Por Claudio Lovato Filho, jornalista e escritor, no Facebook
“A convicção de que a escrita é apenas a possibilidade de construir outros a partir do que você foi e é servira para que você tentasse distanciar-se de si mesmo, ver-se a partir de uma perspectiva reveladora, agradável e dolorosa ao mesmo tempo. Porque sua capacidade imaginativa duvidosa é determinada por uma experiência vital, livresca, reduzida e, sobretudo, recorrentemente própria e, portanto, contaminada.
Por isso, ao avançar, amontoar páginas, ler, copiar dados, você percebia esse distanciamento esclarecedor, porque ia se transformando em outro, libertando-se de si mesmo e de alguma maneira se completando nesses outros. Ganhando liberdade.
Isso é escrever? Transformar-se em outro? Renunciar a si mesmo em favor do criado? Tentar recompor o que não tem possibilidade de restauração? Manipular o espetáculo torpe da vida vivida, sem desígnio prévio possível, e transformá-la numa criação mais benévola e lógica, de certo modo menos humana e por isso mesmo mais satisfatória? Brincar de ser livre? Até mesmo ser livre?”
Leonardo Padura, “A Transparência do Tempo” (Boitempo, 2018)