Em várias cidades do país, lei ainda não é cumprida e quem luta pelo direito é punido. Relato de professora mostra realidade de muitos educadores que têm que decidir se compram comida ou se pagam as contas
Por André Accarini, editado por Marize Muniz, compartilhado da Redação CUT
Em várias cidades e estados do país, a luta dos professores e das professoras pelo pagamento do reajuste piso do magistério de 2002, de 33,24%, continua. Em alguns casos a categoria enfrenta a crueldade das autoridades locais e da Justiça que está punindo com corte de salário quem entra em greve para reivindicar o direito garantido na Lei 11.738/2008, como é o caso dos educadores da Rede Municipal de Ensino de Natal e da Rede Estadual de Ensino do Piauí.
Apesar de exemplos como Fortaleza, no Ceará, a primeira cidade a pagar o reajuste de 33,24% estabelecidos pela lei, e do Rio Grande do Norte, onde a ex-governadora Fátima Bezerra (PT) negociou com os representantes dos professores antes de renunciar ao cargo para se candidatar à reeleição, muitos governadores e prefeitos insistem em ignorar a difícil situação desses profissionais que têm salários desvalorizados. Muitos não têm reposição salarial desde 2017, casos dos professores de São Paulo. Com o reajuste o piso, o salário passaria de R$ 2.886 para R$ 3.845,63.
O reajuste determinado em lei garante ao menos a reposição das perdas salariais para a inflação dos últimos anos. O índice de 33,24% definido para este ano, tem como base a o cálculo do custo-aluno e com a variação da inflação de 2021. No ano passado o piso ficou congelado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL).
Com o não cumprimento, muitos professores, que já têm salários baixos e poder de compra destruído pela inflação, vivem o drama de não conseguirem sobreviver – não têm condições de fazer o orçamento caber dentro do pequeno salário. Professores, categoria da maior importância para o desenvolvimento de qualquer país, acabam vivendo o dilema de decidir se pagam as contas ou se colocam comida na mesa.
A professora da rede estadual paranaense Rosi Mari, que ganha R$ 1.403 por mês, fez um comovente relato sobre sua situação atual. “Não tenho vergonha de falar. Cortaram minha luz. Esse salário faço o que? Como ou pago aluguel ou água e luz? É uma vergonha”. Veja o vídeo
No Paraná, muitas prefeituras têm se recusado pagar o Piso Nacional do Magistério nas redes municipais. Na rede estadual, denunciam os professores, o governo Ratinho Jr (PSD), apesar da propaganda, também não cumpre a Lei. De acordo com informações do APP-Sindicato, Ratinho Jr, ao invés de cumprir a Lei i do Piso, usou um artificio que, inclusive, foi seguido por vários prefeitos municipais. Marcia Oliveira, secretária de Assuntos Muncipais do sindicato, explica que foi criado um projeto que determina uma gratificação, mas somente aos professores que estão na ativa, deixando de lado os aposentados. “Uma distorção do reajuste”, ela diz.
Nas redes municipais, dos 210 municipios paranaes, apenas 33 cumprem a Lei do Piso. A categoria está mobilizada e, na última assembleia foi aprovada uma jornada de lutas. Uma nova paralisação deve ocorrer no o dia 21 de junho. Ratinho Jr., além de não cumprir a lei do piso, não cumpriu a data-base dos professores. Não houve repasse sequer da índice inflacionário.
E a situação se repete em outros estados e cidades. Em Minas Gerais, onde os professores protagonizam uma das maiores mobilizações do país pelo cumprimento da Lei do Piso, iniciada com uma greve no dia 9 de março e que durou até o dia 12 de abril, o governador Romeu Zema (Novo) se recusa a pagar o reajuste.
Zema, inclusive, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) na tentativa de barrar o reajuste, que foi aprovado na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Também entrou com uma Adin no Tribunal de Justiça do Estado pedindo a anulação de toda a legislação estadual que resguarda o Piso Salarial.
Na próxima segunda-feira, dia 6 de maio, os professores mineiros farão mais uma manifestação na Cidade Administrativa, em Belo Horizonte, com paralisação da educação, para reivindicar o direito.
No Mato Grosso do Sul, de acordo com levantamento da Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul (Fetems), dos 79 municípios do estado, 45 estão pagando os 33,24% e respeitando a carreira. Outros seis pagam o reajuste do piso, mas não respeitam a carreira e os demais ainda não estão cumprindo a Lei do Piso.
Piso é lei
Em janeiro deste ano, o presidente Bolsonaro oficializou o reajuste determinado pela Lei do Piso usando a situação em seu favor, como se fosse um benefício concedido por seu governo, o que não é verdade, dizem as entidades que representam os professores e professoras.
O piso nacional é definido por lei aprovada pelo Congresso Nacional, a partir dos valores do novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que foi uma luta da categoria, e que hoje ainda encontra resistência de governadores e prefeitos que querem arrochar salários.
O valor do piso nacional do magistério é calculado a partir de uma fórmula que considera a inflação. Quanto mais alta, maior o reajuste. Portanto, seriam este ano os 33,24% com qualquer presidente no comando do país.
À época, o presidente (hoje licenciado) da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo, em artigo publicado no portal da entidade, afirmou que não foi Bolsonaro que concedeu o aumento em 2022 e que, na verdade, ele queria rebaixar o percentual da atualização do piso para ser referenciado apenas pela inflação de 2021, sem qualquer ganho real.
“Foi a nossa mobilização, mais uma vez, vitoriosa que impediu mais um ataque do governo federal à nossa categoria”, disse Heleno se referindo a determinação do índice de 33,24% de reajusta pela Lei do Piso.
O Piso Salarial Profissional Nacional do Magistério Público da educação básica, se tornou Lei no segundo mandato do presidente Lula, em 2008.