“Hoje tu vive como gente, por causa da maldita princesa Isabel. Senão, hoje, tu viveria no tronco levando chicotada nos lombos. E lamberia o chão que eu piso”, diz a carta
Dois servidores do Departamento Estadual de Trânsito do Ceará (Detran-CE) receberam uma carta com xingamentos e ofensas racistas depois de rebocarem carros estacionados em locais proibidos de Fortaleza. Insatisfeita em ter seu veículo retirado do local, por estar estacionado irregularmente em uma vaga de táxi, uma mulher foi até a sede do órgão entregar cartas ao departamento de fiscalização.
Os veículos foram rebocados em 11 de novembro, na Rua Marcos Macedo, no Bairro Aldeota. A mulher entregou, pessoalmente, três cartas, uma para o diretor do órgão e duas para os dois agentes. “Seus desgraçados, excomungados, amaldiçoados: que o diabo, o satanás, o senhor das trevas acompanhe vocês a partir de agora (…) Eu ainda desejo que vocês sejam demitidos, percam o emprego”, dizia um trecho da carta.
A mensagem menciona os dois servidores e ainda o motorista do reboque. “Agora vou me referir ao da cor da noite sem estrelas, o que estava dirigindo o carro do reboque: hoje tu vive como gente, convivendo com gente, por causa da maldita princesa Isabel. Senão, hoje, tu viveria no tronco, com teus antepassados, levando chicotada nos lombos. Tem inveja de mim porque sou branca, né? Se tu tivesse vivendo na época dos meus bisavós (que eram senhores portugueses, donos de escravos) e dos teus antepassados, hoje tu estaria lambendo o chão que eu piso. Morre de inveja, né, desgraçado, amaldiçoado: tu nunca será como eu. Nunca estará à minha altura”.
Segundo o motorista do reboque, maior alvo dos xingamentos, Mauro César Soares, a carta foi inesperada. “Foi um negócio muito estranho, nunca tinha passado por isso, nunca tinha recebido uma carta dessa. Ao contrário, sempre recebi muito elogio”, lamenta.
Investigações
Os servidores registraram um Boletim de Ocorrência. A mulher suspeita de escrever a carta, Jane Cordeiro Alves (cuja assinatura está ao final da mensagem), faltou ao depoimento na manhã desta terça-feira (18), na Delegacia de Roubos e Furtos (DRF), no Bairro Maraponga. Ela prometeu comparecer na quinta-feira (20), mas nega ter escrito a carta de cunho racista. De acordo com o delegado Gustavo Pernambuco, titular da delegacia, o procedimento investigativo está aberto.
“Notificamos as pessoas para comparecer à delegacia para prestar suas declarações e ouvir as partes envolvidas. Foi uma carta que realmente chamou a atenção de todos. Tudo está sendo apurado para ser encaminhado o mais rápido possível ao Poder Judiciário e, lá, serem tomadas as medidas legais”, explica.
Segundo Gustavo Pernambuco, a mulher pode responder por injúria racial, racismo e desacato. “Os fatos levam a crer que foi o veículo dela. Mas ela tem o direito de comparecer à delegacia e ficar calada, caso não compareça, tudo será encaminhado para a Justiça”, conclui.
Assista à matéria exibida no programa Barra Pesada: