Por Melissa Cirino, FNDC – Fórum Nacional pela Democratização Comunicação –
Jornalistas da Carta Maior, do grupo Comunicadores pelo Brasil e da TVT falam sobre as diferenças entre a cobertura da imprensa tradicional e dos grupos alternativos. Confira!
As manifestações dos dias 13 e 15 de março tiveram uma cobertura tendenciosa por parte da grande mídia. Coube ao jornalismo alternativo abrir espaço na internet com uma cobertura que mostra outro olhar sobre as manifestações. Ancorados na defesa da liberdade de expressão e críticos da parcialidade da mídia tradicional, grupos como Mídia Ninja, Jornalistas Livres, a rede TVT (confira entrevista no final desta matéria) e o Comunicadores pelo Brasil, entre diversos outros, trouxeram o outro lado e evidenciaram, mais uma vez, o desrespeito que grande parte da imprensa comercial tem pelos fatos e pelos leitores, telespectadores e ouvintes.
Matérias da manifestação do dia 15 com títulos como “Globo promove um “Diretas-já as avessas”” e “Intervenção militar não!” do grupo Jornalistas Livres, contrastam com matérias como “Manifestantes lotam Esplanada para protestar contra Dilma e corrupção”, veiculada pelo portal das organizações Globo, o G1.
Para a jornalista Najla Passos, da Carta Maior, o surgimento desses grupos independentes é muito importante, pois oferece a oportunidade de disponibilizar mais informação de qualidade, o que permite que o cidadão formar uma opinião mais qualificada sobre as características do movimento: “além do trabalho da mídia alternativa, achei muito importante o surgimento de grupos de jornalistas independentes criados para cobrir essas manifestações, como os Jornalistas Livres e o Comunicadores pelo Brasil, pois deram uma visão diferente daquela da mídia monopolista.”.
Para a jornalista, a cobertura da mídia tradicional insuflava os números de manifestantes no dia 15 para cima, e relatava apenas os pontos altos do protesto. “Por isso, a cobertura da mídia alternativa, especialmente no dia 15, e apesar do alcance muito menor, foi tão importante: escancarou essa tônica conservadora e golpista do movimento, desvelando as faixas e palavras de ordem que atentavam contra a democracia, as instituições, os direitos das minorias.”
A jornalista ainda esclarece que o protesto do dia 15 pode até ter sido pacífico, mas não apartidário, características divulgadas pela grande imprensa. “Ele foi conclamado por partidos de direita, direta ou veladamente, com interesse direto no desgaste desse governo. Partidos que investem, inclusive, no financiamento de grupos online de ultradireita, como o Revoltados Online e o Movimento Brasil Livre. Não há nada de espontâneo ou apartidário nesses protestos.”
Para a jornalista Flávia Azevedo, dos Comunicadores pelo Brasil, a mídia alternativa captou e ofereceu um outro ponto de vista à sociedade: “a notícia do dia 15 não foi outra senão a forma como o conservadorismo de ultradireita está sendo rearticulado no país usando como pano de fundo insatisfações legítimas da sociedade.”
De acordo com Flávia, o maior objetivo da mídia alternativa ao cobrir as manifestações é buscar pontos de vista diferentes àqueles oferecidos pela grande mídia. Além disso, ela afirma que o impacto dessa cobertura alternativa é bom: “[…]é algo mais difícil de avaliar nesse momento, mas são iniciativas importantes que já marcam pontos nesse mar de informação que circula nas redes sociais”, comenta.
A profissional comenta sobre o alcance dos objetivos da mídia alternativa ao realizar esse tipo de cobertura: “toda e qualquer iniciativa que busque comunicar pontos de vista ou questionar o status quo oferecido pela imprensa hegemônica já deve ser louvado imediatamente. O resultado no futuro dependerá da credibilidade e da forma como irão tratar os diversos pontos de vista. Questionar a hegemonia é fator imprescindível para começar qualquer ação de contra hegemonia, e isso esses grupos de comunicação estão fazendo, assim como pessoas diversas que, por iniciativa própria, estão falando mais abertamente sobre o tema em suas próprias redes sociais.”
Também ouvidos o jornalista Luiz Parise, diretor de jornalismo da TVT, sobre o assunto. Confira!
– A primeira diferença foi a abordagem. Muitas emissoras estiveram no ar o dia todo no dia 15, divulgando as passeatas pelo Brasil, e não deram a mesma ênfase na manifestação do dia 13, que foi organizada pelos movimentos sociais. As diferenças na cobertura são gritantes, vergonhosas. A TVT tem uma grande preocupação – que também percebemos em outros veículos alternativos – em fazer uma abordagem humanizada. Ela não estava focada em falar do recorde de pessoas nas ruas e nem inflamar os ânimos ou convocar as pessoas. O que a mídia alternativa mostrou foi a enorme diversidade que estava presente nas manifestações: entidades sindicais representando trabalhadores das mais diversas áreas, movimentos sociais ligados às questões de luta por moradia, educação, às questões de gênero, de etnia, gente comum. Gente que foi às ruas com pautas bem definidas: garantir que os direitos sociais adquiridos sejam respeitados; lutar para que a Petrobras não seja transformada numa empresa “inviável” para ser privatizada; defender a democracia e o fim do financiamento privado nas eleições. E foi exatamente essa a cobertura feita pela TVT e por outras mídias alternativas. Outra diferença enorme está na promoção dos atos. O ato do dia 13 foi chamado, principalmente, pela CUT e demais centrais sindicais, e pelos movimentos sociais. Já o dia 15 contou com amplo apoio de jornalões, revistas, rádios e emissoras de TV que perderam completamente a noção da ética jornalística e passaram a utilizar todo o aparato tecnológico e seus articulistas para convocar a população para ir às ruas no domingo. E foi o que aconteceu. No domingo, o que vimos nas emissoras comerciais de TV, foi uma cobertura absolutamente parcial, preocupada em inflacionar números e comandar o espetáculo midiático. Pouco – ou nada – se viu de debates que trouxessem clareza sobre o momento delicado da vida política – e do jogo político – do país. Dentro da nossa limitação estrutural e também por questões de segurança, a TVT se posicionou como a única emissora de sinal aberto a fazer uma leitura política equilibrada e respeitosa.
“Apesar do pouco tempo de vida, ao longo do dia 15 a TVT entrou com entrevistas ao vivo e fez questão de mostrar imagens, comentar e analisar a manifestação. Foram três entradas de aproximadamente 20 minutos cada. Pouco? Pode até ser. Mas foi muito se compararmos ao aparato utilizado pelas emissoras comerciais. Fomos a única emissora de TV aberta a fazer contraponto. Esse foi um marco histórico dentro da TVT.”
– Qual foi o principal objetivo da TVT ao cobrir as manifestações? Quais são os resultados ou impacto esperado?
– Mostrar que há um escandaloso jogo político em disputa. E que as versões exibidas nas TVs comerciais mostram somente uma realidade parcial, escolhida a dedo e da parte que lhes interessa. É público e notório que há um uso desproporcional e tendencioso nas coberturas. O principal objetivo da mídia alternativa é divulgar, informar. Levar outras versões da mesma história, com outros olhares para que, ao final, o espectador tenha condições de avaliar criticamente o que é ou não correto. É mostrar que se o fato é um, as versões não. O resultado está no crescente retorno de pessoas reconhecendo a transparência na cobertura da TVT e das outras mídias alternativas. Apesar do pouco tempo de vida, ao longo do dia 15 a TVT entrou com entrevistas ao vivo e fez questão de mostrar imagens, comentar e analisar a manifestação. Foram três entradas de aproximadamente 20 minutos cada. Pouco? Pode até ser. Mas foi muito se compararmos ao aparato utilizado pelas emissoras comerciais. Fomos a única emissora de TV aberta a fazer contraponto. Esse foi um marco histórico dentro da TVT. O dia em que uma emissora outorgada a um segmento social organizado ousou demarcar o território dominado por uma mídia partidarizada.
– Você acha que esses objetivos foram ou estão sendo alcançados?
– Eu acredito que sim. Porque se nos comprometemos em trazer versões diferentes, com atores e protagonistas sociais que não têm espaço e voz na mídia tradicional, e eles aceitam falar e proporcionam a possibilidade de debatermos temas de relevância coletiva, cumprimos um papel básico de uma emissora de TV de caráter educativo. A TVT tem como premissa básica, dar voz a todos, principalmente os segmentos sociais apartados e excluídos da mídia tradicional. E apesar dessa ampla abertura para todos os segmentos sociais e políticos, dos movimentos que estiveram presentes no ato do dia 15, poucos são os que aceitam nossos convites para colocar na mesa, de forma clara transparente, as questões que podem ajudar a encontrar conjuntamente os caminhos para as transformações sociais que o país exige. O mais interessante é que os movimentos sociais estão aproveitando essa chance e ocupando esse espaço democrático. Esse é o nosso foco.
– Segundo a grande mídia, o protesto do dia 15 foi pacífico e apartidário. Você concorda?
“O ato do dia 15 foi confuso. A gente viu várias frentes, algumas pedindo o impeachment, outros a volta da ditadura, fim da corrupção, etc. O fato de não terem ocorrido brigas é um argumento que não sustenta a tese de que o protesto do dia 15 tenha sido pacífico.”
– O ato do dia 15 foi confuso. A gente viu várias frentes, algumas pedindo o impeachment, outros a volta da ditadura, fim da corrupção, etc. O fato de não terem ocorrido brigas é um argumento que não sustenta a tese de que o protesto do dia 15 tenha sido pacífico. E não precisa nem recorrer às matérias de jornalistas e coletivos independentes para mostrar os gritos e os dentes à mostra vociferando os mais diversos palavrões e destilando ódio à exaustão. É só dar um passeio rápido pelas páginas pessoais do Facebook para ver a violência gratuita em vídeos, cartazes, camisetas e nas selfies solitárias, em duplas e em grupo.
A violência não é só o tapa na cara, o murro na boca do estômago. Ela caminha junto na falta de educação e na falta de respeito ao chamar uma mulher – presidente ou presidenta – de vaca, de puta, de vagabunda. É o preconceito velado – e revelado – por colocar trabalhadores e trabalhadoras como uma classe menos esclarecida pela origem mais humilde. A violência também mostra a cara quando tenta fomentar o terceiro turno das eleições ganhas nas urnas, democraticamente; quando tenta negar o acesso de uma camada enorme da população, historicamente excluída, reduzindo essa dívida social à dependência do Bolsa Família; quando tenta negar as cotas para negros nas universidades. Longe de ser um ato pacífico, o dia 15 de março entra para a história do Brasil como um dos dias mais tristes que o país já viveu. O dia em que parte da população saiu às ruas como zumbis cheios de ira e ódio para pedir, entre outras coisas, a volta da ditadura, da intervenção militar, do impeachment oportunista.
“A violência não é só o tapa na cara, o murro na boca do estômago. Ela caminha junto na falta de educação e na falta de respeito ao chamar uma mulher – presidente ou presidenta – de vaca, de puta, de vagabunda. É o preconceito velado – e revelado – por colocar trabalhadores e trabalhadoras como uma classe menos esclarecida pela origem mais humilde.”
A TVT – TV dos Trabalhadores tem lado e deixa claro a sua posição: estamos ao lado das trabalhadoras, dos trabalhadores, dos movimentos sociais, das minorias, dos excluídos da mídia. Isso está no DNA da TVT. Desde o seu nascimento há 30 anos. E seguirá assim. Buscando dar voz aos que querem e lutam por um país mais justo, mais igualitário. Para todos. E acredito que estamos cumprindo essa missão.