O brasileiro é burro, finge, ou não está nem aí?

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Por João Sucata, Jornal GGN – 

De vez em quando vejo opiniões negativas sobre a inteligência do brasileiro das classes de renda mais baixa. Seriam toscos, menos aculturados, menos inteligentes, propensos a formar em torcidas organizadas e violentas, mão de obra imprestável etc.




O futebol, mais que uma paixão, desmente isso. Brasileiros desses estratos sociais, de menor renda, moradores de periferia, favelas, habitações coletivas, quando menos se espera, discutem sobre técnicas e jogadores de futebol como se comentaristas especializados fossem.

É comum encontrar pelas ruas, nos botecos, nos intervalos de trabalho, os que discutem com sapiência a escalação da seleção brasileira, quem deve ser o técnico, se tal jogador deve ou não ser escalado, levando-se em conta sua técnica, força física, idade, relacionamento com demais que jogarão próximos, táticas que o time deve usar, que jogador deve marcar o craque do adversário, táticas e características deste, placar que deverá ser perseguido (defender-se ou atacar?) e etc.

Esquemas complexos, reminiscências históricas, exemplos gratificantes ou decepcionantes, influência do campo e da torcida, até onde o jogo deve ser de conjunto ou facilitar a individualidade dos jogadores, importância da raça e outras complexidades são analisadas e debatidas com naturalidade. Todo brasileiro é um técnico em potencial, sabe escalar sua seleção, os onze nomes e até os onze que devem ficar na reserva.

Tudo isso pode demonstrar que quando o trabalhador não se aplica, não evolui, não desenvolve a contento seu trabalho, falta, é desidioso, provoca sua demissão, não é por negligência, preguiça inata, incapacidade, inapetência congênita etc, mas simplesmente por desinteresse, por não se identificar, por achá-lo alienado e alienante, por não se sentir recompensado. E quando criticado, finge que não ouve, não dá a mínima importância, pois sabe que não saberá explicar a alguém da elite, o patrão, o que se passa. A diferença entre os lugares sociais ocupados, a ideologia decorrente, formam uma barreira que inviabilizam o entendimento.

O futebol pode nos ensinar mais sobre o povo do que muitas teses de mestrado feitas no ambiente de trabalho, sobre “o despreparo da mão de obra brasileira” ou artigos da “grande mídia”. Não se pode dizer sequer que o povo é a imagem de sua elite. Seria uma injustiça.

João Sucata

Foto da capa de Fabio Soares

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