Por Camilo Toscano, publicado na Agência PT –
O impeachment foi negociado e a permanência de Cunha na presidência da Câmara compromete a democracia, avalia a deputada Érika Kokay
Cerca de 200 pessoas lavaram, nesta segunda-feira (25), a calçada em frente ao edifício do Supremo Tribunal Federal (STF) como forma de protestar contra a demora no julgamento do pedido de afastamento do cargo do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
O ato foi organizado pela sociedade civil “indignada com a paralisia do STF em julgar o afastamento de Cunha”, como definiram os próprios articuladores do protesto, já que o pedido de afastamento de Cunha foi feito pelo Ministério Público Federal (MPF), há 131 dias, em 16 de dezembro de 2015, e ainda não foi apreciado pela corte.
O pedido do MPF menciona um comportamento de Cunha “incompatível com o devido processo legal, valendo-se de sua prerrogativa de Presidente da Câmara dos Deputados unicamente com o propósito de autoproteção mediante ações espúrias para evitar a apuração de suas condutas”. Nesta sexta-feira (22), o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, voltou ao tema ao dizer que Cunha utiliza seu cargo e seu mandato “para intimidar colegas, réus que assinaram acordos de delação premiada e advogados”.
Munidos de vassouras, bandeiras do Brasil, da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do PT, além de baldes de água e sabão em pó, os manifestantes pediam aos ministros do STF urgência no julgamento. “Cunha, ladrão, seu lugar é na prisão”, “Bate panela, pode bater, quem tira o pobre da miséria é o PT”, “Golpistas, facistas, não passarão!” e “Fora, Cunha!” eram os principais gritos ecoados pelos participantes do ato, enquanto lavavam a calçada do STF.
Nos cartazes, lia-se que estavam ali “em defesa do voto dado a Dilma” e para pedir ao STF que “olhasse o outro lado da rua”, em referência ao Congresso Nacional. O “Vamos lavar o Supremo – Ato fora, Cunha” é apenas uma das manifestações programadas para os próximos dias que integram a agenda contra o golpe. O ponto está programado para o 1º de Maio, próximo domingo (confira a programação de atos aqui).
Ao lado da água escura, cheia de sujeita que a calçada desprendia, a deputada federal Érika Kokay (PT-DF) ressaltava os riscos à democracia que a permanência de Cunha no cargo implicam. “É preciso limpar a presidência da Casa de Eduardo Cunha. O impeachment foi negociado”, afirmou. “Basta ver as manobras que Cunha fez para se livrar do processo no Conselho de Ética. Está na mão do STF julgá-lo, e não entendemos a morosidade. A permanência de Cunha na presidência da Câmara compromete a democracia.”
Professor de matemática da rede pública do Distrito Federal, José Vasconcelos, 58 anos, teme pelos danos políticos e jurídicos que o atual processo de impeachment pode trazer ao país. “O STF precisa cumprir seu papel, que é ser guardião do Estado Democrático de Direito. Imagina a insegurança jurídica se o STF não fizer nada?”, afirmou, lembrando que houve quebra de sigilo telefônico da presidenta sem nada acontecer. “O STF precisa fazer seu papel, não precisa ser a nosso favor, só preservar a Constituição e a democracia basta.”
Felipe Lara, jovem estudante de 15 anos, diz que conversa com seus colegas de classe sobre o atual momento político, especialmente nas aulas de sociologia. Segundo ele, há alunos contra e a favor do golpe e pouca disposição para o diálogo, o que o faz pensar que será ocupando as ruas que será possível impedir o impeachment. “Estou aqui para defender a demcoracia”, diz. “É o que a gente pode fazer, ir para a rua, é a única arma que temos. Com certeza isso faz a diferença.”
O bancário Jefferson Meira, 47 anos, mostrou procupação também com o uso dos espaços públicos de poder para afastar a participação popular na tomada de decisão sobre os rumos do país. “Brasília foi concebida para ser uma cidade em que as pessoas circulam, que é fácil o acesso do povo ao poder”, afirmou. “Mas o que estamos vendo com essa grade cercando o STF é cercear o acesso do povo ao poder.”
A possibilidade de um grande retrocesso na agenda nacional com a concretização de um golpe é a grande motivação que levou Verenilde Pereira ao ato. Aos 60 anos, a escritora nascida na cidade de São Gabriel (AM), mas que mora há 15 anos em Brasília, lamentou também o “espetáculo lamentável” protagonizado pelos deputados na votação a favor do impeachment, em 17 de abril.
“Faço parte dos milhões que adoeceram esta semana por conta da votação na Câmara dos Deputados. As perdas que o Brasil vai ter se o golpe passar serão de décadas. E eu não admito esperar esse tempo todo para recuperar os direitos que conquistamos com tanta dificuldade”, afirma.