Em entrevista exclusiva ao DIA, presidente falou sobre violência no Rio, alta no preço dos alimentos e reeleição
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Presidente LulaRicardo Stucker / PR
Rio – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu entrevista exclusiva ao DIA respondendo a questões essenciais ao Rio de Janeiro como segurança pública, saúde, turismo e a alta de produtos alimentícios impactando o bolso do consumidor, tema caro ao seu governo, que garantiu tratar como obsessão.
Lula disse que 2025 é “ano da colheita” para os brasileiros, criticou o que chamou de demonização da Petrobras — ressaltando o papel da estatal na economia — e despistou sobre uma possível candidatura a 2026, destacando suas viagens ao país como forma de corrigir erros. “Fiz muito isso nos primeiros mandatos e continuarei a fazer”, afirmou.
Presidente, um dos mais importantes temas do estado do Rio de Janeiro é a questão da segurança pública. A disputa territorial entre facções não para de fazer mortos, em muitos casos trabalhadores inocentes, vítimas de balas perdidas e de assaltos. Recentemente, tivemos até um ataque contra uma delegacia em Caxias, na Baixada. O governo federal pretende auxiliar mais no combate ao crime organizado? Como se daria essa ajuda?
Não só pretendemos, como vamos auxiliar muito mais no combate ao crime organizado. As facções criminosas ultrapassam as fronteiras dos estados e até dos países e só uma ação federal forte, em parceria com os estados, poderá quebrar suas espinhas dorsais. É justamente por isso que o ministro Lewandowski preparou, depois de muito ouvir os governadores, uma proposta de emenda constitucional que define melhor a competência de cada força e dá muito mais robustez ao Sistema Único de Segurança Pública. Desde o início de nosso governo, temos atuado contra o crime.
Em 2024, transferimos recursos de R$ 87,5 milhões do Fundo Nacional de Segurança Pública para o Estado do Rio. E intensificamos, em todo o Brasil, o combate à lavagem de dinheiro e a repressão econômica às facções criminosas. Apenas no ano passado, a Polícia Federal impôs um prejuízo de R$ 5,6 bilhões a elas em ações como apreensão de bens – resultado 70% superior ao obtido em 2023.
O prefeito Eduardo Paes afirmou, outro dia desses, que iria pedir ao senhor que concedesse o título de “capital honorária do Brasil” para o Rio. A medida, segundo ele, ajudaria nas perdas econômicas que a cidade teve quando Brasília virou a capital. O senhor vê chances de atender esse pedido?
Eu e o Eduardo Paes ainda não tivemos a oportunidade de conversar sobre isso, mas de uma coisa ele e todos os cariocas podem ficar certos: o Rio de Janeiro está em meu coração e no centro das atenções do Governo Federal. A cidade está sendo beneficiada com investimentos de R$ 29,7 bilhões do PAC – sendo quase R$ 7 bilhões em obras dentro do município e mais de R$ 22 bilhões em empreendimentos regionais.
Fizemos, aqui, o encontro do G20, e iremos sediar, aqui, a cúpula dos BRICs. E não pouparemos esforços para seguirmos trazendo cada vez mais desenvolvimento para a Cidade Maravilhosa.
O governo federal, através do Ministério da Saúde, está fazendo uma grande parceria com a Prefeitura do Rio na reforma de unidades federais e abertura de novos leitos, como no Hospital de Bonsucesso e no Hospital do Andaraí. A ampliação do Instituto Nacional de Câncer (INCA), no Centro, no entanto, ainda não saiu do papel. Quais serão os próximos passos dessa parceria? O que os cariocas e fluminenses podem esperar na área da saúde?
Fico muito feliz de ver que estamos conseguindo resolver problemas históricos nos hospitais cariocas. Visitei há duas semanas o Hospital de Bonsucesso, agora administrado por uma estatal federal, o Grupo Hospitalar Conceição. Ali, já foram abertos mais de 200 leitos e sua emergência, reativada recentemente, atendeu mais de mil pacientes só na primeira semana.
Para o INCA, nossa ideia é construir um novo campus que unificará todos os endereços do instituto e aumentará a sua capacidade de atendimento. Faremos isso por meio de uma parceria público-privada, na qual os profissionais de saúde do Instituto poderão se dedicar totalmente ao atendimento dos pacientes, deixando questões como infraestrutura e manutenção a cargo do parceiro privado. No momento, o BNDES está definindo os detalhes técnicos deste modelo e, assim que a etapa for concluída, o projeto vai para licitação e, em seguida, as obras começam.
Sempre que perguntam se o Lula será candidato à reeleição, o senhor diz que ainda não é hora de falar de eleição. Quando será este momento, presidente? O senhor retomou uma agenda intensa de viagens aos estados e está buscando se comunicar mais com os brasileiros nas redes sociais. São sinais de que poderemos ter a confirmação da candidatura em breve?
Tenho falado que este ano de 2025 é um ano de colheitas para o povo brasileiro. Um ano em que será possível sentir o resultado de todo o trabalho de reconstrução que nos ocupou desde janeiro de 2023, quando encontramos ministérios e órgãos públicos desmontados, políticas públicas jogadas na lata do lixo e a própria democracia sob forte ataque dos autoritários.
O que temos que fazer, agora, é garantir que essa colheita seja a melhor possível. Temos uma economia em ordem, o menor índice de desemprego da história e um PIB crescendo muito acima da média do governo anterior. As políticas públicas voltaram: só no Rio de Janeiro, quase triplicamos o número de profissionais do Mais Médicos, que agora são mais de 1,4 mil. Com o Pé-de-Meia, estamos garantindo a poupança para 276 mil estudantes do ensino médio seguirem nos estudos. E agora todos os 41 medicamentos do Farmácia Popular são gratuitos, melhorando a qualidade de vida de quem precisa tomar remédios todos os dias.
Mas é viajando a cada canto desse país e conversando com quem mora lá, conhecendo sua realidade, que consigo perceber onde estamos acertando e onde podemos melhorar. Fiz muito isso nos meus primeiros mandatos e continuarei a fazer, pois é assim que posso corrigir os rumos quando necessário.
O Rio de Janeiro tem duas atividades econômicas muito fortes: a exploração de petróleo e o turismo. Muitos municípios, inclusive, dependem bastante do dinheiro dos royalties para se manter. Quanto à importação do petróleo, o que falta para o país ganhar a tão falada independência que dê conta do consumo interno? E qual futuro econômico o senhor vê para o nosso estado? Que outros potenciais podem ser explorados?
Nossa soberania energética tem nome, e se chama Petrobras. Foi graças à sua tecnologia e aos seus investimentos que descobrimos e exploramos o pré-sal. Também foi graças a ela que conseguimos gerar e distribuir riqueza na forma de royalties e de empregos em toda a cadeia do petróleo e do gás. Por isso, poucas coisas me incomodaram mais do que ver a empresa ser demonizada em um passado recente, quando foi obrigada a reduzir investimentos e até mesmo vender suas refinarias e outros ativos.
Felizmente, a Petrobras voltou a ter um plano sólido de investimentos. Até 2029, investirá US$ 111 bilhões no petróleo e em fontes renováveis, para se se tornar uma gigante também no mercado da energia limpa.
O Rio de Janeiro vai ganhar muito com isso, especialmente em setores como a indústria naval, que tinha sido deixada de lado. Em 2014, no governo da presidenta Dilma, tínhamos 71,5 mil pessoas trabalhando na construção de embarcações. Em 2022, esse número caiu para 39,9 mil pessoas. De 2023 para cá, já crescemos 17% e logo mais iremos superar o recorde de 2014, pois as 44 embarcações que a Petrobras deve contratar trarão de volta a vida aos estaleiros do Rio e de todo o país.
Quanto ao turismo, o Brasil recebeu mais de 6,7 milhões de turistas internacionais em 2024. É um número recorde. Eles deixaram mais de US$ 7,3 bilhões na economia brasileira, o maior valor dos últimos 15 anos, superando inclusive o ano da Copa do Mundo. Tudo isso indica que, para quem vive do turismo na cidade brasileira que mais encanta o mundo, não faltarão chances de trabalho, de bons negócios e de prosperidade.
Presidente, o café nunca foi tão caro na prateleira do supermercado. Outros produtos também estão com preços muito altos. Isso faz com que o brasileiro priorize a compra de alimentos e gaste mais nesse setor, onerando outros aspectos, como o turismo, por exemplo. O que o governo está fazendo para que a dona de casa possa comprar o que precisa?
O ano de 2024 foi muito ruim para o preço dos alimentos: nossas lavouras foram prejudicadas com as enchentes do Rio Grande do Sul e os incêndios no Centro-Oeste e no Norte e tivemos uma alta forte do dólar. Em 2025, a situação será melhor, pois o câmbio está mais favorável e teremos uma safra recorde de grãos, com destaque para arroz, feijão e soja.
Sei, contudo, que isso não é suficiente. Por isso mesmo, apoiaremos, como nunca, a produção de alimentos de qualidade e com preço adequado. Queremos que o produtor rural tenha acesso a bons financiamentos, consiga modernizar sua produção com a adoção de novas tecnologias e cuidado com a sustentabilidade. Ao mesmo tempo, temos buscado alternativas para que a distribuição dos alimentos seja mais eficiente e que a comida não suba tanto de preço no caminho entre o campo e a cidade. Temos, inclusive, conversado bastante com as redes varejistas sobre esse tema. O importante – e isso é uma obsessão minha – é fazer com que a conta do supermercado caiba sempre dentro do bolso do trabalhador.
Colaboraram Raphael Perucci e Thiago Antunes