Claro que na complexa atividade política, com seus múltiplos interesses em disputa, o risco de erro está sempre à espreita. É do jogo.
Por Bepe Damasco, compartilhado de seu Blog
Mas, às vezes, diante da saraivada de críticas de comentaristas da GloboNews, dentre outros tantos da mídia comercial, às táticas e estratégias adotadas por Lula e seus articuladores antes da posse, fico imaginando que um extraterrestre recém-chegado ao nosso planeta teria a impressão de que o Brasil acaba de eleger um novato na política, e não um craque como Lula, eleito não por acaso presidente da República três vezes, feito inédito em nosso país.
O fato é que Lula não teve paz sequer para focar exclusivamente no ótimo trabalho de diagnósticos e propostas levado a cabo pelos grupos temáticos da transição.
Logo deparou com a dura constatação de que o orçamento de 2023 enviado por Bolsonaro ao Congresso Nacional previa valores inferiores ao de 2022, aberração que simplesmente inviabilizaria seu primeiro ano de governo.
Estaria condenado ao estelionato eleitoral, pois seria impedido de cumprir a promessa de campanha de pagar o Bolsa Família de R$ 600, mais R$ 150 por criança de até seis anos, além de não dispor de recursos para a farmácia popular e a merenda escolar.
Foi, então, que Lula se viu forçado a uma espécie de antecipação do mandato presidencial e a negociar com um Congresso Nacional sob forte influência do Centrão a PEC da Transição.
Outros caminhos poderiam ser encontrados (a decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes de retirar o Bolsa Família da camisa de força do teto constitucional que o diga), mas nenhum teria maior lastro político e institucional do que uma PEC respaldada pelas duas casas do Legislativo.
Tudo isso em meio à dificílima montagem de um governo que deve contemplar 14 partidos, refletir a frente ampla que elegeu Lula, garantir governabilidade via apoio expressivo no Congresso Nacional e não descuidar de critérios de gênero, raça e regionalidade.
Um intrincado quebra-cabeça.
Sem falar em outros elementos de tensão como a correta batida de martelo do STF sobre a inconstitucionalidade do orçamento secreto e os questionamentos descabidos do mercado e de seus porta-vozes na imprensa sobre nomes indicados por Lula.
Mas, esse turbilhão de problemas não abala Lula. Aliás, levando em conta todas as provações a que foi submetido na vida e o seu reconhecido talento político, o imbróglio atual chega ser um desafio menor para ele.
Afinal, Lula é Lula.
PS: Escrevi este artigo na terça-feira (20), antes de a Câmara dos Deputados apreciar a PC da Transição.