Publicado na Revista ConJur –
Questionando o que aponta como “falta de apuração” em uma reportagem publicada pelo jornal O Globo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro buscando reparação de danos morais. A defesa de Lula afirma que a falta de verificação das informações foi confirmada pelos autores do material.
O texto, intitulado “Youssef deu dinheiro a firma ligada a obra do prédio de Lula”, informa que o ex-presidente seria proprietário de um tríplex no Edifício Solaris, no Guarujá (SP). Também divulga que o dinheiro usado para construir o imóvel teria vindo da OAS, uma das empreiteiras investigadas por desvios em contratos da Petrobras.
No processo, o ex-presidente pede reparação a Ascânio Seleme, diretor de redação de O Globo, e a Cleide Carvalho e Germano Oliveira, repórteres do veículo.
Segundo os advogados de Lula, Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins, do escritório Teixeira, Martins & Advogados, o ex-presidente não é proprietário do tríplex e jamais teve qualquer relação comercial com a OAS ou com seus parceiros no empreendimento do Edifício Solaris. Os representantes legais sustentaram, ainda, que a reportagem causou danos morais ao ex-presidente ao lhe atribuir um imóvel que não é dele e colocá-lo em um cenário de ilegalidades.
Já a defesa dos jornalistas, feita pelos advogados Sérgio Bermudes eFrederico Ferreira, do escritório Sergio Bermudes Advogados, argumentou que “a veracidade dos fatos não se encontra em causa” e que não cabe aos jornalistas “perscrutar” a verdade. A existência de uma investigação em curso no Ministério Público autorizaria a conduta.
Na decisão questionada, o juiz Mauro Nicolau Júnior, da 48ª Vara Cível do Rio de Janeiro, julgou improcedente a ação. Na sentença, o julgador reconhece que Cleide Carvalho não fez nenhuma apuração dos fatos embora assine a reportagem e, ainda, que Ascânio Seleme autorizou a publicação sem qualquer verificação. No entanto, o juiz decidiu que a existência de uma investigação no Ministério Público afastaria a prática de um ato ilícito pelos réus.
No recurso, os advogados de Lula afirmam que os jornalistas agiram de maneira incompatível com a atividade executada, pois admitiram não terem feito nenhuma apuração dos fatos. Afirmam que “o Apelado não é proprietário do imóvel indicado na reportagem em questão e não possui qualquer relação com as empresas e as pessoas indicadas naquela publicação”.
Teixeira e Martins defendem que a existência de uma investigação não permite aos jornalistas fazerem afirmações decisivas. “Quando existe apenas uma investigação, qualquer notícia publicada pela imprensa a respeito do tema deve observar redobrada cautela e sempre estar acompanhada de expressas ressalvas”.
O recurso de Lula cita um parecer do desembargador aposentado Gustavo Grandinetti Castanho Carvalho, que tem a seguinte conclusão:
A qualidade de veracidade das matérias enfocadas neste parecer está comprometida, especificamente, pela:
a) ausência do cumprimento do dever específico de diligência consistente em omitir os fatos concretos e determinados em que se apoiou a afirmação da propriedade do triplex;
b) preterição do uso do verbo no condicional e, em seu lugar, a utilização do verbo no afirmativo;
c) despreocupação de divulgar que não se obteve a prova da alegação juntos aos órgãos públicos pertinentes (RGI e declaração de rendas);
d) descompromisso em separar a narrativa do fato da conclusão, ou opinião, do jornal.
Em conclusão, especificamente à luz das matérias jornalísticas enfocadas neste parecer e ao seu modo particular de produção, tem-se que a afirmação categórica de que o ex-presidente é proprietário de um triplex no Edifício Solaris desbordou da pauta do que seja uma notícia veraz, consoante os parâmetros adotados pela doutrina especializada. Assim agindo, restou violado o direito ao patrimônio moral, o que enseja a indenização postulada.
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