O Bem Blogado se aboleta, novamente, no Uber do arquiteto Sérgio AR Pereira, autor do livro “Arquiteto & UBERnista”. Desta vez, conversa com um jovem médico sobre as mazelas de nossa sociedade. Coisas que, infelizmente, talvez não tenham mais cura.
Por Sérgio AR Pereira, arquiteto e urbanista que foi UBERnista
Transportei um jovem médico do interior do Estado que veio fazer residência médica em um hospital do Tatuapé (bairro da Capital paulista). Era para lá que estávamos indo. Pelos caminhos que levam do Centro para a Zona Leste se avista muita pobreza e nesse dia, quase noite, havia várias crianças vendendo objetos nas ruas, pedindo dinheiro para comer e várias outras mazelas desse tipo que nos sensibilizam e entristecem. Ou revoltam a quem acredita que aquelas pessoas têm o que merecem. Absurdos que ouvimos constantemente.
Pois esse moço, médico, vindo do interior de São Paulo, uma região bastante conservadora, fez um comentário que muito me surpreendeu: “Eu vejo essas coisas e desacredito cada vez mais que isto seja uma questão de mérito, como pensa grande parte de meus colegas médicos”.
Concordei com ele e disse que aquela situação havia se agravado nos últimos dois anos e que o fato era visível. Diariamente aumentava o número de moradores de rua e de pedintes ou vendedores ambulantes nos semáforos ou em avenidas congestionadas, como a em que estávamos.
Citou Hegel no tocante ao egoísmo das classes dominantes, que realmente se sentem ameaçadas quando um governo cuida de migrantes, com dinheiro pago por seus impostos. Depois vi que este comentário se referia a uma excelente entrevista de um cientista político francês de origem japonesa a um jornal brasileiro. Coisas da globalização.
Autodenominou-se centrista, porém compreende que não havia provas na condenação do ex-presidente preso em Curitiba e considera o atual presidente despreparado para o cargo.
Concordou comigo que essas teorias pregadas pelos seguidores do ultraliberalismo, como o Estado mínimo, talvez funcionem em um país como o Japão, mas não aqui ou no mundo mantido pobre, onde falta tudo o que é essencial para a população e o Estado tem ainda um grande papel a cumprir.
Falei de uma visão que adquiri como arquiteto de que a indústria perdeu a hegemonia da reprodução do capital e que hoje há uma grande presença dele na vida urbana.
O valor da terra e sua exploração milimétrica nos grandes centros ocupam parte desse espaço antes exclusivo da indústria e é onde se espelham as contradições da moderna luta de classes, expressadas pela favelização dos centros e da gentrificação em áreas nobres da cidade.
Exemplifiquei tal fato citando a liderança dos trabalhadores da indústria surgida na esteira dos movimentos sindicais no final dos anos 1970, e a atual liderança dos trabalhadores sem-teto, surgida na luta dos movimentos por moradia, nas grandes cidades. Ambas lideranças do campo da esquerda democrática, cada qual refletindo um momento da reprodução agressiva do capital e o seu poder de criar mazelas sociais.
Perguntei-lhe sobre o extinto programa do governo petista, o “Mais Médicos”, e ele me disse que ainda não era formado, à épo ca, mas que apoiara a iniciativa. Sabia que médicos elitistas brasileiros jamais se sujeitariam a condições de trabalho ou localizações muito distantes de confortos urbanos.
Contei-lhe sobre a minha experiência em Cuba, o pouco que conheci da medicina daquele país, e que alguns hospitais que passei em frente tinham um aspecto mal conservado por fora. Porém conheci e conversei com três estudantes de medicina brasileiros que estudavam em Havana e se sentiam no melhor dos mundos quanto aos conhecimentos médicos. Informaram-me que, por dentro dos hospitais, a realidade era outra.
Meu interlocutor ficou impressionado, afirmando que já ouvira relatos parecidos, e gostaria de conhecer essa realidade de perto um dia. Mas criticou o comunismo, uma vez centrista, e argui que nós, em nossas vivências de vários “paradogmas”, nunca havíamos experimentado verdadeiramente o comunismo como sistema político. E que a Venezuela estava muito distante disso.
Senti que ele concordou, mas como todo jovem precisava se convencer disso para depois acreditar, o que acho “perfeitamente perfeito”, uma vez que já fui mais novo também.
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