Publicado em RBA –
Ricardo Silva Nascimento, o Negão, foi executado em Pinheiros, em São Paulo. Moradores e ativistas realizam ato contra a violência policial na Catedral da Sé, nesta quarta-feira
‘A violência policial que acometeu a vida de Ricardo se repete todos os dias nas periferias’
São Paulo – “Ricardo Silva Nascimento (Negão) foi executado pela Polícia Militar. Nós, mais uma vez, temos que testemunhar que estamos do lado dos mais pobres, dos mais fracos, contra essa violência sistemática e contínua que os extermina”, diz o padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo da Rua. Júlio convoca os paulistanos a comparecer na missa de sétimo dia de Negão, que será realizada amanhã (19), às 12h, na Catedral da Sé, centro de São Paulo.
A missa será combinada com a realização de um ato político em repúdio à violência policial. “Ricardo, carroceiro que morava na região de Pinheiros, foi assassinado com dois tiros! A missa será também um ato de denúncia contra a violência policial que, sistemática e diariamente, assassina o povo pobre, preto e indígena de nosso país. É importante salientar que a violência policial que acometeu a vida de Ricardo se repete todos os dias nas periferias das cidades do estado de São Paulo”, afirma a organização no evento marcado pelo facebook.
A iniciativa da realização da missa de sétimo dia na catedral metropolitana partiu do jornalista Audálio Dantas, que contou com pronto apoio do padre Júlio. Em entrevista à Rádio Brasil Atual, Audálio falou sobre o local simbólico, onde em 31 de outubro de 1975, milhares de pessoas desafiaram a ditadura e se reuniram para a missa de sétimo dia do jornalista Vladimir Herzog, assassinado no DOI-Codi, em São Paulo.
Na ocasião, Audálio era presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. “Tenho dito em várias ocasiões que os governos democráticos brasileiros que vieram depois da ditadura não tiveram a coragem de enfrentar esse problema. Eu diria que a situação da violência, principalmente contra pobres e negros é muito mais grave do que na época da ditadura. Lá, a classe média brasileira se levantou contra a violência contra os presos políticos, já que eles eram em sua maioria da classe média. Mas depois da democratização, a violência continua no escuro da periferia”, afirma.
A iniciativa da realização da missa conta com o apoio de moradores do bairro de Pinheiros, onde Negão foi assassinado na última quarta-feira (12). O local concentra tradicionalmente moradores de classe média. Para Audálio, o contato com a violência policial excessiva, contra um negro e pobre nas ruas de Pinheiros pode servir para “acordar” a classe média. “Hoje, mais do que nunca, é preciso que as pessoas se compenetrem de que um dia a violência pode chegar a eles. Neste caso, chegou contra um trabalhador negro. As pessoas viram e se chocaram”, disse.
“Elas não se chocam quando isso acontece na periferia, na calada da noite ou nas delegacias de polícia. Acho que esse caso pode ser simbólico no sentido de finalmente haver uma reação contra a violência policial. Acho que chegou o momento da sociedade assumir o papel de defesa do povo esquecido em todos os sentidos. Esse povo tem o direito de viver”, acrescenta. Para Audálio, a mobilização em Pinheiros, mostra reação da sociedade. “A classe média, normalmente apática à violência contra o povo mais humilde, desta vez reagiu, pois o que aconteceu foi na cara.”
Ouça a íntegra da entrevista com o jornalista Audálio Dantas: