Por Carlos Eduardo Alves, jornalista –
Aos poucos, a campanha pelas diretas vai morrendo. É duro, triste, admitir, mas a realidade é que até agora não há rua suficiente para expulsar a gangue que se apoderou do Poder. O pior é que essa falta de mobilização ocorre quando todas as pesquisas de opinião apontam no máximo uma aprovação de irrisórios 7% para Temer. O que explicaria o descompasso entre rejeição quase unânime e falta de gente gritando para valer?
Antes, uma liminar: ocorreram sim até agora algumas manifestações relevantes, mas nem o velhinho de Moscou seria capaz de cometer que elas foram volumosas a ponto de abalar a governabilidade. Temer está caindo (ou não) por causa de corrupção e, precisamos enxergar a realidade, por uma campanha de causa misteriosa da Globo, uma das patrocinadoras e mentoras do golpe contra Dilma. Não é pelo movimento popular e nem pela recente e vitoriosa greve geral.
Voltando ao fenômeno que começa a intrigar muitos pelo ineditismo, pode ser que algum ou vários cientistas políticos sérios estejam tentando com sucesso alguma explicação, mas as grandes mídias ultimamente optaram, quase com unanimidade, por “análises” rasas do padrão Bolivar Lamounier. O que se tem lido até agora justifica a apatia como fruto de um “cansaço” da população com tantos casos de corrupção, com a Lava Jato etc. Teria se criado um ambiente de descrédito com o País e com a Política.
A ojeriza com a Política, trágica como ensina a História, é fato. A assustadora penetração da besta Bolsonaro na classe média e, principalmente, na juventude sinaliza que a tese é bem razoável. E aí é inevitável voltar a um mea culpa. É verdade, nem tanto como os conservadores insistem mas ainda assim verdade, que a esquerda saiu fragilizada do golpe e com tantas denúncias de corrupção. Sempre é fundamental dizer que não se deve confundir a força atual de qualquer esquerda com o vigor eleitoral de Luiz Inacio Lula da Silva. O ex-presidente é querido e idolatrado por muita gente pobre que não obrigatoriamente segue partidos.
As ruas sempre foram majoritariamente de esquerda, mesmo quando os progressistas não eram maioria na população. A direita tomou o asfalto a partir de 2013, por uma conjunção de fatores que não cabe analisar aqui. Mas, desalojado o petismo do Planalto, a direita de rua voltou para o conforto das casas de classe média. E a esquerda não retomou seu lugar histórico. É duro reconhecer, mas é fato. Não estamos mostrando força para isso.
Na ponta do espectro político, a ultra esquerda obviamente culpa o PT pelo quase silêncio nas esquinas ao menos das grandes cidades. O dedo apontado tem talvez a maior dose do olhar num eventual butim que teria sido deixado pelo partido ainda hegemônico nas esquerdas. O PT, no entanto, segundo o insuspeito DataFolha, permanece como a legenda preferida dos brasileiros, com 18%, mais do triplo de PSDB e PMDB. Mais aparentemente paradoxal, a curva de aprovação do PT segue em crescimento, mesmo em época de sua criminalização. Nessa mesma pesquisa, porém, há outro número revelador. A maioria do eleitorado brasileiro não manifesta apoio a nenhum partido. É outro dado que sugere que o quadro atual favorece o surgimento de fraudes como o “gestor” Doria ou o medieval Bolson aro.
Em qualquer hipótese para explicar a debilidade da voz das ruas, nada desobriga as esquerdas de cumprirem seu papel de direção política. Enquanto Temer e sua cleptocracia continuarem, os direitos sociais continuarão a sofrer assédio mortal. Partido que renuncia à luta é condenado pela História e, no presente, pelos que pretende representar. A propósito, talvez uma parte do sentimento de apatia possa ser debitado a parlamentares do campo popular que em determinado momento passaram a privilegiar gabinetes e esqueceram que a realidade exige que quem quer estar antenado com as aspirações da maioria da população não pode abandonar a luta fora do institucional.
O Brasil vive um quadro ilógico, é verdade. Mas o pano de fundo é a mesma e histórica questão de classe. Em quadros novos e intrigantes como o de agora nunca é impossível que um fato novo mude o cenário e que as ruas voltem com vigor. E a direção política é fundamental se isso ocorrer. Se o quase silêncio permanecer, duas tarefas ligadas: buscar entender a razão sem abrir mão de princípios que jamais poderão ser negociados.