Por Washington Luiz Araújo, jornalista – 

A  turma do Bar do Gê, sempre batendo muito boca e estalando a língua, aumenta o alarido com a discussão da tal da PEC 241, que a maioria até achava que era uma nova cachaça na praça. Como de costume, coube ao Chico Sabe Tudo colocar o pingo nos is, explicando para a moçada o que vinha a ser a tal da PEC e o risco que a população brasileira corre com essa mudança na Constituição.

Com a palavra o Sabe Tudo: “Pessoal, a Proposta de  Emenda Constitucional 241 vai  congelar todos os investimentos públicos em 20 anos, corrigindo cada um deles  somente de acordo com a inflação”.

Zebrinha, como sempre dando fora, vai direto no que ouviu na rádio: “É, mas dizem que isso não é corte de investimentos, mas sim de gastos. E cortar gastos é comigo mesmo!”

Sabe Tudo rebate: “Ôooo, Zebra, mas também tem gente que fala que não é bem assim. Que o governo tem a  obrigação de manter investimentos, e não gastos, na Saúde e Educação e em outros setores. E que essa tal de PEC peca, olha o trocadilho!,  justamente porque  confunde  gastos com investimentos. Tudo na vida é evolução, Zebra. Se não evoluirmos somos enterrados vivos. E investir em Saúde e Educação é aumentar a longevidade  e melhorar nosso desenvolvimento profissional, ou seja,  é viver mais e com  mais  mais qualidade. Entendeu?” Antes que o Zebrinha responda,  entra o Pança, como sempre com a barriga chegando primeiro, já falando  da porta do boteco: “Mas estão dizendo que o país está quebrado e que precisamos cortar recu rsos”.

Sabe Tudo responde: “Não é verdade que estamos quebrados. Estávamos, isso sim, era investindo mais no povão, com o pobre colocando os filhos nas universidades e podendo fazer seu tratamento de saúde gratuitamente. E veio o golpe, patrocinado por quem tem mais dinheiro. E vocês sabem, quem te mais quer sempre mais e dane-se os que estão embaixo”.

Sempre ponderado, o Gervásio, mais conhecido como Gê, digno proprietário do boteco, já vi este filme. Sempre que o pobre começa a pôr a cabeça de fora, eles vêm e cortam. Mas, Sabe Tudo, vamos dizer que a gente precisa melhorar nossas finanças. Teria outra solução?

“Lógico que, sim, Gê. Era só taxar as grandes fortunas. Quem tem muito dinheiro tem que pagar mais impostos e o que acontece em nosso Brasil é o contrário”, respondeu de bate pronto o Sabe Tudo.

“É, mas tem gente de classe média que é contra essa tal de taxação de grandes fortunas”, entrou no papo aquele que, até  aquele momento, estava de cabeça baixa no balcão, só levantando para jogar um gole grande pela goela abaixo. Sim, ele mesmo, o Gole Grande.

“Esse  é o grande problema, Gole. Tem gente da classe média que acha que faz parte do 1% da população que só anda de jatinho e tem casa com mais de 3 mil metros quadrados construídos no Jardim Europa, igual ao Dória, esse que ganhou a Prefeitura de São Paulo enganando, dizendo que é trabalhador. “Eu quero é saber como vai ficar a Saúde e a Educação depois desta tal de PEC”, volta à carga o Gervásio.

“Olha Gê,  não vai ser fácil, não. Você viu o Drauzio Varella, aquele médico que aparece no Fantástico, falando sobre o problema que estão criando para a saúde pública?

“ Sei quem é, mas não vi.  Pelo menos no Fantástico eu não vi ele falar nada”, argumentou o Gê.

“Pois é, ele disse que equipamentos médicos e remédios sempre aumentam muito mais do que a inflação e que essa PEC vai fazer com que o atendimento médico gratuito seja reduzido drasticamente.  E os profissionais da Educação, desde o Ensino Médio até o Superior, também afirmam  que serão fechadas vagas e que o ensino público gratuito corre grande risco de acabar.

“Ué, e onde que nossos filhos vão estudar?”,  questiona, preocupado, o Zebrinha.

 “Meu filho disse que viu um vídeo de um deputado federal dizendo que tem dinheiro vai para a faculdade, quem não tem não vai. Assim que eles pensam”, comentou o Pança.

“É assim mesmo. Estamos fritos e mal pagos se a tal de PEC 241 passar. E Já passou pelos deputados federais, agora só falta o Senado”, acentuou o Sabe Tudo.

Percival Motorista, veterano guerreiro das redações, em nova edição de suas cada vez mais frequentes passagens por São Paulo, faz um comentário que resulta no completo silêncio do bar:

“Talvez exista uma solução”.

O Sabe Tudo rompe o espanto coletivo e pergunta: “E qual seria, amigo Percival?”

“Se a PEC passar no Senado, e virar emenda constitucional de fato, sempre haverá a grande chance de que ela não seja respeitada, porque, como a gente viu este ano, o respeito à Constituição não é o forte dessa turma que está aí.”

A reação geral: ninguém sabia se comemorava ou lamentava a verdade contida naquele comentário de Percival.

Prevaleceu um clima de desconcerto  no  ambiente, todos  de cabeça baixa,  como se procurassem a solução do problema no piso manchado  da cachaça destinada ao  santo.

O clima ficou tão desolador, que o sempre controlado e até considerado pão duro, Gervásio, resolveu liberar  uma rodada geral. Só assim para o povo sorrir um pouco e mudar de assunto:

 “Vocês viram o meu  ‘Parmeira’?  Meteu dois no Figueirense e não vejo ninguém na frente”, mudou de assunto o Pança.

O corintiano Zebrinha cortou o  papo rapidinho: “Já que estamos falando de congelamento, vamos congelar esse papo de futebol  até 2017?”

Só Pança discordou e continuou a falar no Menino Jesus que apareceu no seu time, mas que já vai para a Inglaterra no ano em que o futebol para a maioria será descongelado.

 Colaborou Claudio Lovato Filho, jornalista e escritor