Por Washington Luiz de Araújo, jornalista
O dia 11 de março começou e terminou com péssimas notícias para mim. Logo de manhã, soube da morte de um amigo de adolescência e, a noite, morreu um ídolo de infância e amigo de 20 anos. Ambos ranzinzas e brincalhões, cada um do seu jeito, ambos centroavantes. Um atacante dos campinhos da Vila Maria e da USP e o outro um dos maiores centroavantes que o mundo conheceu. Falo de Agostinho Aguiar e Antonio Wilson Honório, Coutinho.
Agostinho, que conhecíamos como Ticão, levava a vida aos moldes de Garrincha, sem dar muita importância para as coisas práticas e tentando mesclar suas habilidades de designer, diagramador, com amargura e prazer.
Amigo de ótimos papos, Ticão era corinthiano roxo, mas daqueles que prezavam mais uma amizade do que o time do seu coração.
Um dos muitos causos que vivi com o amigo: Santos e Corinthians no Morumbi. Fizemos uma vaquinha para que o Ticão fosse ao jogo com a gente. Lógico que ele quis ficar na torcida do seu time. Não sei o motivo, mas dei para o Ticão meus documentos para ele colocar no bolso, juntamente com o talão de cheques (talvez, na correria, não tenha levado a pochete cafona e achei que os bolsos do Agostinho eram mais fundos) e fui para a torcida do Santos.
Clássico, estádio lotado. Mas o Ticão, lá no meio da torcida uniformizada corinthiana Camisa 12, resolveu ficar comigo durante o jogo e foi falar com um PM para ir para o lado da torcida do Santos.
O guarda não se conformou: “você é corinthiano e vai ficar na torcida do Corinthians”. No que o Ticão respondeu: “Mas o meu amigo está na torcida do Santos e eu quero ir para lá”. Bate boca e o Ticão é expulso de campo, do estádio. O guarda pôs o meu amigo para fora.
Sem saber do acontecimento, estou lá roendo unha vendo o Santos lutar num jogo parelho. De repente, me aparece o Ticão. “Não fala que eu sou corinthiano, não”.
Não falei, lógico. Não me perguntem o resultado do jogo. Só sei que na saída o meu amigo contou de sua aventura. Expulso do estádio, não se conformou e foi até um barriquinha, destas de vender sanduíche de pernil, e mandou a lábia, trocando um cheque meu para comprar um novo ingresso. Escreveu o meu nome no local da assinatura, comprou um sanduíche e com o restante o ingresso”. Esse era o Ticão.
A história, que já havia me esquecido, ele lembrou quando fui com meu irmão, Lula, visitá-lo no ano passado, onde ele já morava há mais de 30 anos, em Águas de São Pedro.
Ticão já sofria de um câncer que o levou na noite de domingo, dia em que houve mais um jogo do seu Corinthians contra o meu Santos. Não sei se ele assistiu a este último jogo de sua vida. E, Ticão, o Corinthians jogou melhor, mereceu ganhar, mas foi empate, zero a zero.
Águas de São Pedro, onde Ticão foi morar com os familiares depois de conviver muito tempo com a gente na Vila Maria, é próxima à Piracicaba, onde nasceu Coutinho, o outro atacante, meu amigo que também foi jogar no céu. Quem sabe se encontram, nem que seja com o Ticão na arquibancada enquanto Coutinho faz diabruras em campo.
Num próximo texto, falo de Coutinho.