MP vai à Justiça contra lei que mutila reservas ambientais de Rondônia

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Por Oscar Valporto, compartilhado de Projeto Colabora – 

Procurador-geral de Justiça entra com ação de inconstitucionalidade para barrar redução de mais de 200 mil hectares de duas unidades de conservação

Área desmatada perto de unidade de conservação em Rondônia: legalização de ocupações ilegais (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real – 07/08/2020)

A Procuradoria-Geral de Justiça de Rondônia ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), com pedido de medida cautelar, questionando trechos da Lei Complementar Estadual nº 1.089/21, que altera os limites da Reserva Extrativista Jaci-Paraná (Resex-Jaci-Paraná) e do Parque Estadual de Guajará-Mirim, “reduzindo significativamente a área dessas unidades de conservação”, que, com a lei, perdem um total de 219 mil hectares. Na ação junto ao Tribunal de Justiça de Rondônia, o procurador-geral Ivanildo de Oliveira destaca as irregularidades. “As Unidades de Conservação possuem áreas que estão sendo utilizadas em completa afronta às normas legais, ocupadas em grande parte para o exercício exclusivo da pecuária, o que é expressamente proibido pelo vasto arcabouço jurídico ambiental e constitucional, causando um passivo ambiental de proporções incalculáveis”, aponta.




O projeto de lei complementar foi enviado à Assembleia Legislativa pelo próprio governador Marcos Rocha, que reconhece até a grave situação fundiária da reserva e do parque estadual. “Conforme reconhece o governador do estado na justificativa do projeto que redundou na Lei complementar n. 1.089/2021, a Reserva Extrativista Jaci-Paraná e o Parque Estadual de Guajará-Mirim são ocupados ilegalmente e desmatados em detrimento do direito das populações tradicionais (extrativistas e outras), sem qualquer licenciamento ambiental ou autorização para supressão de vegetação nativa”, frisa o procurador-geral na ação de inconstitucionalidade.

Desde seu envio à Assembleia Legislativa em agosto de 2020, o projeto gerou a reação de entidades ambientalistas e organizações indígenas. “Invasões e ameaças aos territórios indígenas em Rondônia só vem aumentando ao longo do tempo. Mas as coisas pioraram muito com esse governo porque os invasores – madeireiros, garimpeiros, fazendeiros – sentem que tem apoio federal e estadual para ações criminosas”, afirmou Maria Leonice Tupari, dirigente da Associação das Guerreiras Indígenas de Rondônia (AGIR), ao #Colabora.

A AGIR foi uma das mais de 50 organizações – entre elas, Greenpeace e WWF Brasil – que assinaram manifesto, divulgado em todo o país e até no exterior, contra o projeto. A votação marcada para dezembro acabou adiada. Em abril, entretanto, os deputados estaduais, por unanimidade, aprovaram o Projeto de Lei Complementar 80/2020, reduzindo em cerca de 162 mil hectares a Reserva Extrativista Jaci-Paraná e em outros quase 50 mil hectares o Parque Estadual Guajará-Mirim. “Para mim, é um recado para quem grila terra pública: pode grilar que a Assembleia Legislativa regulariza. A Assembleia Legislativa apoia, muito claramente, quem causa dano ambiental”, disse indigenista e ambientalista Ivaneide Bandeira, sócia-fundadora da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, à Amazônia Real.

Após a aprovação, a Procuradoria-Geral de Justiça e a Força-Tarefa de Combate aos Desmatamentos e Queimadas expediram recomendação administrativa ao governador Marcos Rocha para que não sancionasse e vetasse o PLC 80/2020. “O projeto pode acarretar grande impacto ambiental, sem que tenha sido realizado estudo técnico com as garantias dos princípios da publicidade, da informação e da participação popular, para que atestem o interesse público, social ou ambiental da referida medida”, advertiu o Ministério Público. Rocha, entretanto, sancionou a nova lei na quinta-feira (20/05).

Na ADI, o MP aponta a inconstitucionalidade da norma nos artigos 1º (caput e parágrafos 1º e 2º; 2º (caput, e parágrafos 1º e 2º); 15 (caput e parágrafo único; e artigo 17 (caput e seus incisos) além dos Anexos I, II, V, VI, VII e VIII. No artigo 1º e nos anexos I e II, a lei reduz a área da Reserva Extrativista Jaci-Paraná, localizada nos municípios de Porto Velho, Buritis e Nova Mamoré, de 191 mil para 22.487,818 hectares; o artigo 2º (e Anexos V a VIII) reduz a área do Parque Estadual de Guajará-Mirim, de 216 mil para 166.034,71 hectares. A norma também prevê a possibilidade de regularização ambiental da propriedade ou posse de imóveis rurais nas áreas desafetadas da Reserva Extrativista Jaci-Paraná e do Parque Estadual de Guajará-Mirim (artigo 15).

O MP argumenta haver inconstitucionalidade material na lei. “A Constituição Federal assegura no artigo 225, caput, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, afirma o procurador-geral de Justiça de Rondônia na ação.

Ao pedir a medida cautelar, Ivanildo de Oliveira aponta a ameaça iminente às vidas dos povos indígenas e das populações tradicionais. “A “desafetação dessas unidades impacta diretamente as Terras Indígenas Uru-eu-wau-wau, Karipuna, Igarapé Lage, Igarapé Ribeirão, Karitina e os povos que estão em isolamento voluntário na região que envolve as áreas protegidas, ameaçando a integridade física, cultural e territorial podendo levar a iminência de um genocídio das culturas milenares”, enfatiza o procurador-geral, solicitando a suspensão dos artigos que considera inconstitucional até o julgamento da ADI.

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