E o Bem Blogado volta com mais um sensual e preventivo miniconto – #quarentextos – da escritora e jornalista Sonia Nabarrete.
Maluco
Na pasmaceira da quarentena, o ex-liga. Ao ouvir sua voz, imediatamente vem à lembrança o vulcânico romance que viveram. Era mais sexo do que amor. Na verdade, nem era amor, mas o carinho que a mulher tem pelo homem que a satisfaz plenamente.
Melhor amante não conheceu: incansável, dedicado, generoso e cheio de criatividade. Faria sucesso como garoto de programa.
Depois de perguntar como ela estava e dizer que sentia muita saudade dos tantos rala-e-rola que protagonizaram, convidou-a para a apresentação de uma banda de rock, que marcaria a reabertura de seu bar.
Ela ficou surpresa e avisou que não iria de forma alguma se expor em plena pandemia.
Desligou e disse a si mesma: “Mas que cara maluco, onde já se viu promover aglomeração quando tem um vírus matando tanta gente? Esse cara é doido.
Pensando bem, é muito doido, e não é de agora. Já fez cada coisa… até casou comigo. Mas ignorar o vírus é burrice. Vai morrer. Pena. Tão gostoso”.
Nova ligação.
— Você me convenceu. Vou cancelar o show.
— Beleza — disse ela, suspirando aliviada, com sensação de dever cumprido. Vidas salvas e um pau para toda obra preservado.
Depois que a pandemia passar, me aguarde, suspirou.