Moro e Bolsonaro: verso e reverso de uma moeda podre

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Por René Ruschel, jornalista, Bem Blogado

A diferença entre Bolsonaro e Moro é a sutileza da fala, dos afagos e gestos. O primeiro, adestrado na rudeza dos quartéis. O segundo, embora apoie a tese da excludente de ilicitude, uma espécie de licença para matar, se escondeu atrás da toga de juiz para falar em Justiça.




Sérgio Moro está de volta. Agora, como político militante e pré-candidato à presidência da República. Em Brasília, na última quarta-feira, 10, assinou ficha de filiação ao Podemos, um pequeno partido de direita capitaneado pelos três senadores do Paraná – Álvaro Dias, Oriovisto Guimarães e Flávio Arns. Foi recebido com pompas de estadista.

O ex-juiz, uma espécie de Torquemada tupiniquim, com a voz anasalada e monocórdia, fez um longo discurso. Aliás, vazio, sem enredo, ânimo ou projetos.

Propôs a reforma do Estado sem apontar caminhos que protejam os quase 20 milhões de miseráveis que passam fome e não encontram trabalho.

Preferiu um populismo neoliberal que prega a meritocracia em um País que é vice-campeão mundial como a pior distribuição de renda.

Nem as mais de 607 mil vítimas da Covid foram capazes de sensibilizá-lo a enaltecer a saúde pública, o SUS.  

A educação, outro campo de terra arrasada em Pindorama, não mereceu maiores comentários. Mas para este tópico existe justificativa. Um de seus maiores apoiadores, o senador Oriovisto Guimarães, é um poderoso empresário dono do grupo Positivo de educação. Assim, não se fala de corda em casa de enforcado, diz o ditado.

Recorreu a uma única retórica, por sinal desgastada, injustificada: o combate à corrupção. Faltou, inclusive, criatividade. Ao fundo, uma bandeira do Brasil invocava o patriotismo que o escritor inglês, Samuel Johnson, classificou como “o último refúgio dos canalhas”. No auditório, poucos políticos, empresário e militares se dividiam em aplausos modestos.

Moro e os senadores paranaenses cavoucam nas cinzas da República de Curitiba a perspectiva de ocupar o vazio político que a catástrofe de um ex-capitão provocou no País.

Classificada como “terceira via”, a “tchurma”, responsável pela eleição de Jair Messias em 2018, agora se posta como salvadores da pátria. Nada soa mais falso, como sempre soou a Operação Lava Jato. Mas, neste caso, a farsa veio à tona.

O STF escancarou ao País todas as negociatas, sujeiras, mazelas e tramas entre Moro e seu fiel escudeiro, o também agora ex-procurador da República, Deltan Dallagnol. A Operação Vaza Jato, por meio de áudios, mostrou e provou os diálogos entre a trupe que visava apenas e tão somente prender o ex-presidente Lula para afastá-lo da disputa presidencial de 2018. Havia, desde então, um projeto político que agora querem consumá-lo.

Em Curitiba, alimentado pela vaidade e ânsia em busca de poder, Moro reinou absoluto enquanto foi capaz de encobrir a fraude que orquestrava. Entremeava o poder do magistrado com frivolidades do cotidiano. Nas plateias dos teatros e shows tinha seu nome anunciado. Sob o delírio da patuleia, punha-se em pé, agradecia e acenava.

Joseph Goebbels não teria um discípulo tão fiel – depois de Hitler, naturalmente. A imprensa nativa tratava de estampar fotos de visitas dos “conjes” aos camarins. Na sede da Justiça Federal era cortejado por apoiadores locais e atores globais de passagem pela cidade.

A cegueira pelo poder pode conduzi-lo para um cadafalso final. Inexperiente no tabuleiro político deixou a magistratura para se tornar ministro da Justiça com a promessa de ocupar uma cadeira no STF. O enredo final todos conhecem.

O ex-capitão e o ex-ministro se engalfinharam em uma luta por espaços e sobrou para o mais fraco. A regra no governo de Messias é aquela anunciada pelo general Eduardo Pazuello onde “um manda e o outro obedece”.

A diferença entre Bolsonaro e Moro é a sutileza da fala, dos afagos e gestos. O primeiro, adestrado na rudeza dos quartéis, afirmou em 2017 que “sou capitão do Exército, minha especialidade é matar, não é curar ninguém”.

O segundo, embora apoie a tese da excludente de ilicitude, uma espécie de licença para matar, se escondeu atrás da toga de juiz para falar em Justiça. Agora, terá que enfrentar a realidade de um país que ele não conhece, não provou e é possível que não tenha sequer estudado.

Ambos são o verso e o reverso da mesma moeda, de uma moeda podre. O Brasil não aguenta mais tanta desfaçatez.

Sobre o autor:

René Ruschel, economista e jornalista, graduado pela Universidade Federal do Paraná. Colaborou com os jornais Folha de Londrina e Correio de Noticias, ambos do Paraná, e as revistas Brasileiros e Carta Capital. Foi assessor de imprensa da Fundação Itaipu-BR, Fibra, em Curitiba-PR.

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