A tentativa de golpe rachou as forças armadas. É bom momento para um exame de consciência
p o r A N D R É B A R R O C A L
Carta Capital
Enquanto a Praça dos Três Poderes era tomada por fiéis de Jair Bolsonaro em 8 de janeiro de 2023, Gabriela Cid mandou, às 16h56, fotos do quebra-quebra ao marido. O tenente-coronel do Exército Mauro César Barbosa Cid havia chefiado os ajudantes de ordens do presidente, era um arquivo vivo dos segredos do capitão. Com as imagens, Gabriela enviou um comentário de Olavo de Carvalho, o guru da extrema-direita falecido dois anos antes. Em 2021, o astrólogo achava que, se não fossem enquadradas, “as Forças Armadas entrarão em cena para esmagar a rebelião (popular)”. “Dessa vez eu discordo”, respondeu Cid à esposa. “Se o EB (Exército Brasileiro) sair dos quarteis… é para aderir.”
Bolsonaro estava fora do Brasil havia dez dias, quando Cid discordou da mulher. Em maio de 2023, a Polícia Federal vasculhou a casa do tenente-coronel na Operação Venire e encontrou em um laptop um documento de 2021 com três alternativas para o então presidente, caso ele peitasse o Judiciário e temesse a prisão. Uma era deixar o Brasil. Em 30 de dezembro de 2022, penúltimo dia de mandato, o capitão viajou aos Estados Unidos. Levou Cid, um cartão fajuto de vacina anti-Covid e joias recebidas de presente como mandatário. O cartão e as joias seriam alvo de dois inquéritos da PF, ambos finalizados em 2024. Em 21 de novembro passado, a polícia encerrou um terceiro, relacionado ao quebra-quebra. “Bolsonaro, após não conseguir o apoio das Forças Armadas para consumar a ruptura institucional, saiu do País para evitar uma possível prisão e aguardar o desfecho dos atos golpistas do dia 08 de janeiro de 2023”, descreve o relatório final.