Miriam Dutra-FHC: fomos todos cúmplices

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Por Tereza Cruvinel, Brasil 247 – 

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Estamos diante de mais uma visita da hipocrisia nacional, e especialmente, da hipocrisia midiática. Para os donos e para os profissionais da imprensa nacional, não há surpresa alguma, não há novidade alguma no que a jornalista Miriam Dutra contou em duas entrevistas – uma à revista BrazilcomZ, outra à jornalista Monica Bérgamo,  na Folha de S. Paulo –  sobre seu relacionamento com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Ao longo dos últimos 30 anos este foi o maior segredo de polichinelo de Brasília,  na elitista colmeia que reúne o jornalismo e a política.  Ali fui também uma abelha importante por muitos anos, até ser expurgada por razões de não vêm ao caso aqui. Na colmeia, todos sempre souberam  e muitos testemunharam tudo isso que agora surge como notícia e revelação. Agora a mídia trata do assunto não apenas porque Miriam falou mas também porque os fatos, de tão velhos, não podem mais morder os envolvidos, ou talvez porque o ex-presidente já entrou para o Olimpo histórico, onde se pensa que nada mais pode atingi-lo.




Ao longo dos últimos 30 anos, o romance, o filho e o exílio bem remunerado de Miriam foram ignorados pela mídia porque pertenceriam ao domínio da vida privada, embora em algum momento tenha se tornado uma questão política.  Pessoalmente, defendo com fervor o respeito à privacidade das pessoas públicas, exceto quando há um tangenciamento discutível com o interesse público.

Não há um só jornalista que tenha atuado em Brasília nas últimas décadas, ou mesmo fora da capital, mas em sintonia com a política nacional, que não tenha acompanhado ou sabido dos fatos que Miriam narrou agora.  Com exceção,  talvez, da história de dois abortos, questão que ela só revelou às amigas mais íntimas ao longo destes anos. Ser bem informado em Brasília é também saber daquilo que não vira informação. A vida de Miriam e os desdobramentos do caso. ao longo dos anos,  sempre foram acompanhados com interesse pela imprensa, não para produzir notícia mas para o controle da informação, digamos assim.

No mais, fomos todos cúmplices, assim como ela própria viveu tudo isso porque, como disse, porque se permitiu.  Nunca ninguém sequer cogitou, em nenhuma redação de Brasília, de escrever sobre o assunto.  Nem os chefes e muito menos os repórteres.  Nunca se ignorou que Fernando Lemos, então marido da irmã de Miriam, fosse o encarregado da parte financeira do problema. Ela tinha muitos e gordos contratos pela Esplanada afora na era FHC. Ele já se foi mas a morte não interdita a verdade.  Nunca se ignorou que a  TV Globo  mantinha Mirim contratada mas não a pautava.  Até há dois anos atrás, quando veio à baila a história do DNA com afirmação em contrário, Thomaz Dutra era por todos, inclusive pelo próprio, tido como filho do ex-presidente. Nunca se ignorou que dona Ruth Cardoso, em vida,  aborreceu-se tanto com a historia que um reconhecimento, enquanto ela vivesse, tornou-se inviável.

Quando a revista “Caros Amigos” fez uma matéria sobre o assunto, há alguns anos, talvez uns dez ou doze, a reação da grande  mídia foi um silêncio obsequioso.

Então não me venham, caros colegas, com estes ares de novidade.

Miriam deve ter suas razões para falar agora, e sejam quais forem, é um direito dela.  O ex-presidente falará se quiser.

Aos brasileiros hoje divididos pelo conflito político, a história apenas confirma a opção preferencial da grande mídia pelo PSDB. Aos moralistas de plantão, reitera que o método de resolver problemas pessoais da elite política sempre foi o mesmo: passando pelo Estado ou pelas conexões empresariais.

De resto, o folhetim nos diz que o amor faz das suas, em todos os ambientes. Miriam era uma moça linda e desejada. FHC um homem brilhante, inteligente e charmoso, que encantava mesmo as mulheres. Alguns abismos os separavam. Deu nisso. Ou, como eu ouvia de uma velha tia,  incrédula, quando era menina em Minas: “o amor é uma flor roxa que nasce no coração dos trouxas.”

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