O convite singular de Paulo Betti

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Por Wagner Correa de Araújo, Outras Palavras – 

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Autobiografia Autorizada está em cartaz no Rio de Janeiro, na Casa da Gávea.
Sexta e sábado, 21h; domingo, 20h.
Até 13 de dezembro.
Duração: 110 minutos.
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Existiria um conflito conceitual entre o que se poderia chamar de teatro autobiográfico e o significado do personagem teatral ?

Quando o ator-autor expõe a si mesmo como auto-performance-biográfica não desapareceria o sentido convencional do intérprete/personagem?

Este viés realista e documental não teria, por si só, um caráter confessional quase às portas de um depoimento, seja literário ou jornalístico, ao vivo?

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Ao encenar, no Rio, “Autobiografia autorizada”, e assumir simultaneamente papíes de autor, ator, codiretor, ele instiga cada espectador a refletir sobre seu próprio eu

Estas considerações aparecem em torno da proposta teatral de Paulo Betti, com seu espetáculo solo Autobiografia autorizada que, usando de irônico humor, ainda provoca, na titulação da peça, a polêmica questão da censura às narrativas biográficas.

Contando com uma verdadeira pintura cênica na poética concepção de Mana Bernardes, sugerida nas velhas folhas de papel amassado com projeções filigranadas de Marlus Araujo.De qualquer maneira, enquanto o texto e atuação são da lavra de Betti, a direção é dividida a quatro mãos, com Rafael Ponzi, num convicto e tocante espetáculo de temática existencial.

E, acentuado, ainda, pelas sutilezas ambientais da iluminação de Dani Sanchez e Luís Paulo Nenem. Com destaque pela adequação de matizes pastéis do figurino (Leticia Ponzi) e da envolvência nostálgica das incidências musicais (Pedro Bernardes).

Este mergulho nas lembranças da infância e adolescência pobre e difícil de/por Paulo Betti é capaz, no tempo da memória, de atributos expressivos certamente mais belos e incisivos que o realismo original do tempo passado.

Na manhã da vida marcada pelo relógio familiar, em companhia de uma prole imensa de quinze irmãos (dos quais, Betti foi o último rebento), pais e avós, numa desafiante e dura realidade de imigrantes italianos na ambiência rural paulistana (Rafard e Sorocaba).

Anos de risadas e queixumes, alegrias e dores, crenças religiosas e superstições, de temores e de libertária força diante do difícil suporte da condição humana.

Marcados pela ancestralidade de uma época de adversidade material mas recheada das surpresas afetivas, tanto na primitiva matança de porcos como nas escutas radiofônicas, em meio à ingênua diversão de piões ou das descobertas eróticas com Carlos Zéfiro.

Inteiramente tomado pelo personagem de si mesmo, com entonação lírica, ora entre meios tons, ora em entusiásticas vocalizações, Betti assume a postura alegre, naturalista e coloquial dos velhos contadores de história.

E, neste desnudamento testemunhal de episódios biográficos, na tríplice demanda – autor/ator/diretor – vai confundindo sua trajetória com a da criação, jogando com a identidade real e a ficcional.

Num impulso estético/filosófico que une vida e arte, poesia e verdade, neste teatro de espelhos pirandelliano, onde cada espectador acaba, enfim, refletindo sobre seu próprio eu.

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