Desde o começo do verão no Hemisfério Norte, há um mês, nove países já alcançaram esta marca que ameaça saúde, ecossistemas e economia
Por Oscar Valporto, compartilhado de Projeto Colabora
Turistas se refrescam em fonte em frente ao Panteão: temperatura no centro de Roma alcançou recorde de 42.5ºC durante recente onda de calor (Foto: Riccardo De Luca / Agência Anadolu /AFP – 17/07/2023)
Na terça-feira (18/07), a temperatura chegou a 50,5º graus Celsius em Al-Ahsa, província no leste da Árabia Saudita. Foi o nono país a encarar temperaturas acima de 50 graus em 2023 – o clube do calor escaldante inclui também Emirados Árabes, China, Estados Unidos, México, Kuwait, Oman, Irã e Iraque. “Temos que intensificar os esforços para a sociedade se adaptar ao que infelizmente está se tornando o novo normal”, alertou Petteri Taalas, secretário-geral da Organização Meteorológica Mundial (OMM), agência da ONU que vem divulgando comunicados diários sobre as altas recordes de temperatura desde o começo da semana.
O mundo chega a este final de julho com ondas de calor simultâneas em partes da Ásia, inclusive o Oriente Médio, na América do Norte, na Europa mediterrânea e no norte da África. “O clima extremo – uma ocorrência cada vez mais frequente em nosso clima em aquecimento – está tendo um grande impacto na saúde humana, ecossistemas, economias, agricultura, energia e abastecimento de água. Isso destaca a crescente urgência de reduzir as emissões de gases de efeito estufa o mais rápido e profundamente possível”, destacou o secretário-geral da OMM, lembrando que os eventos climáticos extremos aumentaram seis vezes desde a década de 1980.
Em todo o mundo, o calor mais intenso e extremo é inevitável – é imperativo se preparar e se adaptar, pois as cidades, casas e locais de trabalho não são construídos para suportar altas temperaturas prolongadas – e as pessoas vulneráveis não estão suficientemente conscientes da gravidade do risco que o calor representa para sua saúde e seu bem-estar
John Nairn
Meteorologista e consultor sênior de calor extremo da OMM
Recordes de calor estão sendo quebrados em toda parte. A China registrou no domingo (16/7) um novo recorde de calor: 52,2 em Sanbao, 1,5ºC acima da maior marca até então. Outras cinco estações no norte e noroeste do país registraram temperaturas acima de 50 graus. Em Beijing, as máximas vêm seguidamente ficando acima de 40 graus.
Do outro lado do globo, o Vale da Morte – área desértica de nome sugestivo, ao leste do estado da Califórnia e considerado o lugar mais quente do mundo – também alcançou temperaturas acima de 50 graus no mesmo domingo: 53.9ºC em Saratoga Spring, 53.6ºC em Badwater, e 53.2ºC em Furnace Creek, onde teria sido registrado a temperatura mais alta do mundo: 56,6ºC, em julho de 1913. Em Phoenix, no Arizona, estado na fronteira com o México, os termômetros marcaram acima de 43 graus pelo 20º dia consecutivo, nesta quarta-feira (19/7): um fenômeno climático inédito na história da cidade. A máxima de calor foi de 47,7ºC na terça (18/7); na quarta, alcançou 46,2ºC.
No México, onde mais de 100 pessoas já morreram vítimas do calor, as temperaturas voltaram a passar de 45ºC esta semana, depois de chegar a 50 graus na semana passada. “Em todo o mundo, o calor mais intenso e extremo é inevitável – é imperativo se preparar e se adaptar, pois as cidades, casas e locais de trabalho não são construídos para suportar altas temperaturas prolongadas – e as pessoas vulneráveis não estão suficientemente conscientes da gravidade do risco que o calor representa para sua saúde e seu bem-estar”, afirmou o meteorologista John Nairn, consultor sênior de calor extremo da OMM.
A Europa enfrenta esta semana a segunda onda de calor consecutiva – os europeus batizaram a primeira de Cérbero – na mitologia grega e na obra O Inferno, de Dante, um monstruoso cão de três cabeças que guardava a entrada do reino subterrâneo dos mortos; os italianos estão chamando a desta semana de Coronte – o também mitológico barqueiro que transporta as almas para outro mundo. Na Itália, o calor chegou a 42,9º no centro de Roma, recorde no centro da capital italiana na terça (18/7). Na ilha da Sardenha, onde em 2021 foi registrado o recorde de calor da Europa (48,8º), a temperatura chegou a 45,7ºC, na segunda (17/7), estabelecendo o recorde de calor no continente em 2023, que seria batido dois dias depois (quarta, 19) quando os termômetros marcaram 46,7ºC.
Na França, mais de uma dúzia de cidades já registraram recordes de temperaturas máximas desde o começo da semana. Na quarta (19), foi a vez de Cannes, a capital europeia do cinema, onde os termômetros marcaram 39,2ºC pela primeira vez na história. A segunda-feira (17) foi dia mais quente do ano na Espanha, onde a Agencia Estatal de Meteorología (Aemet) registrou 47ºC na província de Albacete (0.7, abaixo do recorde nacional, alcançado em agosto de 2021). Na terça, a Catalunha bateu seu recorde histórico de calor, com a máxima de 45 graus. “As temperaturas excepcionalmente altas nas regiões subtropicais constituem a principal origem meteorológica da onda de calor estendida sobre o Mediterrâneo. A assinatura do El Niño em andamento e as mudanças climáticas na extensão deste evento precisam de mais dados e análises”, disse Omar Baddour, chefe de monitoramento climático da OMM.
Na Espanha e também na Grécia, onde foram registrados recordes de calor para julho em várias cidades, incêndios florestais se espalham e ameaçam vilas no interior. Do outro lado do Atlântico, o Canadá ainda enfrenta 900 focos de incêndio. Do outro lado do Mediterrâneo, os termômetros já estiveram perto dos 50 graus na Tunísia (48,9ºC) e no Marrocos (49,1º). Na região, os meteorologistas acreditam que a onda de calor dure, pelo menos, mais uma semana.
O climatologista Maximilian Herrera, que monitora o calor extremo pelo mundo, alerta que os 50 graus do novo normal ainda podem se repetir em regiões da Ásia – o Paquistão, onde a temperatura já quebrou esta marca em anos anteriores, ainda não chegou lá em 2023 – e também do Oriente Médio.