Compartilhado de RED
De JORGE ALBERTO BENITZ*
Como sou faísca atrasada demorei para descobrir porque não gosto do “modus operandi” de gente de esquerda como Breno Altman, embora o respeite e o considere um companheiro de trincheira de valor em lutas por boas causas no geral, que, no particular, justifica a barbárie do Hamas ao dizer que “A condenada empreitada do Hamas foi uma reação a décadas de bloqueio e isolamentos dos territórios ilegalmente ocupados, ao assassinato de milhares e milhares de civis, ao encarceramento em massa de palestinos, a uma segregação violenta e humilhante”. O termo “condenada” atenua ao demonstrar, timidamente, que discorda dos métodos utilizados. No entanto, o que vem após, com maior ênfase, sanciona e legitima as ações do Hamas e não diz nenhuma palavra em defesa da brutalidade deste que matou não colonos invasores fundamentalistas invasores, mas indefesos moradores de Kibutz, muitos, inclusive, pacifistas e críticos da extrema direita representada pelo governo de Netanyahu.
Aprendi lendo Theodor Adorno que existem coniventes com a barbárie dos dois lados. A insensibilidade com a dor do outro considerado inimigo não difere entre os rivais, restando apenas o uso de uma dosimetria para mensurar o grau de culpabilidade maior ou menor de cada lado. São aqueles que passam pano para os malfeitos dos seus e usam lente de aumento para os malfeitos do inimigo. Este tipo de gente não é afetado quando os seus cometem atrocidades. Elas entram na cota de vinganças legítimas, autodefesa. Companheiros do campo de esquerda, que partilham o mesmo pensamento, usam a metáfora, um velho clichê, para justificar os crimes dos seus “Não se faz omelete sem quebrar os ovos”.
Como diz Theodor Adorno em Mínima Moralia, Aforisma 67, com outras e melhores palavras, refletindo sobre a justificativa da barbárie do nazismo que, penso, serve para demonstrar como funciona a mente tosca e cruel da extrema direita e dos cidadãos que mesmo não sendo de extrema direita concordam e atuam, como se viu no caso alemão e aqui com os bolsonaristas, em consonância com este viés fundamentalista e primitivo “Parece que na cabeça dos nazistas existe a crença de um sistema de crédito que permite, como retribuição aos males reais ou imaginários sofridos ou por sofrer, cometerem o horror que cometeram”.
O caso do Hamas é exemplar. O sofrimento impingido ao povo palestino por Israel, justifica, qualquer ato, por mais bárbaro que seja, afinal eles têm credito para retribuir os males sofridos ou por sofrer. E assim caímos na velha história da narrativa que é um discurso de poder, descomprometido totalmente com a verdade. Palavra tão criticada, com justiça, quando os bolsonaristas faziam o uso dela e agora parece que deu uma amnesia no pessoal de esquerda que faz uso dela. Ah!Mas (Ops!) o governo de Netanyahu é de extrema direita e não merece nenhum crédito. Verdade, eles também usam do mesmo expediente para cometer atrocidades e não devem ser apoiados por ninguém comprometido com causas civilizadas e democráticas. Só não se justifica os malfeitos, os atos criminosos, contra seus inimigos. Ambos estão no mesmo lado. Do lado da barbárie.
Não se trata de questionamento da causa palestina, sua busca legítima de um Estado independente. Qualquer um do campo progressista e democrático reconhece e apoia a causa palestina. Como está na matéria do The Conversation na revista Carta Capital, “Gaza é a maior prisão aberta do mundo”.
Como disse um amigo de esquerda, “Na cabeça deste tipo de companheiro, uma causa maior justifica tudo. Até a barbárie contra os que pensam diferente”. E não estou conjecturando em cima de hipóteses absurdas, irreais. Isso já aconteceu, por exemplo, sob Stalin na União Soviética e está acontecendo agora na Nicarágua.
*Engenheiro, escritor e poeta.
Imagem em Pixabay.