Lidia Pena pelo Facebook

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Sem surpresas nem protestos

São guerras diárias em diversas partes do globo terrestre, motivadas pela falsa supremacia de raças, pelo narcotráfico, pelas religiões e seus fanáticos de plantão.




Aqui no Rio de Janeiro convivemos há muito tempo com intensos tiroteios e as balas perdidas que sempre matam inocentes, muitas crianças, e que têm remetente totalmente identificado: o tráfico de drogas. E também tememos o desatino de uma polícia despreparada, pronta para matar e sem nenhum pudor de cometer chacinas como a que acaba de ceifar, com cinqüenta tiros, a vida de cinco meninos inocentes, em Costa Barros, subúrbio do Rio.

Como disse o diretor de teatro e escritor Marcus Faustini em seu texto sentido, hoje no Globo: “não há nenhum exagero quando ativistas e pesquisadores apontam que existe um extermínio da juventude pobre e negra. Ele não é como nos filmes, num grande campo de concentração. Ele é pior, é dentro de nosso cotidiano, cirúrgico”. Mas, daqui a pouco, até essa dolorosa lembrança somada a outras similares, como Vigário Geral, se acomoda. E a vida continua.

Espalhado pelas comunidades carentes, com o apoio luxuoso dos endereços sofisticados da Zona Sul da cidade, onde residem os mega-empresários de armas, o tráfico, assim como o EI, costuma recrutar jovens pobres e desesperançados para a prática de seus serviços sórdidos. O narcotráfico atualmente é tido como um dos negócios mais lucrativos do mundo.

E isso envolve quase toda a América Latina, com destaque para Brasil, principal rota de cocaína, e Colômbia, Bolívia e Peru, maiores produtores. Não há mais surpresas nem grandes protestos. Parece que todos nos acostumamos com a barbárie que mata aos poucos todos os dias, desfigura famílias, destrói corações de mães, pais, avós, irmãos e amigos privilegiando as regiões mais pobres das cidades.

Na Europa, a mais recente tragédia gerada pelo fanatismo de uma parte dos muçulmanos apagou a luz de uma cidade famosa por seus reflexos de beleza e glamour em todo o mundo. A Paris do cinema vanguardista dessa vez exibiu nas telas das TVs cenas cruéis de um roteiro jamais idealizado.

Se formos levantar o número de mortos e feridos, mais de duzentos na capital francesa, numa comparação macabra, porém real, vamos constatar que o número de vítimas do tráfico de drogas, só em terras cariocas, é estatística e infinitamente maior.

O que nos leva a uma triste constatação: a distância entre as guerras contemporâneas se faz no impacto que as notícias provocam, proporcional ao calibre do poder de onde elas acontecem.

Cento e trinta pessoas assassinadas de uma só vez geram uma comoção que cinco jovens, também de uma só vez, e mais de não sei quantas mil assassinadas aos poucos, ainda que diariamente, não conseguem suscitar. E daí as conseqüentes – e tão diferentes — reações para enfrentar os crimes.
Parece estranho. Os contextos são bem diversos, eu mesma chego a pensar. Mas talvez não sejam não. Um cartaz preso à bandeira do Brasil no velório dos cinco meninos mortos cruelmente pela PM dizia: “A Síria é aqui”.

Estamos falando da derrota da vida e do triunfo da morte antecipada e brutal de seres humanos. Não importam a cor, credo, nacionalidade ou circunstância.

Lidia Pena
Novembro/2015

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