Por Gabriel Cavalcante, músico
Outro dia, numa discussão nesta rede, li de um imbecil funcional que meu pensamento era típico de alguém que havia sido educado sob doutrinas de professores esquerdistas.
Pois bem!
Volto ao ano de 1996, quando, saindo do primário, ingressei em um dos colégios mais conservadores da Tijuca.
Dona Sheila, minha mãe, professora do município e da UFRJ, ligava-me triste, estava na casa de minha falecida avó, Dona Marina. Eu não havia passado na prova do Pedro II, e isso significava que sua única saída, à época, era se esforçar ao máximo para continuar oferecendo o ensino particular para mim.
Para minha sorte, dois anos depois, Luquinhas, meu irmão CDF, passou para o Pedro II, e isso deu um alívio financeiro para a coroa.
Aos que não se lembram, faço questão de explicar.
Era uma tarde de março, sol explodindo, e nessa época nem se falava que a culpa era dele, o tal sol… Tia Cláudia, a organizadora das férias na Disney, entra saltitante na sala de aula. Matemática era a matéria. Tia Cláudia, então, oferece aos alunos (média de de 11 anos) um atraente pacote para julho. Prazo de uma semana para a resposta…
Passados os sete dias, ao lado de mais uns seis ou sete amigos, fiquei de fora da jogada: o resto da turma comemorava a confirmação. “Disney, lá vamos nós!!!”
Julho chegou: aborrecido, troquei as fotos com Mickey e Pateta por caminhadas pela Floresta da Tijuca com Seu Flávio, meu pai, desempregado, e por idas ao Parque Lage com os amigos de turma que também perderam as férias da tia Cláudia.
Não sabia, em 97, com 11 anos de idade, que os meus problemas eram INFINITAS vezes menores do que os da grande maioria dos brasileiros.
Seguindo!
Governo FHC.
Lembro bem: funcionalismo público deixado de lado, pobre sem poder de compra, arrocho salarial, milhões de miseráveis sem comida à mesa…
No meio deste desastre social, Geraldo Brindeiro (lembram-se?). Se não se lembrarem, coloquem no Google: ENGAVETADOR GERAL DA REPÚBLICA, apenas isso.
Mas vamos ao que interessa!
2003, A esperança: o governo Lula nascia.
Você pode nunca ter precisado dele, muito menos ter sentido na pele os anos que antecederam o seu governo. Diante de tudo, enxergo hoje que JAMAIS havia sentido na pele também.
De 2005 até hoje, conheci o Brasil INTEIRO. Só me falta Salvador, admito. Mas não foi por falta de vontade nem de oportunidade.
Fui cinco anos SEGUIDOS para Nova Iorque exercer a modalidade de que mais gosto depois de olhar para minha namorada, Dona Marcella: comer e beber.
Mas isso não é NADA, ABSOLUTAMENTE NADA, perto dos milhões que passaram a saber o que é ter arroz e feijão à mesa todos os dias. Inclusive, peço desculpas à Dona Sheila, pelas vezes que, na condição de adolescente farofeiro, esperneei por não ter farofa no almoço.
Hoje, triste por estar vivendo esta infeliz página de nossa história, torço para que a parcela da elite INFELIZ E CRETINA que detesta o pobre cresça, e passe a olhar menos para o seu próprio umbigo. Torço para que a parcela da CLASSE MÉDIA INFELIZ E CRETINA, a mesma que também ascendeu no governo Lula, e que detesta ver seu filho na mesma faculdade da filha do serviçal do bairro, aprenda e aceite, de uma vez por todas, que a nova Classe Média é a antiga classe C e que está MUITO distante da classe A.
Lula errou em suas alianças, o PT errou enquanto esteve no governo. Jamais seria louco de não admitir isso. Todavia, JAMAIS posso acreditar no massacre travestido de julgamento que vi hoje em rede nacional. JAMAIS acreditarei numa justiça que, ao invés de ser imparcial, tornou-se parte do processo.
Lula pode ser condenado a 800 anos de prisão, mas dormirei hoje e morrerei “amanhã” com a certeza de estar lutando do lado certo, e com a serenidade dos que batalham por um país melhor, menos desigual, e com a tranquilidade dos que sabem estar ao lado do maior presidente deste país.
Gabriel Cavalcante, janeiro de 2018.
Foto: Ricardo Stuckert