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Emissões de carbono causadas por incêndios florestais são até quatro vezes maiores do que se previa

Incêndios em florestas tropicais úmidas podem reduzir significativamente a biomassa florestal por décadas. Foto Rodrigo Baleia/Greenpeace
Incêndios em florestas tropicais úmidas podem reduzir significativamente a biomassa florestal por décadas. Foto Rodrigo Baleia/Greenpeace

No último dia oito de outubro, três novos estudos sobre a Amazônia brasileira foram publicados em uma edição especial da tradicional revista científica inglesa Philosophical Transactions da Royal Society B. Um deles, “Quantifying immediate carbon emissions from El Niño-mediated wildfires in humid tropical forests” revelou que as consequências dos incêndios florestais na Amazônia, nos anos de 2015 e 2016, resultaram em emissões de CO2 três a quatro vezes maiores do que as estimativas feitas até então. O estudo foi realizado numa área de 6,5 milhões de hectares de floresta amazônica brasileira.

No geral, nossos resultados combinados destacam a importância de os incêndios florestais serem considerados nas políticas brasileiras de conservação e mudanças climáticas. Com modelos climáticos projetando um futuro mais quente e seco para a bacia amazônica, os incêndios, provavelmente, se tornarão mais generalizados

Erika Berenguer
Cientista da Universidade de Oxford

O resultado da pesquisa cai como uma bomba no já tenso cenário ambiental, onde o líder na corrida presidencial diz que vai acabar com o Ministério do Meio Ambiente e interromper as demarcações de terras indígenas. Se o Brasil, com Ministério do Meio Ambiente, IBAMA, ICMBio e organizações ambientais de olho no que acontece por lá é o país que mais mata defensores da Amazônia, o que acontecerá quando todas essas organizações, institutos e autarquias forem extintos ou perderem poder?

Os pesquisadores das Universidades de Lancaster e Oxford, na Inglaterra, entre eles a cientista brasileira Erika Berenguer, realizavam uma pesquisa de campo quando ocorreu um dos piores incêndios florestais que a Amazônia viu em uma geração. Erika estava no Pará e testemunhou o grave incêndio ocorrido na região de Santarém, no final de 2015, um dos epicentros daquele ano do El Niño.




“Os incêndios descontrolados dos sub-bosques das florestas tropicais úmidas durante as secas extremas são uma fonte grande e mal quantificada de emissões de CO2. Estes incêndios consumiram, completamente, resíduos de folhas e detritos lenhosos finos, enquanto que, parcialmente, queimaram detritos lenhosos grosseiros resultando em altas emissões imediatas de CO2. Essa análise cobre uma área de apenas 0,7% do Brasil, mas a quantidade de carbono perdido corresponde a 6% das emissões anuais de todo o país em 2014”, revela o pesquisador, Kieran Withey, da Universidade de Lancaster.

Índios Guajajara da Terra Indígena Arariboia e bombeiros do Maranhão tentam impedir que o fogo avance sobre a parte mais conservada de floresta. Foto: Marizilda Cruppe / Greenpeace.
Índios Guajajara da Terra Indígena Arariboia e bombeiros do Maranhão tentam impedir que o fogo avance sobre a parte mais conservada de floresta. Foto: Marizilda Cruppe / Greenpeace.

Do território pesquisado, quase um milhão de hectares eram de florestas primárias e secundárias queimadas durante o El Niño de 2015 e 2016, área equivalente a metade do tamanho do estado de Sergipe. A região corresponde a menos de 0,2% da Amazônia brasileira, mas esses incêndios converteram-se em emissões imediatas de mais de 30 milhões de toneladas de CO2.

 Boa notícia – só que não

Em outro estudo, Drought-induced Amazonian wildfires instigate a decadal-scale disruption of forest carbon dynamics”, liderado pela cientista brasileira da universidade de Lancaster, Camila Silva, foram pesquisadas 31 áreas queimadas na Amazônia brasileira. O resultado mostrou que mesmo depois de 30 anos de um incêndio, aparentemente, as florestas “recuperadas” ainda têm 25% menos carbono do que as florestas primárias onde não ocorreu interferência do homem.

Na análise de Camila, “incêndios em florestas tropicais úmidas podem reduzir significativamente a biomassa florestal por décadas, aumentando as taxas de mortalidade de árvores de grande porte e alta densidade de madeira (como a castanheira ou o mogno) que armazenam maior quantidade de biomassa em florestas antigas. Nosso trabalho demonstrou que os incêndios florestais diminuem ou retardam significativamente a recuperação pós-fogo das florestas amazônicas.”

Políticas públicas para conter o desmatamento e controlar os incêndios florestais

No terceiro estudo, que envolveu um time de nove pesquisadores coordenado pela cientista brasileira Erika Berenguer, das universidades de Oxford e Lancaster (Tree growth and stem carbon accumulation in human-modified Amazonian forests following drought and fire) foram avaliados, pela primeira vez, os impactos da ação do homem e das secas e de incêndios causados pelo El Niño no crescimento das árvores e na acumulação de carbono. Uma das descobertas é que, após os incêndios, as árvores sobreviventes cresceram significativamente mais do que aquelas localizadas em florestas não queimadas, independentemente de interferência humana anterior. Em média, as árvores nas áreas queimadas cresceram 249% mais do que as árvores nas florestas afetadas pela seca e não pelo fogo. Embora a taxa de crescimento seja uma boa notícia, esse grande aumento parece ser uma resposta relativamente de curto prazo. A densidade da madeira é um fator importante, pois ajudou os cientistas a explicarem a diferença de crescimento entre árvores de florestas queimadas e não queimadas, com árvores de baixa densidade de madeira que crescem significativamente mais em locais queimados.

A imagem da destruição causada pela fogo na Amazônia. Foto Rodrigo Baleia/Greenpeace
A imagem da destruição causada pela fogo na Amazônia. Foto Rodrigo Baleia/Greenpeace

“No geral, nossos resultados combinados destacam a importância de os incêndios florestais serem considerados nas políticas brasileiras de conservação e mudanças climáticas. Com modelos climáticos projetando um futuro mais quente e seco para a bacia amazônica, os incêndios, provavelmente, se tornarão mais generalizados. O contínuo fracasso em incluir os incêndios florestais nas políticas públicas ocasionará incêndios em intervalos mais curtos, com as florestas sendo incapazes de recuperar seus estoques de carbono”.

No mês passado, a Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Meio Ambiente (ASCEMA) divulgou a Carta Aberta em Defesa do Meio Ambiente, assinada pela associação e outras entidades ambientais. Os servidores repudiavam as críticas do candidato a presidente líder nas pesquisas ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). “O ICMBio e o IBAMA são instituições com a missão de salvaguardar o patrimônio ambiental do país, conforme previsto na Constituição Federal de 1988. As ações de fiscalização desses órgãos se pautam por critérios técnicos, seguindo a legislação ambiental vigente no Brasil”, dizia um trecho da carta.

Em Uruará, no trecho leste da Transamazônica, a floresta é consumida pelas chamas, para dar lugar à produção agropecuária. Foto Lunaê Parracho/Greenpeace
Em Uruará, no trecho leste da Transamazônica, a floresta é consumida pelas chamas, para dar lugar à produção agropecuária. Foto Lunaê Parracho/Greenpeace

Até o início dos anos 2000 os cientistas observavam que havia grande ocorrência de incêndios em anos onde as taxas de desmatamento eram altas. Ou seja, mais desmatamento, mais incêndios. Por volta de 2010, essa relação mudou. Apesar da queda no desmatamento, as ocorrências de incêndio continuaram altas. Os estudos, então, apontaram para o aumento dos incêndios em anos de seca extrema. A combinação de desmatamento e seca extrema pode ocasionar incêndios incontroláveis. “Com as taxas de desmatamento aumentando, as chances de incêndio vão ser muito maiores. Precisamos fortalecer as nossas instituições ambientais e, de forma alguma, desafetar as nossas unidades de conservação. Isso é extremamente importante” alerta a cientista Erika Berenguer.

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