Por Marcos Coimbra, sociólogo, presiodente do Instituto Vox Populi
“Em dezembro de 2017, a nove meses da eleição do ano seguinte, o Instituto Vox Populi realizou uma pesquisa nacional, por solicitação da CUT. É educativo voltar a seus resultados, que ajudam a entender o que nos levou ao desastre de ter um Bolsonaro à frente do governo.
O Brasil estava mal, do ponto de vista da população. O golpe e a deposição de Dilma, do ponto de vista da opinião pública, haviam fracassado. Mas haveria uma eleição dali a pouco tempo.
Sergio Moro e seus rapazes estavam na glória, com as fanfarras da mídia corporativa e da TV Globo soando alto.
O primeiro passo do projeto de poder que os animava havia sido dado: um empresário-delator, a fórceps, “confessara” que um apartamentozinho no Guarujá era propina para Lula. Sem nada de concreto, o bolsonarista condenou o ex-presidente.
Na pesquisa, foram feitas várias perguntas a respeito de Lula e outros possíveis candidatos.
Era, de longe, o mais conhecido e o mais admirado: 49% diziam “gostar” dele, ficando Joaquim Barbosa em segundo lugar, com 28%, acima de Marina Silva, com 22%.
O capitão Bolsonaro marcava 18% (venceu a eleição, vive o que a grande imprensa saúda como seu “melhor momento” e alcança hoje 32% nesse quesito).
Se fosse candidato naquela eleição, 38% dos entrevistados em dezembro de 2017 diziam que “votariam com certeza” em Lula, aos quais se somaria uma parte dos 16% que afirmavam que “poderiam votar”.
Uma parcela de 39% dizia que “não votaria” nele, proporção menor que em qualquer outro nome (empatado com Joaquim Barbosa, recusado por 40%). O capitão merecia a rejeição de 53%.
O que se pode dizer desses números é que, depois de tudo que ocorrera desde a grande investida conservadora contra Lula e o PT a partir de 2013, depois da derrubada de Dilma, depois do massacre midiático sofrido pela esquerda ao longo de anos e depois da condenação por Moro, o favorito na eleição de 2018 era Lula. Frente a quaisquer adversários, a chance é que vencesse no primeiro turno.
Na pergunta espontânea, atingia 38%, ficando todos os demais, somados, com 21% (dentre esses, Bolsonaro obtinha 11%, indicando que a doença bolsonarista já corroía o País).
Em lista com os nomes de dez pré-candidatos, Lula alcançava 43% e a soma dos restantes chegava a 33% (em segundo, estava Bolsonaro com 13%).
Essa pesquisa Vox não trouxe resultados muito diferentes de outras com metodologia semelhante.
Todas mostraram que, a menos de um ano da eleição, só havia um modo de Lula perder o favoritismo, considerando que tudo que havia de negativo contra ele estava já computado e o eleitorado havia feito suas contas.
Como, aliás, indicavam as respostas a uma pergunta a respeito do saldo da atuação de Lula em sua trajetória: 60% consideravam que ele fizera “muito mais coisas certas que erradas pelo povo brasileiro e o Brasil”, contra 32% que entendiam que “ele errou muito mais que acertou”.
O único modo garantido de evitar a quinta vitória seguida do PT e o terceiro mandato de Lula era impedi-lo de ser candidato, trancafiando-o em uma cadeia e proibindo que se manifestasse. Foi exatamente isso que fez uma vasta aliança antidemocrática e golpista, organizada informalmente para não permitir que a vontade das pessoas comuns prevalecesse.
Quem derrotou Lula, o PT e a esquerda em 2018 não foram “os erros” do PT, o “crescimento do antipetismo”, os “escândalos” e a “corrupção” petistas.
Suas razões não foram as “mudanças sociais”, as “redes sociais”, o “crescimento do neo-pentecostalismo” e tantas outras explicações sociologizantes.
Sem a intervenção despudorada dos aventureiros do Judiciário, militares sedentos de poder, empresários ávidos de retomar o controle do Estado, negociantes da fé, bilionários das comunicações, a vitória do capitão e suas milícias fascistas não teria ocorrido.
E ainda exigiu trapaças de todo tipo na reta final, que os tribunais preferiram não ver.
A culpa pelo que aconteceu não é da esquerda e não é preciso que ela faça mal a si mesma para exorcizá-la, em um auto-de-fé descabido e desnecessário”.