Compartilhado do Portal da CUT RJ –
Memória não morrerá: bordadeiras costuram nomes de companheiras e companheiros vítimas de COVID-19
Com linha, agulha e um pouco de tecido, mulheres de diversos lugares bordam à mão os nomes de pessoas mortas por COVID-19 em faixas itinerantes pelas cidades do Brasil
Lígia Arneiro Teixeira Deslandes. Adorava falar dos seus filhos e gatos, gostava de escrever sobre política, tinha um blog, um livro publicado com o título “Operários do Petróleo”. Acreditava muito na luta por justiça social. Era aposentada da BR Distribuidora, mas ainda assim continuou atuando no sindicato. Era secretária-geral da CUT-Rio e diretora do Sintramico. Lígia foi infectada por covid-19 e depois de uma longa luta contra a doença, não resistiu e faleceu no dia 22 de abril de 2021.
Entre as diversas homenagens que recebeu dos amigos e familiares, uma delas foi ter seu nome bordado em uma grande faixa junto aos nomes de tantas outras pessoas que se foram por covid-19 no Brasil. “Se números frios não tocam a gente / Espero que nomes possam tocar”. O trecho do poema “Inumeráveis”, de Bráulio Bessa – que inclusive ganhou melodia de Chico César – inspirou um projeto que reúne bordadeiras de diversos lugares do Brasil e fora dele, a não deixar cada vida perdida cair no esquecimento. O nome de Lígia foi bordado na faixa “Memória Não Morrerá”, um conjunto de mais de trinta metros de painéis bordados por coletivos de todo o Brasil.
Os painéis foram exibidos na Paróquia de São Miguel Arcanjo, no dia 23/05, às 10 horas, durante a missa de Pentecostes, celebrada pelo padre Júlio Lancellotti. Até o momento, somam mais de 1.800 nomes de pais, mães, tios(as), primos(as), filhos(as), avós(ôs) e amigos(as) queridos(as). Todos vítimas dos equívocos e omissões da política sanitária, condenados a morrer sozinhos, sem despedidas. É muita gente que se vai vítima de uma doença para a qual já se tem vacina.
O nome de Lígia foi costurado pela companheira Kátia Maria de Azevedo Caldeira Pires, bordadeira e dirigente do Sindicato dos Médicos.
“Bordar é uma forma de não se calar, de que essas pessoas não sejam esquecidas, que sejam lembradas. Em se tratando de uma guerreira como a Lígia, foi como se parte daquela força dela viesse um pouco para a gente. Fico emocionada. Eu conhecia a Lígia, foi doído. Mas senti a energia dela. É doído, mas é um sentimento de você estar fazendo alguma coisa por essas pessoas. Não deixar que sejam apenas números é muito importante. Eu fico desejando todos os dias para isso acabar logo, porque é muito ruim, é muito complicado. A gente tem nomes conhecidos e são todos conhecidos de alguém. Não tem nenhum desconhecido. Cada nome é o amor de alguém”, desabafa.
Segundo o coletivo Linhas do Rio, do qual Kátia faz parte, o projeto não tem limite de tamanho ou ponto de chegada e continua crescendo, assim como nós não temos a menor ideia a respeito da real dimensão dessa catástrofe para o futuro do país.
O projeto mostra que a luta é aliada da arte. Bordar, linha a linha, nomes, vidas, histórias, amores de alguém, pessoas que se foram, companheiras e companheiros “caídos” de uma guerra cujo inimigo já pode ser combatido com vacina e com medidas que foram negligenciadas por um governo genocida. Só mesmo a arte para ajudar a resistir. Tecendo, as bordadeiras transformam o luto em luta.
Mais informações em:
www.facebook.com/linhasdorio;
www.instagram.com/linhasdorio,
Fazem parte do projeto e assinam os painéis do “Memória não Morrerá”:
LINHAS DO RIO | Rio de Janeiro
LINHAS DO HORIZONTE | Belo Horizonte
LINHAS DE SAMPA | São Paulo
LINHAS DO MAR | Caraguatatuba
LINHAS DE SANTOS | Santos
PONTOS DE LUTA | Belo Horizonte
BORDALUTA | Brasília
MULHERES DA RESISTÊNCIA NO EXTERIOR | Nova York
LINHAS LIVRES | Atibaia
Além de colaborações individuais de Olinda, Niterói e Curitiba.