Em 2021, até 9 de dezembro, 1.636 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão, de acordo com a Comissão Pastoral da Terra
Por Oscar Valporto, compartilhado de Projeto Colabora
Trabalhadores em área de produção de carvão vegetal: 168 pessoas libertadas de condições de trabalho análogas à escravidão em 2021 (Foto: João Roberto Ripper)
O Brasil teve 1.636 pessoas foram resgatadas do trabalho escravo rural no período de 1º de janeiro a 9 de dezembro, de acordo com levantamento produzido pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e divulgado em dezembro. “Mesmo com dados parciais, atualizados até o dia 09 de dezembro, o número de resgatados da prática criminosa da escravidão contemporânea já é o maior desde 2013”, destaca o relatório da CPT. O número significa um aumento de 102% na comparação com todo o ano de 2020.
Dos 1.636 resgatados, 54 eram crianças e adolescentes. As regiões Sudeste e Centro-Oeste concentraram o maior número de menores de idades escravizados, 17 cada. Em novembro, dois menores de idades estavam no grupo de 21 trabalhadores em condições análogas a de escravos em carvoarias de dois municípios mineiros, que foi resgatado durante operação de combate ao trabalho escravo realizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), com apoio do Ministério Público Federal, da Defensoria Pública da União e da Polícia Rodoviária Federal.
Mas as operações com resgate de crianças ocorreram em outras regiões do país. Ainda em novembro de 2021, três adolescentes foram resgatadas de condições análogas às de escravo em uma casa de farinha em Marcolândia, no Piauí; em outubro, três adolescentes, com idades entre 14 e 16 anos, estavam entre os resgatados em condições análogas às de escravo uma fazenda de gado e extração de argila em Nova Ipixuna, no sudeste do Pará; em fevereiro do ano passado, duas famílias – com cinco crianças e dois adolescentes de 9 a 17 anos de idade -foram resgatadas de condições análogas ao trabalho escravo em uma plantação de fumo na Zona Rural de Venâncio Aires, no Rio Grande do Sul.
As regiões Sudeste e Centro-Oeste respondem, também, pelos maiores números de casos de trabalho escravo, de vítimas relatadas nas denúncias e de trabalhadores libertados em 2021. O Sudeste registrou 37% dos casos e 55% dos libertados, enquanto o Centro-Oeste ficou 22% dos casos e 24% dos libertados em 2021. No maior resgate de 2021, operação em fazenda da empresa Souza Paiol – em em Água Fria de Goiás, a 140 quilômetros de Brasília – encontrou 116 trabalhadores escravizados na colheita de palha para seus cigarros
De acordo com o levantamento da CPT, Minas Gerais foi o estado com o maior número de casos de trabalho escravo e de pessoas libertadas dessa prática no meio rural, registrando 49 dos 151 casos identificados e 731 dos 1.636 resgatados do trabalho escravo rural. Goiás registrou 15 casos e 291 liberados e o Pará 21 casos e 94 trabalhadores libertados. O relatório da CPT aponta, entretanto, que “o fato do estado mineiro liderar o ranking do trabalho escravo rural nos últimos sete anos, se deve, também, à destacada atuação das equipes de fiscalização do trabalho da região.
Pelos dados da CPT, a pecuária foi a atividade que, em 2021, mais utilizou mão de obra escrava no campo: 23% do total de casos, seguida das lavouras permanentes (19%), das lavouras temporárias (18%) e da produção de carvão vegetal (11%). Mas, nas lavouras temporárias, foi registrado o maior número de resgatados da escravidão: 600 pessoas, 37% do total no ano. Das lavouras permanentes (segunda colocada neste ranking), foram resgatadas 382 pessoas, 23% do total, seguida da produção de carvão vegetal, de onde foram resgatadas 158 pessoas (10%).
O relatório aponta ainda que quase um terço dos casos de trabalho escravo identificados no meio rural aconteceram na Amazônia Legal. Foram 45 casos, com 193 trabalhadores foram libertados na região. Em agosto, operação da Polícia Federal resgatou 20 trabalhadores que encontravam-se submetidos a condições degradantes de trabalho, análogas à escravidão, em garimpos ilegais no município de Cumaru do Norte, sul do Pará; em junho, em mais uma operação contra garimpos clandestinos, foram resgatados 22 pessoas em condições análogas ao trabalho escravo, em Rio Maria, no sudoeste paraense. O garimpo impulsiona o número de casos de escravidão rural na Amazônia.
A CPT lembra que, de acordo com o Sinait (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho), o déficit para o trabalho de fiscalização das condições de trabalho é de 1600 servidores. O quadro de auditores fiscais do trabalho enfrenta redução em 44% do seu efetivo normal em todo o país (estão preenchidos hoje apenas 2.039 dos 3.644 cargos criados em lei). “Apesar das reiteradas tentativas do governo federal em fragilizar ainda mais essa atuação, o empenho das equipes garantiu um número elevado de estabelecimentos fiscalizados em 2021”, destaca a comissão.
Número oficial também é o maior desde 2013
Nesta sexta-feira (28/01), Dia Nacional do Combate ao Trabalho Escravo, foi divulgado o número oficial do Ministério do Trabalho e Previdência: o Brasil encontrou 1.937 pessoas em situação de escravidão contemporânea em 2021, maior número desde os 2.808 trabalhadores de 2013. Trabalhadores em atividades rurais representaram 89% (1.727) dos libertados pelas operações.
De acordo com os números do ministério, dos 210 resgatados em atividades urbanas análogas à escravidão em 2021, 108 estavam na incorporação de empreendimentos imobiliários e construção civil. O serviço doméstico envolveu 27 vítimas – em 2020, haviam sido apenas três.
Com base na análise dos dados de 1.826 dos 1.937 resgatados, o Ministério do Trabalho e Previdência informou que é possível afirmar que 90% eram homens, 47% tinham nascido no Nordeste e 80% se autodeclararam negros, 17% brancos e 3% indígenas. Do total, 6% dos trabalhadores resgatados em 2021 eram analfabetos e 21% contavam até com o quinto ano do ensino fundamental incompleto.