Aquela Seleção tinha alma. Tinha caráter. Decência. Objetivos claros. Tanto que ninguém fugiu às entrevistas após o jogo. E no dia seguinte, quando poucos jornalistas se dirigiram à concentração brasileira, ainda foram recebidos pela comissão técnica e pelos jogadores. Não houve fuga de perdedores em Barcelona. Houve muita conversa. Sem revolta
Por Roberto Salim, compartilhado de Ultrajano
Podia começar falando de injustiça.
De derrota.
De falta de sorte.
Da defesa do Zoff.
Ou sei lá mais o quê.
Mas neste 5 de julho, quando a data sinaliza 40 anos do jogo Itália 3 x 2 Brasil, vou falar de outra coisa sobre o que ocorreu no Estádio Sarriá, em Barcelona: aquela foi uma derrota de uma Seleção de caráter.
O time de Telê Santana jogava futebol.
Até a medula.
Timaço.
Sem soberba. Não perdeu porque tinha prepotência.
Não perdeu porque não quis jogar pelo empate.
Foi eliminado da Copa de 82 porque a Itália estava mesmo iluminada naquela tarde.
E o Paolo Rossi então!
Pra falar a verdade, o Brasil tinha um time de sonhos: quem podia dispor no planeta futebol de Falcão, Cerezo, Zico, Sócrates?
G ente! Eu tive o privilégio de acompanhar esse time.
Era repórter da Folha de S.Paulo.
E cobri o Brasil naquela Copa, desde o período de adaptação em Portugal. Estava com os companheiros Aroldo Chiorino, Jorge Araújo e Luiz Fernando.
Uma aventura inesquecível.
E quando a Itália fez 1 a 0, falei a meus amigos: “Calma, que vamos virar”.
Sócrates empatou e falei: “Não disse?! Vai ser de goleada!”
Não foi o que se viu no segundo tempo.
A Itália se impôs.
O empate poderia ter vindo na cabeçada de Oscar no finalzinho.
Seria 3 a 3, e isso tudo que escrevo não teria sentido.
Porém, o sentido deste texto não está no resultado, na eliminação, na tragédia futebolística.
O sentido deste texto e da vida está no caráter.
Na alma.
Aquela Seleção tinha alma.
Tinha caráter.
Decência.
Objetivos claros.
Tanto que ninguém fugiu às entrevistas após o jogo.
E no dia seguinte, quando poucos jornalistas se dirigiram à concentração brasileira, ainda foram recebidos pela comissão técnica e pelos jogadores.
Não houve fuga de perdedores em Barcelona.
Houve muita conversa.
Sem revolta.
E lembro com orgulho a entrevista com o inigualável Sócrates falando que já estava repensando a ideia de que aquela seria sua única Copa do Mundo.
Sob o título “As confissões do frustrado capitão”, vinha a conversa toda com o doutor Sócrates.
“Ao contrário do que havia anunciado, Sócrates já admite empenhar-se muito para disputar o Mundial de 86.”
E assim foi.
Pela arte futebolística e pelo caráter, aquela turma de Telê Santana fez história.