Lula enfrenta o fantasma da inflação

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Por Carlos Eduardo Alves, jornalista, para o Bem Blogado

Sempre que se ouvir a conversa que “um pouco a mais de inflação é aceitável”, desconfie. Uma fatia relevante da sociedade não aceita mais o fantasma. Lula sabe disso. Tem muito a ensinar. A vida é a melhor escola da realidade.




Um dos fantasmas que a direita criou na última campanha eleitoral contra Lula foi o da inflação. Segundo os propagadores do pânico, a volta do petista ao Palácio do Planalto traria obrigatoriamente um descontrole total dos preços, tornando a vida ainda mais difícil. Obviamente, isso não aconteceu.

Lula é macaco velho, viveu como trabalhador o inferno da época dos reajustes diários nos supermercados e sabe que a primeira vítima da carestia é aquela que já pouco ou nada tem. As previsões catastrofistas se frustraram e há até um sentimento de certo alívio pela queda nos valores de alguns itens, principalmente de alimentação.

Existe, é verdade, a incompreensão de algumas pessoas no campo progressista sobre o papel devastador da inflação na vida de quem não é rico. Os mais abastados, de uma maneira ou outra, conseguem se defender do demônio, mas os pobres não. Temos exemplos aqui no Brasil e na Argentina, sem falar da Venezuela, sobre o papel do aumento de preços na Política.

Foi o Plano Real sobretudo, e o freio que impôs a uma inflação galopante, que permitiu duas vitórias eleitorais em corridas presidenciais consecutivas ao atualmente moribundo PSDB. Lógico que outros fatores como campanha suja contra o PT também contribuíram, mas o fato é que ao Plano Real foi creditado o êxito no combate contra a inflação e Fernando Henrique Cardoso, embora não fosse de fato o autor do projeto posto em prática, colheu os louros.

Na ocasião, o PT errou feio no diagnóstico ao subestimar o efeito que a derrota da inflação teria no resultado eleitoral. Os autores do equívoco de então são como os pais teóricos daqueles que hoje contrapõem o combate à alta dos preços a uma política desenvolvimentista. É possível calibrar e ajustar as duas expectativas, Lula ensina.

Mais recentemente, no fim do ano passado, expressiva maioria do povo argentino levou à Presidência dos nossos vizinhos um fascista, fato inimaginável depois que o país superara uma cruel ditadura militar.

E o que aconteceu em país com ainda indicadores sociais melhores do que os nossos? Ninguém aguentava uma inflação anual de quase 150%, incapaz de ser controlada pelo governo de centro-esquerda do peronismo. Preferiu-se um insano e exótico ao diabo inflacionário.

Não bastaram as advertências que a solução proposta por Javier Milei implicava em mais miséria e, ao menos no início de governo, em inflação ainda mais acelerada e cruel.

Não se sabe o que acontecerá na Argentina. Mas, para quem observa com atenção a cena política do país, não é possível escapar da conclusão de mesmo com os absurdos atuais na Casa Rosada (a vida do argentino está ainda mais difícil do que a que corria debaixo do desastre de Alberto Fernandez) não há ainda o caldo de revolta popular que as medidas e insanidades em vigor poderiam transformar em manifestações de rua.

Qual a razão da aparente apatia do tradicionalmente aguerrido tecido social argentino? O cidadão comum, aí incluída parcela relevante dos trabalhadores, não suporta mais as remarcações de preços, quer ter o direito de não ser surpreendido diariamente ao fazer suas compras.

A situação pode mudar e o couro começar a cantar daqui uns dois meses, quando o arrocho for ainda mais sentido? Pode e é até provável, mas o que temos hoje, afora análises militantes, é uma espécie de voto de confiança para o maluco que promete acabar com a inflação.

Sempre que se ouvir a conversa que “um pouco a mais de inflação é aceitável”, desconfie. Uma fatia relevante da sociedade não aceita mais o fantasma. No Brasil que não convive com o problema há algum tempo, pelo menos de maneira grave, e na Argentina dos últimos anos, o discurso tão apenas ideológico na abordagem da tese de maior maleabilidade com os preços não emplaca principalmente na classe trabalhadora.

Lula sabe disso. Tem muito a ensinar. A vida é a melhor escola da realidade.

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