Mídia comercial transforma interesses de grupos monopolistas em ‘interesses da população’

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Por Redação RBA – 

Em encontro realizado no Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, jornalistas discutem o papel da imprensa comercial em diferentes crises políticas na história do país.

São Paulo – O Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé preparou um ciclo de debates que marcam a Semana Nacional pela Democratização da Comunicação, que vai até o próximo sábado (21). O encontro de abertura, na noite desta segunda-feira (16), tratou o tema Crise Política e o Papel da Mídia. Fizeram parte da mesa a ex-diretora executiva do jornal Folha de S.PauloEleonora Lucena, o autor do blog Escrevinhador, Rodrigo Vianna, e o editor do portal Vermelho, Inácio Carvalho.
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Eleonora: ‘A mídia é um instrumento de guerra política’

“A imprensa sempre foi um local de disputa. A ideia que surge nos anos 1980 de mídia imparcial é uma falácia. Pode fazer sentido do ponto de vista comercial, mas historicamente não se sustenta”, diz Rodrigo Vianna. Para o jornalista, o embate se desenvolve em suas esferas. “Um deles é a política institucional, o debate sobre quem vai estar no poder, quem será emparedado, perseguido. É o papel da mídia no golpe de 2016. O segundo nível é o mais profundo, lento e longo, que é o debate de valores”, acrescenta.

Vianna observou uma unificação do discurso da imprensa em ofensivas editoriais contra o governo de Dilma Rousseff, que acabou sofrendo o impeachment no ano passado. Entretanto, com o desenrolar do governo de Michel Temer (PMDB), o jornalista questiona uma nova divisão entre os veículos. “Talvez, Temer não tenha atendido a alguma exigência comercial de alguns grupos, em especial da Globo”, disse.




“Veja, o Grupo Bandeirantes foi o que mais recebeu ajuda após a saída da Dilma e ele estava quebrado. Agora, a Globo também foi atendida, mas se descolou e partiu para a oposição. Para além da agenda comercial, que poderemos descobrir no futuro, é possível pensar que o Temer suja demais o golpe. Corrupto. Então, Temer atrapalha o projeto neoliberal da Globo”, completa.

A fala de Eleonora foi marcada pela apresentação de um breve panorama histórico sobre as formações de unidade e cismas na imprensa comercial. “Temos como a primeira evidência entre a relação mídia e política a Revolução Francesa, o que aconteceu nas vésperas, um festival de embates na mídia. Sempre que há crise, o papel da mídia é fundamental. No momento da independência do Brasil também era contundente e forte essa relação”, disse.

“No século 20, começam a florescer jornais mais fortes, muitos ligados a grupos econômicos. Então, temos uma efervescência no mercado jornalístico. Veja, no suicídio de Getúlio, a relação com Carlos Lacerda. Houve o uso da mídia como instrumento político. A mídia é um instrumento de guerra política. Dez anos depois, em 1964, a mídia novamente teve um papel crucial. Praticamente todos os jornais se alinharam com o golpe de 1964. Com o fechamento e a censura, houve alguma resistência, em especial no exterior, mas a ditadura sufocou a resistência”, completou a jornalista.

Entretanto, o cenário de divisões foi amenizado, de acordo com Eleonora, após o advento da televisão no país. “No momento da ditadura, de sufoco da oposição, aconteceu o fator transformador da mídia brasileira, que foi a televisão. Em nenhum outro lugar a televisão alcançou tamanho poder como no Brasil. Uma verdadeira força de formação de ideias, que veio a partir do regime militar. Uma voz que esmagou outras iniciativas, de papel integrador e formador, que formata ideias de país.”

Após meados da década de 1970, o discurso contrário à ditadura cresceu, mesmo com oposição da televisão. O fracionamento ideológico nas mídias concomitante com a redemocratização se sustenta, segundo Eleonora, por um longo período, que não impediu as consecutivas vitórias de governos progressistas, como os dois mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“Agora, tivemos um reagrupamento dramático das linhas editoriais dos meios de comunicação que acabaram a liderar o avanço do neoliberalismo no mundo, também dos ideais conservadores. Então, surgem os mesmos argumentos usados durante o período do golpe de 1964, que engloba a corrupção. A corrupção é o tema que a mídia comercial acaba vocalizando. Isso não acontece por acaso. Essa fúria da imprensa contra a esquerda tem como pano de fundo a reestruturação do capitalismo”, completa.

As estratégias da mídia comercial de vocalizar pensamentos únicos e sufocar as dissidências, que se repetiram durante o pré-golpe de 1964 e nos movimentos pró-impeachment, foram tema de fala do editor do portal Vermelho. “A Rede Globo atua de fato a interferir na realidade. Isso se repete. Durante as Diretas, a Globo noticiou que o comício por eleições diretas era a festa do aniversário de São Paulo. Eles testam e constroem narrativas. Outro episódio, mais recente, já com o Lula, foi o debate de segundo turno das eleições de 1989”, disse Inácio Carvalho.

“A intervenção militante é permanente. Isso está desde o editorial do primeiro dia após o golpe de 1964 do jornal O Globo, que exaltou o regime dizendo que o Brasil saía da anarquia, que as famílias estavam felizes. Eles transformam os interesses dos grupos monopolistas nos interesses da população. Em 2016, seguiu a mesma lógica. Manchetes do mesmo jornal exaltando “famílias” que marchavam contra Lula e Dilma e a favor de Moro. Falavam ‘Brasil vai às ruas”. Quando é do outro lado, como dizia a Eliane Cantanhêde, são meia dúzia de militantes”, completou.

 

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