Schmidt, autor dos livros didáticos mais lidos no Brasil, foi acusado de fazer propaganda comunista. Vítima de fake news, partiu sem reparação
Morreu neste domingo (9) o autor de livros didáticos Mario Schmidt, responsável por uma das obras mais compradas pelo Ministério da Educação – “Nova História Crítica” – e vítima de um massacre midiático encabeçado por Ali Kamel, da Globo, em sua cruzada ideológica contra a esquerda. O óbito foi comunicado neste domingo por Arnaldo Saraiva, editor de livros didáticos e fundador das editoras Saraiva e Nova Geração.
Por Cintia Alvesalvess, compartilhado de Jornal GGN
Em meados de 2007, durante o governo Lula, Kamel divulgou no jornal O Globo um artigo chamado “O que ensinam às nossas crianças”, com trechos do livro de Schmidt sobre a revolução Russa, Cubana, a antiga União Soviética, capitalismo, a revolução cultura chinesa, entre outros tópicos. Reproduzido em vários outros jornais, o texto acusava Schmidt de fazer propaganda ideológica do comunismo.
“Nossas crianças estão sendo enganadas, a cabeça delas vem sendo trabalhada, e o efeito disso será sentido em poucos anos. É isso o que deseja o MEC? Senão for, algo precisa ser feito, pelo ministério, pelo congresso, por alguém”, apelou Kamel.
O Estadão chegou a fazer um levantamento indicando que ao menos 20 milhões de alunos tiveram contato com o “livro polêmico” ao longo de uma década. Em nota, a editora Nova Geração explicou que os livros didáticos eram adquiridos pelo MEC, mas escolhidos apenas pelos professores das escolas públicas, “sem interferência alguma de funcionários do Ministério”. Kamel também omitiu em seu artigo a informação de que o livro fazia críticas ao marxismo e fora adquirido pela primeira vez durante o governo FHC.https://248d7b37f20de022fa9cb59381fc6558.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html
Editorial no jornal O Tempo chamou a obra de “lavagem cerebral”. Na revista Veja, o blogueiro Reinaldo Azevedo embarcou na onda e acusou o autor de “delinquência intelectual, picaretagem teórica, vulgaridade, mistificação, propaganda ideológica de quinta categoria. Tudo pago com o nosso dinheiro”.
Além de atacar o conteúdo do livros, a grande mídia passou a questionar a formação de Schmit. Época escreveu que ele não conseguia comprovar ao MEC que tinha “curso superior em História ou em qualquer outra área” e, por isso, seus livros deixariam de ser comprados pelo governo, a partir de 2008, com uma mudança na lei.
REPARAÇÃO HISTÓRICA
“Mario Schmidt foi o autor mais amado e idolatrado, a palavra é esta mesmo i-do-la-tra-do”, escreveu Arnaldo Saraiva em comunicado obtido pelo GGN.
“Foi também o mais odiado, perseguido e injustiçado pela extrema-direita, capitaneada pela Rede Globo e seus ‘jornalistas’ liderados pelo Ali Kamel, também conhecido por seus colegas como Pangaré que não sabe escrever”, disparou.
Segundo Saraiva, “o Pangaré publicou no moderado jornal O Globo e repercutida à exaustão por um grupo de jornalistas puxa-saco (Miriam Leitão, Sardemberg, Arnaldo Jabor e outros), que não leram uma linha sequer da obra e saíram falando pelos cotovelos e repercutindo a matéria asquerosa e destruindo a reputação do autor ‘comunista’ Mario Schmidt, da Nova História Critica. Um verdadeiro massacre, desumano, falso e criminoso.”
“Criaram um verdadeiro escândalo com uma matéria falsa. Naquela época a Rede Globo ainda tinha uma certa credibilidade. Só não foi pior porque um jornalista sério, Luis Nassif, e a revista Carta Capital, saíram em defesa da verdade”, lembrou Saraiva.
CONTRA A MARÉ
“Luis Nassif foi o único que leu o livro e, diante de tantos absurdos, advertiu a mídia tradicional (Folha, Estadão, etc) a não embarcar e repercutir aquela estupidez, como tinham embarcado e repercutido, na mesma época, no falso escândalo da Escola de Base, de tão triste memória.”
Saraiva lembrou que a fake news da grande mídia fez com que pais e mães pressionassem escolas para retirar o livro de circulação; professores que defendiam a obra foram ameaçados de demissão. “(…) com toda aquela falsa e mentirosa campanha da rede Globo, o resultado foi que, no ano seguinte a obra virou pó, literalmente pó.”
O FIM DE SCHMIDT
O que fez Mario Schmidt diante de tantas injustiças? “(…) com toda a sua grandeza, enclausurou-se em sua casa, onde ele tem, com certeza, a maior biblioteca particular do Brasil, com cerca de 50.000 volumes, e passou a estudar, em média, 18 horas por dia.”
“Mario Schmidt foi, sem dúvida nenhuma, o maior sucesso editorial didático de todos os tempos. Foi o autor que revolucionou a linguagem, o visual e o discurso crítico do livro didático”, pontuou Saraiva.
“Sou neto e filho de livreiros e editores, estou nesta atividade desde a década de 50. Publiquei incontáveis livros didáticos e incontáveis sucessos. Mas, nenhum, repito, nenhum deles fez tanto sucesso como o do Mario Schmidt”, finalizou.