Partido dos Trabalhadores. Para que não haja dúvida, o em breve empossado vice-presidente da República Geraldo Alckmin (PSB), coordenador do Gabinete de transição formado por 31 grupos técnicos, não cansa de repetir que o ” presidente Lula deixou claro que os que vão participar da transição não têm relação direta com o ministério, com o governo. Podem participar, podem não participar, mas são questões bastante distintas. Esse é um trabalho de 50 dias”, enfatiza.
Esclarecido, Juca, Lucélia e Marcos, têm pouco menos de dois meses para recolher e sistematizar as ideias e projetos aportados dos colegas e interessados em geral que entendem a cultura como segmento político de importância fundamental na formação subjetiva que organiza a sociedade. Não é exagerado considerar que o país entra na sua ‘Movida Brasileira’, nossa versão da Movida Madrileña, movimento contracultura de pautas libertárias e progressista nascido em Madri, nos anos de 1970, para marcar o fim do fascismo franquista que infernizou a Espanha durante 36 anos.
Gal, sempre Gal, deu voz à Movida na música Vaca Profana que Caetano fez a pedido dela nos anos de 1980. No livro Sobre as letras, de 2003, Caetano conta que se trata de uma canção sobre Gal, animal ao mesmo tempo profano e divino. “Dona das divinas tetas, Derrama o leite bom na minha cara, E o leite mau na cara dos caretas…”, um dos refrãos quemuitos de nós cantávamos por aqui naqueles idos dos estertores da ditadura e luta pelas Diretas Já.
Lá se vão 38 anos daquele 1894 em que Vaca Profana foi lançada como faixa principal do disco Profana. Há pouco, a dona das cordas vocais de guitarra de Hendrix nos deixou, assim, sem recado e sem bilhete, surpresa de impacto ainda pouco assimilado.
Gal Costa faz lembrar o sociólogo Florestan Fernandes porque ambos têm em comum o fato de serem tão profanos quanto divinos. Gal nos legou sentido nas letras que eram a sua impressão na linguagem escrita. Florestan fez o mesmo, como se lê nesse trecho de ‘Orgulho selvagem e tenacidade’ que traça caminho para construir a Movida Brasileira neste presente e futuro sem nazistas e fascistas. Lá vai: “Que seja extinta a “cultura da ignorância”, que diz que o povo não precisa nada disso para ser feliz. A nossa resposta é que o povo precisa não só de alimentos, de habitação, de assistência médica. Precisa de cultura e de consciência crítica, para ser capaz de universalizar a cidadania e contribuir para o crescimento da civilização moderna. Espírito crítico para combater não só uma elite de espirito estreito, que tornou miserável um país rico. Mas para combater esse pensamento que instrumentaliza a tecnologia e se deixa escravizar por ela, esse pensamento que leva países como o nosso a abandonar a pesquisa básica, construída pela imaginação cientifica, filosófica e artística”.