O Exército, que deu guarida aos acampamentos golpistas, agora aparece como legalista na delação de Cid. É a história sendo reescrita
Por Luis Nassif, compartilhado de seu Blog
Vamos com menos entusiasmo na delação do coronel Cid. Como explica o jurista Lenio Streck:
- Calma: tem uma armadilha aí. A delação de CID é paradoxal: incrimina mas não incrimina Bozo. Tudo pode estar armado para que haja arquivamento contra Bozo, a partir da velha tese: apenas houve Cogitatio!!!! Peguem este post e colem na geladeira.
O que se tem de concreto da delação?
No relato de Maria Cristina Fernandes, do Valor Econômico, e nos demais, o almirante Almir Garnier – o único que, supostamente, apoiaria o golpe – é apresentado como um burocrata que se encantou com Bolsonaro. Em outra reportagem, é ironizado pelo comandante do Exército, general Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva, que pergunta: com que tropa ele apoiaria o golpe?
Segundo a reportagem, o único a enfrentar o presidente foi o comandante do Exército, general Freire Gomes. “Ele não apenas disse a Bolsonaro que o Exército não compactuava com um golpe como afirmou à queima-roupa: “Se o senhor for em frente com isso, serei obrigado a prendê-lo”.
A razão seria que os comandantes do Sul, Sudeste, Leste e Nordeste não apoiariam o golpe, e os americanos – civis e militares – também não.
Ficamos assim, então. O Exército apoiou em todos os momentos a concentração de pessoas no entorno dos quartéis. A própria segurança do Exército tratou de garantir os manifestantes, mesmo depois das badernas de dezembro e da tentativa de explosão de bombas em caminhão com combustível. Em uma das sessões da CPMI, o terrorista garantiu que a inteligência do Exército impedia a infiltração nos acampamentos. Quem eram os infiltrados? Ambulantes querendo vender coisas.
O comandante do Planalto, general Dutra, afrontou o Ministro da Justiça Flávio Dino na noite de 8 de janeiro, impedindo qualquer prisão nos acampamentos. Em vários lugares, parte dos manifestantes eram da família militar.
Mas a história começa a ser reescrita. Tinha-se um Exército legalista, uma Aeronáutica que não participou do golpe – apesar da militância digital vergonhosa do brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior, comandante da Aeronáutica -, um Exército que não montou nenhuma equipe para questionar as urnas eletrônicas.
Os militares dignos, Ministro da Defesa general Fernando Azevedo, comandante do Exército, general Edson Pujol; da Marinha, almirante Ilques Barbosa Junior; e da Aeronáutica, brigadeiro Antônio Carlos Moretti Bermudez, deixaram os cargos em março de 2022, por não compactuarem com o golpe. Ficaram esquecidos na história. Os novos heróis passam a ser os comandantes que estimularam os acampamentos em quartéis, que questionaram as urnas eletrônicas e que colocaram tanques fumegantes no desfile de 7 de Setembro como demonstração de força. Mas, graças ao grande jeitinho brasileiro de reinventar a história, saem como heróis,
E assim, de mentira em mentira, o país vai remendando uma democracia torta.