Publicado em A Tribuna –
Morreu na noite desta sexta-feira (1º), aos 93 anos, o maestro e compositor Gilberto Mendes em Santos. Ele estava internado desde a véspera do Natal na Unidade de Tratamento Intensivo (UIT) da Santa Casa de Santos devido a problemas respiratórios. Sofria de asma e teve uma crise, segundo o escritor Flávio Viegas Amoreira. Morreu às 18h40, por falência múltipla de órgãos. Gilberto era casado há 40 anos e tinha três filhos, um deles já falecido.
O corpo do compositor será velado a partir da manhã deste sábado (2), às 9 horas, na Memorial Necrópole Ecumênica, em Santos, e cremado no mesmo local, em horário a ser definido.
“Ele estava lúcido, compondo, com uma série de projetos. Tinha apresentado uma alta melhora, mas sofreu queda de pressão. Estava na mais perfeita e assustadora lucidez”, comentou Amoreira.
Ainda de acordo com o escritor, Mendes tinha prontos uma canção e um romance sobre a época em que militou no Partido Comunista Brasileiro (PCB), sob o título provisório de ‘Memórias de um Ex-Camarada’. O objetivo de Amoreira é que seja lançado neste semestre.
“Gilberto militou no Partido Comunista por cerca de 20 anos, do fim da Segunda Guerra Mundial (em 1945) até 1962, 1963. No dia do Golpe (de 1964), ele pegou tudo o que tinha sobre o partido e jogou no mar, na Ponta da Praia”, detalhou Amoreira, ao lembrar o “nome de guerra” do músico no partido: Ramiro.
Biografia
O maestro e compositor Gilberto Ambrosio Garcia Mendes nasceu em Santos, no dia 13 de outubro de 1922. Filho de Ana Garcia Mendes e Odorico Mendes, se definia um homem de beira-mar, que gostava de caminhar pela praia ao lado da esposa Eliane Ghigonetto.
Gilberto fez o primário entre São Paulo e Santos. Iniciou seus estudos de música aos 18 anos, no Conservatório Musical de Santos, com Savino de Benedictis e Antonieta Rudge. Praticamente autodidata em composição, compôs sob orientação de Cláudio Santoro e Olivier Toni, e freqüentou o Ferienkurse fuer Neue Musik de Darmstadt, Alemanha, em 1962 e 1968.
Foi um dos signatários do Manifesto Música Nova, publicado pela revista de arte de vanguarda Invenção, de 1963. Foi porta-voz da poesia concreta paulista, do grupo Noigandres. Como conseqüência dessa tomada de posição, tornou-se um dos pioneiros no Brasil no campo da música concreta, aleatória, serial integral, mixed média, experimentando ainda novos grafismos, novos materiais sonoros e a incorporação da ação musical à composição, com a criação do teatro musical, do happening.
Também professor universitário, conferencista, colaborador das principais revistas e jornais brasileiros. Gilberto Mendes foi fundador (1962) e ainda o diretor artístico e programador do Festival Música Nova de Santos, o mais antigo em seu gênero em toda a América. Como professor convidado e composer in residence, deu aulas em The University of Wisconsin-Milwauke, na qualidade de University Artist 78/79 e Tinker Visiting Professor.
No Brasil, recebeu, entre outros, o Prêmio Carlos Gomes, do Governo do Estado de São Paulo, e também diversos prêmios da APCA, o I Prêmio Santos Vivo, dado pela ONG de mesmo nome, pela sua obra “Santos Football Music”, além de ter sido indicado para o Primeiro Prêmio Multicultural do jornal “O Estado de S. Paulo”. Também recebeu a Bolsa Vitae, o prêmio Sergio Mota hors concours 2003 e o título de “Cidadão Emérito” da cidade de Santos, dado pela Câmara Municipal de Vereadores.
Em cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília, no ano de 2004, o autor recebeu a insígnia e diploma de sua admissão na Ordem do Mérito Cultural, na classe de comendador, do Ministério da Cultura, das mãos do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e do Ministro da Cultura, Gilberto Gil.
Verbetes com seu nome constam das principais enciclopédias e dicionários mundiais, como o Grove em inglês, o Rieman alemão, o Dictionary of Contemporarry Music, de John Vinton e vários outros. Sua obra já foi tocada nos cinco continentes, principalmente na Europa e EUA. Destacam-se, para orquestra, Santos Football Music e o Concerto para Piano e Orquestra; para grupos instrumentais, Saudades do Parque Balneário Hotel, Ulysses em Copacabana Surfando com James Joyce e Dorothy Lamoura, Longhorn Trio, Rimsky; para coro, Beba Coca-Cola, Ashmatour, O Anjo Esquerdo da História, Vila Socó Meu Amor e inúmeras peças para piano e canções.
Gilberto Mendes foi doutor pela Universidade de São Paulo, onde deu aulas no Departamento de Música da Escola de Comunicações e Artes até se aposentar. Fez parte, como membro honorário, da Academia Brasileira de Música, e do Colégio de Compositores Latino-americanos de Música de Arte, com sede no México.