Por Ulisses Capozzoli, jornalista, no Facebook, sobre entrevista do filósofo Noam Chomsky ao blog Tutaméia, que esteve no Brasil recentemente, inclusive visitando o preso político Luiz Inácio Lula da Silva.
Você não o verá muito tempo por aqui. Noam Chomsky, 89 anos, filósofo, ativista, linguista é um dos maiores pensadores da época conturbada em que vivemos. Um homem com o perfil dele não é um pregador interessado em prestígio pessoal ou outras pequenas recompensas que podem parecer um tesouro a carreiristas sem escrúpulo, de dimensão incomparável à dele.
Homens com o perfil de Noam Chomsky estão na base da civilização e do bem-estar de que desfrutamos, sem que tenhamos noção do preço pago em termos de elaboração intelectual ao longo da história da humanidade. Sócrates, foi um desses homens. Sócrates, obrigado a se matar por, supostamente, oferecer um risco à época em que vivia. Sócrates, não por acaso, um divisor de épocas, na filosofia. Há os pré-socráticos e os pós-socráticos.
Qual a diferença entre uma época e outra? A valorização do homem, mais especificamente, da mente humana enquanto instrumento de conhecimento e exploração do mundo. Um processo que, em outra escala, aconteceu também no Renascimento, a partir do século 16, quando o mundo literalmente começou a iluminar-se com as luzes da razão. Depois de ter permanecido por quase 20 séculos (vinte séculos) sob a noite escura e cheia de horrores da Idade Média.
Noam Chomsky numa breve passagem pelo Brasil, entre outras realizações, concedeu uma rica e fascinante entrevista a TUTAMEIA espaço virtual de reflexão e difusão de cultura sustentado pelos jornalistas Rodolfo Lucena e Eleonora Lucena. Nesse encontro, que equivale a um curso de meses sobre a história do século 20 para cá, ele fala do Brasil com afeto, admiração e enorme preocupação, analisando o que vê e sente e isso inclui as eleições com primeiro turno em duas semanas.
Se você estiver interessado em compreender minimamente o que ocorre no mundo e, por consequência no Brasil, leia esse depoimento do filósofo que viaja pela história e os processos sociais com a liberdade, beleza e refinamento de um homem que caminha por um jardim.
Nesta entrevista a TUTAMEIA, Chomsky explica com todas as letras que as chamadas políticas neoliberais, essas que estão sendo empurradas garganta abaixo da população brasileira não são parte das leis da Natureza. Elas são ações pensadas para produzir o efeito que devem produzir e o resultado disso, ainda que muitos possam se surpreender, é a precarização da sociedade em benefício de um padrão de acumulação de capital: em resumo, lucros a qualquer custo.
Uma cena que ilustra este caso. Em seguida à crise de 2008 que começou com bancos americanos e se espalhou como um tsunami pelo mundo afora, pessoas que ficaram impossibilitadas de pagar as prestações de suas moradias na Espanha foram colocadas na rua. Ao relento, sob as árvores, as pontes, o que fosse.
Na Grécia, um homem, farmacêutico, suicidou-se e confessou que era a opção que tinha, antes de procurar comida no lixo. As pessoas não tiveram garantia alguma. A garantia esteve toda concentrada na manutenção do lucros dos bancos. Os bancos não podem quebrar, bradam os economistas. Mas o conjunto da sociedade pode.
E é isso que está ocorrendo no mundo e particularmente no Brasil neste momento. Uma precarização da vida produzida pelo neoliberalismo, uma prática profundamente desumanizadora, interessada em bens materiais a qualquer custo e com todas as justificativas pretensamente razoáveis.
Precarizadas, em situação de rua, massas humanas são vítimas e bodes expiatórios de uma sociedade que perde, a cada dia, o sentido da solidariedade e compaixão, deixando em seu rastro a pura barbárie. Como esse processo é complexo e fora da compreensão de boa parte da sociedade, a reação a essa destruição chega embalada em lógica fácil.
Formulações que parecem reais, mas são apenas um engodo. “Salvadores da pátria”, gente violenta com fala generalizada propondo uma restauração do mundo, daquilo que foi, quando são, eles mesmos, os agentes dessa destruição do mundo como era. De um ponto de vista histórico, evidentemente, Chomsky não é o único a falar disso.
Outros historiadores, filósofos e intelectuais preocupados com a condição humana também referem que esse processo começou por volta dos anos 1970, com os governos conservadores de Margareth Thatcher, no Reino Unido, e o ator de filmes B eleito presidente, o americano Ronald Reagan, que pretendeu materializar um projeto militar conhecido como “guerra nas estrelas”.
E o que aconteceu foi um corte completo em benefícios sociais que amparavam as parcelas mais desfavorecidas da população com transferência e apropriação desses recursos pelo mercado. Tudo pago, tudo negociado, tudo vendido. Tudo monetarizado. A vida humana sem nenhum valor.
No Brasil, depois de várias ameaças que não chegaram a se materializar, ao contrário, o país desfrutou de emprego, salário e bem-estar social enquanto países como Espanha e Grécia, entre outros, já afundavam na miséria e recessão. O projeto de mercantilização da vida chegou aqui com o golpe de 2016 e a substituição de um governo eleito nas urnas por um simulacro formado por algo como uma quadrilha de malfeitores.
Essa gente disposta a fazer o jogo do mercado numa relação impiedosa, desumana e profundamente destrutiva. As forças reacionárias, com lógica fácil capaz de ser absorvida pelas parcelas mais degradadas da sociedade, tem um candidato nas eleições que se aproximam a cada dia.
Um candidato apoiado nas armas, na linguagem rude, bruta, sumária, desrespeitosa à mulher de quem cada um de nós nasceu. Apontando uma direção odiosa como solução para todos os males. Não é a primeira vez que isso acontece na história das nações.
A última vez em que ocorreu teve como cenário países como Alemanha e Itália e mesmo as pessoas mais simples, carentes de uma cultura mediana, tem noção de como tudo terminou. A belíssima, lúcida e libertadora entrevista de Noam Chomsky é um alerta do que está por vir. Um brado para tentar evitar um massacre em que o sangue deve ensopar a terra.
Fiz uma postagem em minha página aqui no Face que interessados podem acessar para ouvir, da boca de Noam Chomsky, a descrição do que está acontecendo. Sem que boa parte das pessoas, as vítimas, possa compreender.
Veja aqui a entrevista de Noam Chomsky para o Tutameia.