Meninos, eu vi. E convivi

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Por Luiz Pimentel – 

     Foi assim: Alfredinho do Bip Bip morreu.




     Sim, eu sei. Morrer todo mundo morre. Faz parte da vida. E coisa e tal. Mas Alfredinho não era um vivente qualquer. Convivi com a fera por mais de três décadas e posso afirmar: morrer jamais esteve em seus planos. Mas morreu. E assim, morto, o encontrei poucas horas depois, na sala de sua casa, trajando camisa e linho branco e refastelado no sofá que usava para ler (de um tudo) e ver televisão (Filmes no Art-1 e jogos do Botafogo).

     Como é de praxe ficarmos abestados diante da morte (é da vida), lembrei-me de Guimarães Rosa e pensei em falar para os amigos ali presentes que o bom e velho Neném não morrera; ficara encantado. Mas ainda bem que não usei tamanho clichê, porque com certeza ele leria meus pensamentos e mandava pelo celular, que jamais usou, com a voz ainda mais rouca:

     “Deixa de babaquice, Pimenta! Sou de Bangu, otário…”

     Alfredinho estava morto e, depois de ficarmos algumas horas ali, tomando cerveja e café diante dele (os preguiçosos, que nem eu; os mais jovens e valentes tomavam providências, como os traumáticos assuntos funerários… “Quer merda!”, diria o próprio). E foi na questão funéria que o primeiro impasse se deu: alguns amigos foram ajudar o agente a descer com o corpo, o elevador pifou, os bombeiros demoram a aparecer (era sábado de carnaval!) e viveram ali algumas cenas de cinema (de Hitchocock, claro).

     Morte e vida que seguem, na segunda-feira teve o velório inesquecível no Bip Bip, o mais emocionante que já acompanhei, com direito a choros, missa, despedidas inesquecíveis e mais uma intervenção do Alfredinho: o carro que o levou ao cemitério pifou (que nem o elevador) e teve que ser empurrado. O último adeus, no São João Batista, foi como deveria ser: com muita música.

     Alfredinho do Bip Bip foi sepultado.

     Naquela mesma noite veio o desfile da mangueira e pude ver o seu rosto em cada componente da escola dos nossos corações. Vi o sorriso de Alfredinho nos sorrisos de seus “filhos” Tomaz e Manu, compositores do samba já antológico, na comovente elegância de Hilde Angel vestindo Zuzu (com direito ao emblemático colar de cruzes, símbolo maior do massacre de jovens que a ditadura militar, hoje muito elogiada em palácios, promoveu). No dia seguinte, com a confirmação do título, lá estava Alfredinho diante dos meus olhos sonhadores, passeando sobre a quadra – foi ele quem em dado momento apagou todas as luzes, para melhor sentir a festa.

     Foi assim: Alfredinho do Bip Bip morreu. E não me contem outra.

 

 

Foto da capa: Arte de Paulo Villela

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