Por Ademir Assunção, poeta e jornalista
Em 24 de agosto de 2024 Paulo Leminski Filho completará 80 anos. Como assim, “completará”, Leminski não está morto? – você pode me corrigir. Sim e não. Morto, Leminski continua mais vivo do que muitos vivos.
E neste ano em que ele completará oitentão, já percebo sinais de fumaça de que querem transformá-lo em mercadoria higienizada, palatável, rentável – bem adaptada a esses tempos de falsificações mequetrefes e negociações vergonhosas.
Para “chover no piquenique”, bem ao gosto do poeta, passo por aqui para lembrar algumas palavras que ele disse em entrevista a mim, em outubro de 1986, e que está devidamente registrada nos anais artístico-culturais deste Brasil que insiste em não abandonar sua fase anal e adia sempre para o dia de São Nunca o sonho de País do Futuro.
Preste bastante atenção:
“O negócio é o seguinte: a arte é tutelada pelo Estado ou é tutelada pelo mercado. Um dos dois mandará na arte – essas são as leis que o real quer pregar. No Ocidente, é o mercado que determina a obra de arte. O mesmo escritor que acha indecente que em Cuba o Estado financie a arte não acha indecente que seu trabalho seja tratado como mercadoria. A ideia de inutensílio é uma negação de ambas. Ela afirma que a arte não serve pra nada justamente porque só serve para o engrandecimento da experiência humana. Apenas isso”.
Paulo Leminski Filho, é bom lembrar, também escreveu poemas como este:
nunca quis ser
frequês distinto
pedindo isso e aquilo
vinho tinto
obrigado
hasta la vista
queria entrar
com os dois pés
no peito dos porteiros
dizendo pro espelho
– cala a boca
e pro relógio
– abaixo os ponteiros
*****
Prestou bastante atenção?
Podem até me deixar falando sozinho, mas os tempos mudam, e tem gente vendo, viu?
Foto: Paulo Leminski em sua casa, bairro Pilarzinho, Curitiba, por Américo Vermelho