Lira perdeu o pudor: a fatura de outubro chegou

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Por Carlos Eduardo Alves, jornalista, para o Bem Blogado

Lula é político experimentado, não vai nunca transformar o mandato em coletivo de rua, mas muito talvez tenha que liderar um movimento em defesa da implantação de seu programa de governo. Se não houver quem enfrente Lira e sua turma de saqueadores agora, pode ser tarde. Eles já se assanham em tão pouco tempo do governo Lula, imagine-se o que não farão para reforçar o cofre para as disputas municipais de 2024.




Foi bonita a festa, pá. E o início do governo Lula confirmou a expectativa gerada pela vitória. Avanços imensos nas áreas sociais e o desmonte de várias atrocidades cometidas pela “administração” fascista. Existe um longo caminho ainda a ser percorrido, tamanha a destruição anterior, mas se percebe e muito as diferenças. Temos, depois de seis anos de desastre, enfim um presidente. Mas muitos perceberam só no fim de maio que outubro de 2022 representou também o maior avanço histórico das forças reacionárias em eleição parlamentar. E a grande maioria, comandada por Arthur Lira, perdeu o pudor e cerca o governo Lula, eleito pela maioria dos brasileiros.

A situação política é complexa. A malta direitista que é majoritária em Câmara e Senado foi eleita também nas urnas, daí que também não se pode questionar sua legitimidade. O próprio Lula, durante a campanha, já pregava que não se podia rechaçar a princípio a atuação dos entes políticos, por mais que discordemos deles. Lula antevia uma convivência respeitosa, que infelizmente não se tornou realidade.

Acostumados à excrescência do “Orçamento Secreto” inaugurado como forma de compra de apoio por parte de Bolsonaro, Lira tornou-se na prática dono de parte significativa dos recursos oficiais que deveriam, antes de atender interesses paroquiais, servir para implementação de políticas públicas do Executivo. O STF limitou a patifaria, mas na prática o método de chantagem sobrevive.

A derrota, e não há outro nome para definir o que ocorreu, quando uma expressiva maioria esquartejou o Meio Ambiente e a Pasta dos Povos Indígenas foi o primeiro aviso. Os saqueadores parlamentares do erário público querem verbas e cargos, principalmente verba. A voracidade despudorada é exibida com menos de seis meses de novo governo. Onde isso vai parar? O que o governo pode fazer para defender o programa escolhido pela maioria no pleito presidencial?

É um momento decisivo no conflito anunciado desde que a direita e a extrema-direita venceram a disputa pelas vagas parlamentares. Não há solução fácil, pois se trata, utilizando um jargão jurídico, de “vício de origem”, ou seja, as mesmas urnas que deram a vitória a um presidente da República de esquerda consagraram o triunfo reacionário na Câmara e Senado. Lula é um conciliador por natureza, mas provavelmente vai ter que partir para uma espécie de enfrentamento antes que lhe tomem anéis e dedos.

Tradicionalmente, Parlamento e Judiciário só arredam pé de suas posições conservadoras quando há pressão popular. Não se vislumbra outro cenário para o cotejo com os usurpadores. Foi a falta de uma rua forte, aliás, que permitiu o sucesso do golpe contra Dilma.

Não é uma tarefa simples. A base social que elegeu Lula não tem recentemente o hábito de levar para o asfalto suas reivindicações, com exceção de algumas franjas, corajosas e combativas mas pequenas diante da gigantesca população do Brasil. As primeiras medidas econômicas do novo governo, como o renascimento e fortalecimento do Bolsa Família, ainda demandarão mais algum tempo para fazer diferença marcante na vida dos contemplados pelo programa.

Rede social, no caso da esquerda, pelo menos até hoje, nunca garantiu presença expressiva de gente nas ruas. Não há no Brasil de hoje, infelizmente, qualquer possibilidade de visibilidade de uma manifestação popular sem a participação de Lula, único líder progressista com capilaridade nacional.

Lula é político experimentado, não vai nunca transformar o mandato em coletivo de rua, mas muito talvez tenha que liderar um movimento em defesa da implantação de seu programa de governo. Se não houver quem enfrente Lira e sua turma de saqueadores agora, pode ser tarde. Eles já se assanham em tão pouco tempo do governo Lula, imagine-se o que não farão para reforçar o cofre para as disputas municipais de 2024.

Repita-se, não é uma decisão simples, mas ceder sempre para a direita e extrema-direita parlamentar, alicerçada principalmente no agro mais ogro possível, colocará em risco todo o projeto de recuperação da civilidade do País. Tem gente ruim que só se aquieta quando ouve ronco forte vindo do asfalto.

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