Por Washington Araújo, jornalista
Amiga do meu bairro do coração, Vila Maria na Zona Norte paulistana, Rosária de Fátima Lucas mandou outro dia pelo WhatsApop um vídeo de sua família cantando “Meu Primeiro Amor”, música de toda a infância de quem tem mais de 50 anos, de José Fortuna e Hermínio Gimenez, imortalizada pela dupla Cascatinha e Inhana.
Fiquei emocionado ao ver e ouvir e logo lembrei-me de minha mãe, Dona Inez, que aos 86 anos anos adora cantar.
Agora, no feriado de Sete de Setembro, eu e a companheira Carmola, que moramos no Rio de janeiro, fomos para São Paulo ver a parentaia e amigos(as) e, lógico, a mãe Inez. Lá, resolvemos mostrar o vídeo para ela, que desandou a cantar “meu primeiro amor, foi com uma flor que desabrochou e logo morreu…”
Pois bem, gravei, minha mãe Inez, acompanhada pela Carmola, o mano Lula e a prima Isabel.
Daí, enviei o vídeo para a Rosária e pedi que ela contasse a história desta sua família, tão afinada. Ela não só fez um belo relato como enviou outros vídeos (estes ficaram para o futuro, para dar um gostinho de “quero mais”).
Seguem o relato de nossa amiga e os vídeos:
“Washington, minha família é bem numerosa (mãe, pai, cinco filhas e cinco filhos, que depois aumentou no cumprimento da lei: “crescei e multiplicai”. Viemos para São Paulo, saídos de Minas em dois momentos.
Primeiro, em 1967, com a vinda de minhas primeiras três irmãs. Vieram de caminhão com um caminhoneiro chamado Nelito, amigo de uma nossa tia, irmã de meu pai. Minha irmã mais velha, faria 18 anos, a do meio tinha 16 anos completos e a terceira, completou 15 anos, oito dias depois que chegaram. A data de chegada é 08/03/1967 – Dia Internacional da Mulher (elas não sabiam da existência da data).
E, em outubro de 1969, chegou o restante da família, sendo que o último rebento (uma rebenta!) nasceria aqui em São Paulo, cinco meses depois.
Meu pai sempre foi um cantador e amava ser! A nossa casa era muito simples, mas nela sempre havia música. Fosse no rádio Semp movido a dínamo, já que lá na roça, nos idos da década de 50/60, não havia iluminação pública, ou até vitrola movida manualmente. O mais comum mesmo era a gente junto com nosso pai com um violão que não me lembro se era dele, com os grossos dedos batendo nas cordas do violão e cantando alguma canção.
Nas noites enluaradas ou não na minha infância, meu pai que gostava de uma cachacinha até chegar ao ponto de ser bem grave tanto para ele quanto para a família, sentava com a gente na soleira da porta da sala de casa…
Lá fora, o sereno caindo, o som do canto dos grilos, um ou outro berro do boi ao longe ou no curral, o som das cordas do violão e a voz de meu pai…”Índia seus cabelos….”, papai era o espírito da música. Daí do luar, à selva de pedra.
Crescemos todos na cidade de São Paulo que amamos e a ela somos gratos, pois sobrevivemos a muitas situações com realizações e bravura. Até que mamãe parte – um pouco cedo demais pra nós! E papai, que viveu mais 12 anos, fica por aqui com a gente, sua voz e seu violão (tem uma história bonita sobre o violão que minha irmã e eu demos a ele, num Natal).
Um meu irmão, já casado e que morava próximo da casa da família (no extremo sul de São Paulo, Grajaú) começou a duetar com meu pai, isto aconteceu depois da partida de mamãe. Esse meu irmão não toca nenhum instrumento, porém tem uma linda voz.
Quase sempre nos finais de semana, nos reuníamos e a dupla cantava e a gente acompanhava. E a cantoria às vezes acontecia na cozinha enquanto o almoço do domingo estava sendo preparado, na sala com toda a movimentação de chegada das filhas com marido e filhas e/ou filhos, dos filhos com suas esposas (com ou sem), com ou sem os filhos… E, também sobrinhos, amigos, etc. Era, sim, uma casa animada.
Aos 91 anos, papai ainda muito consciente, começou a ter dificuldades para tocar o violão. Então, no final de 2015 ele decidiu naturalmente que era hora de partir! E partiu. Ficamos órfãos de meu pai e do violão, que já era outro que novamente minha irmã e eu demos de presente a ele.
A música não podia parar, e a gente gosta muito de cantar… Atualmente, nos reunimos com frequência na casa da minha irmã primeira Leda Maria, em Porangaba, interior de São Paulo, que recentemente perdeu seu companheiro, que estava aprendendo a tocar violão – um exercício importante durante a pandemia.
A gente resiste, insistindo na caminhada que nos compete com amor, carinho, música, luta, esperança, cerveja, lembranças, gratidão e tudo mais…”
Participantes no vídeo escalados por Rosária de Fátima, que também participa – irmãos: Itamar, Serginho e Jerry; irmãs: Leda e Norma; sobrinha: Alessandra e Tuta, companheiro; cunhada: Célia Garrido e sua mãe. Dona Neusa: amigos(a): Isabel e Akira.