O Brasil e o reencontro com a alegria, por Luís Nassif

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Assistindo a alegria da Orquestra Juvenil da Bahia, voltou aquele sentimento irreprimível de paixão pelo Brasil. E, ao mesmo tempo, de tristeza

Por Luis Nassif, compartilhado de seu Blog




Certa vez, em uma viagem de jornalistas, uma repórter da Exame me contou a saga da família. Pais italianos, jovens ainda, na fase mais dura da Itália do pós-guerra, foram para o porto buscando espaço no primeiro navio que os levasse para longe da fome. Aí ouviram “Aquarela do Brasil”. Perguntaram de onde era a música. Do Brasil, responderam. Então é para lá que queremos ir, porque um país que faz uma música dessas só pode ser bom.

Assistindo, agora, a alegria contagiante da Orquestra Juvenil da Bahia, voltou aquele sentimento irreprimível de paixão pelo Brasil. E, ao mesmo tempo, de tristeza.

Como pode um país como o nosso, que produziu a alegria, a mistura de raças, de culturas, de músicas, ter caído nessa tristeza tão profunda? Participei do projeto a cara do Brasil, de Domenico di Masi. A primeira cara do Brasil eram as festas populares, as festas juninas no Nordeste, o carnaval baiano e carioca se nacionalizando, os festejos de Recife.

Anos atrás, o grande Mário Novello, do Centro Brasileiro de Pesquisas Fisicas, me propôs um desafio complicado: participar de uma mesa, com físicos, filósofos, e discorrer sobre a utopia brasileira. Isso em pleno período tenebroso, da conspiração do impeachment, do discurso de ódio dominando a mídia, da Lava Jato destruindo a economia e assassinando reputações.

Resolvi montar uma fábula.

Houve um momento em que todas as tribos hunas se juntaram para assaltar o orçamento. Houve uma guerra mundial em que bombas de nêutron varreram a população para casamatas, deixando na superfície pó e destruição sobre a terra. Restaram só redes sociais povoadas de fantasmas.

Passado o bombardeio, um cidadão botou a cabaeça para fora e se indagou: onde estou? Não tinha a menor ideia. Até que encontrou um toca disco empoeirado e um disco de 78 rotações. Resolveu ouvir, e era “Que nem Jiló”, de Luiz Gonzaga. Imediatamente colocou a música na rede. Lá em Recife, alguém ouviu e resolveu colocar o Frevo no 2 na rede. Em Salvador, outro cidadão colocou um samba do Pelourinho. De João Pessoa vieram sons de bandolim e de Belém os sons da selva.

De repente, como puxados por um coral mágico, todos caminharam com seus instrumentos para o Rio de Janeiro. Lá se juntaram aos sambistas e chorões e partiram para Brasilia. Os sons foram varrendo a sujeira do ar, os Bolsonaros, os Arthur Lira, os Alcolumbres, o Ministro do STF que impede o julgamento da Lava Jato, a bancada da bala, o cartel da Faria Lima, o Centrão, os filisteus.

E, sob as bênçãos da música brasileira, os meninos voltaram a sorrir, a cantar, a explodir o coração de paixão pelo Brasil, os moreninhos, os pretinhos, os branquinhos reencontraram o pai que os abandonou durante tatantos séculos.

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