Não cuspir no prato em que está comendo

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Por Washington Luiz de Araújo, jornalista

Nasci em Pernambuco em 1958 e vim para São Paulo no primeiro ano de idade.




Meu saudoso pai e minha mãe vieram do sertão pernambucano. Em São Paulo se conheceram, se casaram e tiveram o primeiro filho. Depois voltaram a Pernambuco, onde eu nasci. Um ano depois voltaram para São Paulo, onde trouxeram ao mundo mais um garoto e duas meninas.

Meu pai, bem como a maioria dos seus irmãos da chamada primeira família, contraiu mal de Chagas quando criança.

Ele teve 30 irmãos que, como se dizia no nordeste, “vingaram”. Foram 17 irmãos da mãe do meu pai e 13 de sua madrasta.

Já minha mãe teve 12 irmãos, sendo que meu avô materno se casou igualmente duas vezes.

Tanta as famílias paterna e materna não passaram por tantas  privações quanto a maioria dos nordestinos do século 20 e anteriores. Compostas por  ótimas pessoas, honestos e solidários.

Estou com 56 anos. Só fui conhecer minha terra natal aos 21. Nunca mais deixei de voltar para ver meus parentes e amigos.

Mas de 2003 para cá é que percebi a melhora de vida das pessoas, de minha família e amigos.

Meu pai, uma pessoa honesta, de caráter forte, que estudou até o chamado na época segundo ano primário, sempre foi influenciado politicamente pelo que ouvia no rádio e via na televisão.  Mas com a chegada do governo Lula passou a rever seu pensamento.

Morreu em 2012, aos 83 anos, vendo e percebendo um mundo melhor para sua família, parentes e amigos, tendo Lula como uma ídolo.

Minha vigorosa e doce mãe, aos 75 anos, vota em Dilma e reconhece o quanto sua vida e do povo brasileiro melhorou.

Com toda esta trajetória, me recuso em pensar que as pessoas que vivenciam e desfrutam desta mudança para melhor, onde os pobres conquistaram a dignidade negada por  500 anos, queiram voltar ao comando daqueles que os escravizaram.

Falam mal dos nordestinos, como se estes não merecessem viver bem.  Como se as condições climáticas e o desprezo com que os políticos os trataram até recentemente fosse um mal congênito.

São preconceituosos contra os nordestinos que vivem em todo o Brasil, mas que só agora, nos últimos 12 anos, sentiram que a vida pode melhorar, que podem colocar seus filhos numa faculdade e, muitos deles, numa universidade pública, obtiveram luz em suas casas, tiveram o salário mínimo valorizado e suas aposentadorias reconhecidas.

Aqueles que não moram no Nordeste, hoje vão lá, na maioria das vezes de avião, e veem e ouvem sobre o quanto a vida de seus conterrâneos melhorou.

Continuamos, nós nordestinos, a sermos discriminados, alvos de preconceitos rasteiros, mas os últimos 12 anos, estes sim da alternância dos cinco séculos de opressão, têm que continuar.

O ex-presidente FHC afirmou, num gesto de desdém,  que os votos do PT são dos pobres, ignorantes, nordestinos. Aprendi desde criança a saborear a sabedoria nordestina, que independe de escolaridade.

Me delicio até hoje ouvindo Chico em “Paratodos”, onde nosso craque da música dá a lição que na mistura de naturalidades é que vem a genialidade:

O meu pai era paulista
Meu avô, pernambucano
O meu bisavô, mineiro
Meu tataravô, baiano
Meu maestro soberano
Foi Antonio Brasileiro

(…)

Para um coração mesquinho
Contra a solidão agreste
Luiz Gonzaga é tiro certo
Pixinguinha é inconteste
Tome Noel, Cartola, Orestes
Caetano e João Gilberto

Da mesma forma que Chico, aprendi a admirar Luiz Gonzaga, Ariano Suassuna, José Lins do Rego, Capiba, Caetano, Gil, Tom Zé, Miguel Arraes, Gregório Bezerra, Brennand, Patativa, Alceu, Mestre Vitalino, Graciliano, Celso Furtado,  e tantos outros que só alegria me deram.

Mas aprendi também ao ouvir a sabedoria sem ensinamento escolar dos meus avós, tios e de vizinhos destes. E, cá pra nós, não conheço um texto do sociólogo FHC. Só desaforos.

Outro dia disse a um primo querido que votar contra estes 12 anos é cuspir no prato que se está comendo. Pois nunca o pobre foi tão priorizado como nesta década e pouco mais. Pernambuco, onde vive este primo, é a prova deste desenvolvimento surgido exclusivamente em razão do apoio do governo federal.

 Com raras exceções, vejo que a maioria dos nordestinos reconhece esta revolução em suas vidas e querem o melhor para si e, consequentemente, para todo mundo.

A maioria das pessoas pobres deste país vive em completa solidariedade.  Mas, infelizmente, não é o que acontece com uma boa parcela daqueles que usufruem de uma vida com maior conforto, sem privações.

Sei que muitos da classe média e dos mais endinheirados têm consciência social e percebem que um país civilizado é aquele que olha para todos os seus filhos, indiscriminadamente.  Estes também não cospem no prato em que estão comendo, pois estão juntos em busca de um mundo melhor.

Um dia um amigo disse que certas pessoas agem como aqueles que correm para entrar numa vagão lotado de metrô ou num ônibus apertado e quando conseguem maldizem os que entram depois deles.

Estes berram agora contra os aeroportos lotados, contra as faixas de ônibus, contra as ciclovias, contra as filas dos supermercados, contra os filhos dos pobres nas universidades públicas.

E é contra este pensamento egoísta que devemos votar. E este pensamento e ação egoísta está do outro lado do que sabemos ser o melhor para todos, para todas as classes sociais.

Por isso, Dilma.

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