Por Washington Luiz de Araújo, jornalista, com pinturas do artista Enio Squeff –
Várias freqüentadores em volta do balcão do Boteco do Gervásio, o popular Gê, na periferia de São Paulo.
O assunto vai do futebol à religião, do sexo à política. Palavrões são usados no debate de três desses assuntos. A exceção é a religião, que eles respeitam, lembram sempre do santo quando tomam uma talagada. Quando o papo chega à política, o Gê, como sempre, tenta inibir a coisa; na verdade quer proibir o tema, que, como ele diz, já “desarconsoou”.
A conversa fica mais apimentada quando o Chico Sabe Tudo resolve contrariar a tese da maioria e dizer que o tal do “impitiman” éuma armadilha, para não cair nessa; que é golpe.
O converseiro aumenta, pois muitos falam do que foi dito no Jornal Nacional, ou seja, que não é golpe, coisa nenhuma.
– “Tá na Constituição, mano!”, diz o Zebrinha”.
– “Tá sim, na Constituição, mas a forma como estão fazendo este “impitiman” é que está errada”.
– “Explica, então, aí, ô Sabe Tudo. Parece que engoliu um livro…”
– “Vou tentar explicar para vocês, mas não me interrompam. Pergunta só depois”.
– “Óia aí, o cara, tentando colocar regra pra cima de nós. Aqui neste balcão é democracia, mano. Falo o quanto quiser”.
– “É democracia, sim. Mas democracia enseja respeito”.
– “Fala logo e para de encher o saco de quem tá bebendo em paz”.
– “Seguinte: todo mundo aqui gosta de futebol, principalmente do meu Coringão. Certo?”
– “Errado, aqui tem bambi, tem porco e até peixe. Não vem com esse papo de gambá”.
– “Bom, como eu ia dizendo, todo mundo gosta de futebol. E vou explicar fazendo então uma metáfora”.
– “Meta, o quê? Não vem meter nada aqui, não. Que papo, esse de metá… Como se fala mesmo?”
– “Metáfora, metáfora! É quando a gente quer explicar uma coisa usando outra como comparação. Vamos supor que as regras do futebol são a Constituição. Essas regras servem para que o futebol não caia na zona, na balbúrdia. Aí, pergunto para vocês: expulsão faz parte do futebol?”
– “Ôooo, Chico Sabe Tudo, tirando sarro da gente, mano?”
– “Então, expulsão faz parte das regras do futebol. Mas, para o cara ser expulso de campo, ele precisa aprontar muito: fazer falta violenta, praticar o antijogo, xingar o juiz….”
– “É, mas outro dia, no jogo do Corinthians o juiz….”
– “Zebrinha, quer deixar eu falar? Quer ser expulso do bar pelo Gê?”
– “Vem expulsar, vem, vem se é macho”.
– “Calma, meu amigo. O que eu estou tentando falar é que o “impitiman” que estão querendo para a Dilma é ilegal, pois as tais pedaladas que ela teria dado são lances contábeis, que não são crimes. O livro com as regras do jogo, a Constituição, não toca nesse assunto!”.
– “Iiiiiih, ela também dá suas pedaladas, igual ao Robinho?”
– “Não, Zebrinha, é outro tipo de pedalada. Ela pegou dinheiro emprestado com a Caixa Econômica para pagar o Bolsa Família, porque naquele momento o Tesouro Nacional estava sem recursos. Só isso. E a Caixa é um banco 100% público. Ou seja, ela pegou dinheiro dentro de casa para pagar o Bolsa Famíliae não deixar de atender os mais necessitados. E pagou a dívida. E na Constituição não está escrito que quem faz pedalada fiscal deve ser impedido de exercer cargo de presidente, governador ou prefeito.
– “E só por isso ela tá correndo risco de ser “impinchada?”
– “Tá vendo, Zebrinha, como é bom ouvir de vez em quando as pessoas e não ficar só nesta de acreditar em Jornal Nacional, rádio que só fala desgraça ou manchete de revista desmoralizada? Pedalada é quase como você pegar uma grana no cheque especial”.
– “Entendi. Então já vou indo, se não quem vai ser impedido de entrar em casa vai ser eu. Seu Gervásio, o senhor pode pendurar minha conta, pago no fim do mês”.
– “Olha aí o Zebrinha querendo pedalar pra cima de mim, pessoal! Nada feito! Pega dinheiro emprestado aí com o Sabe Tudo e me paga. Quer pedalar, pedale. Mas com dinheiro e pague tudo, como a Dilma fez. E vamos acabar com este papo. Peçam logo a saideira, que nunca é uma só”.