O eclipse lunar deste final de semana

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Por Ulisses Capozzoli, jornalista

Além da guerra na Ucrânia pelo menos sete outros conflitos armados se desenvolvem no mundo neste momento. No Brasil há confrontos não declarados, além de crise econômica e perspectiva de aprofundamento do desemprego. Sem ser uma forma de alienação, mas busca de reflexões necessárias a mudanças, é um momento promissor para acompanhar o eclipse total da Lua que ocorre na passagem da noite do próximo domingo (15) para a madrugada de segunda-feira.




O completo ocultamento da Lua pela sombra da Terra projetada no espaço pode ser observado de áreas urbanas, das janelas de apartamentos, por exemplo, mas o ideal é estar na natureza, longe da iluminação artificial: na praia, no campo ou nas montanhas.

Observadores que estiverem na natureza devem estar equipados para as noites frias típicas do outono, com temperaturas mais baixas e razoável umidade atmosférica, o que intensifica a sensação de frio.

Em São Paulo o eclipse penumbral, com ligeiro escurecimento da Lua, começa às 22h32 e pode não ser muito notado. O parcial, no entanto, uma “mordida” no brilho lunar, é evidente e se inicia às 23h27 crescendo até encobrir todo o disco aparente da Lua, aos 29 minutos da segunda-feira.

Exatamente a 1h11 da madrugada um observador (a menos que o céu fique encoberto por chuvas, o que é improvável) estará acompanhando o meio do eclipse, que se estende até 1h53 quando a fase de totalidade se encerra e o brilho lunar reaparece recortado no céu, retomando o eclipse parcial que se estenderá até 2h55.

Então o eclipse penumbral retorna e se estende até 3h50, quando todo o processo se encerra e a Lua retoma a forma de uma reluzente moeda de prata. Incluindo todas as etapas, o eclipse terá duração total de 5h19 minutos e isso devido à maior proximidade Terra-Lua.

Na terça-feira a Lua atinge o perigeu, ponto mais próximo da Terra em sua órbita eliptica.Eclipses lunares só ocorrem com a Lua em fase cheia, quando a Terra está posicionada entre o satélite e o Sol e podem ser penumbrais, parciais ou totais, dependendo do alinhamento relativo entre os astros.

Mas por que, toda vez que a Lua entra em fase cheia, não ocorre um desses tipos de eclipse? A resposta é dada pela órbita inclinada da Lua em torno da Terra, de 5º (cinco graus). É preciso uma “coincidência” de movimentos/alinhamentos sincronizados para que um eclipse ocorra, o que também vale para um eclipse solar.

Neste segundo caso, o que muda é a posição relativa dos astros, com a Lua posicionada entre a Terra e o Sol, encobrindo a estrela-mãe com seu disco aparente. Neste caso também pode ocorrer um eclipse parcial, anular ou total em função tanto de alinhamentos quanto de distâncias relativas.

Em um eclipse solar anular a Lua está mais distante da Terra em sua órbita elíptica (forma de um anel achatado), incapaz de encobrir todo o disco aparente do Sol. Uma observação para futuros moradores da Lua, geração que já nasceu/nasce, será acompanhar não necessariamente eclipses, mas a Terra em fase cheia, um espetáculo que a maioria de nós, confinados à Terra, não terá chance de desfrutar mas que marcará um grupo crescente de privilegiados.

Mais uma razão para acompanhar o eclipse deste final de semana e refletir sobre mudanças, nem todas desfavoráveis, ainda que ameaçadas por circunstâncias que envolvem as mais diferentes formas de manifestação de apego ao poder despótico de poucos sobre a maioria.

Neste fim de semana a Lua estará localizada no interior da constelação zodiacal de Libra elevando-se no horizonte Leste logo ao anoitecer, o que já é uma cena de rara beleza. Lua cheia compromete a visão de chuva de meteoros mas, desta vez, o eclipse deverá permitir a observação de Eta Aquarídeos, geradas por restos deixados pelo cometa Halley em suas passagens pelo periélio (máxima aproximação do Sol em uma órbita elíptica).

Meteoros, conhecidos como “estrelas cadentes” são, quase sempre, corpos do porte de um grão de arroz/milho destruídos pelo atrito com a atmosfera e suas cores dependem de suas composições químicas. Eta Aquarídeos tem pico de intensidade entre 5 e 6 de maio, mas se estendem até 28 de maio.

Uma reflexão que observadores do eclipse lunar dessa semana podem fazer é que, não fosse a presença da Lua, poderíamos não estar aqui. A razão disso? A Lua atua como uma espécie de escudo da Terra devido tanto ao seu porte (o sistema Terra-Lua é considerado um sistema planetário binário) quanto proximidade. Bólidos do espaço profundo (que foram mais constantes no passado remoto, na verdade entulhos da formação do Sistema Solar) poderiam ter atingido a Terra (alguns atingiram, entre eles o que eliminou os dinossauros, há uns 65 milhões de anos) e inviabilizado os humanos entre outras formas de vida ditas “superiores”.

Eclipses lunares, ao contrário dos solares que exigem proteção especial para a visão, podem ser observados a olho nu. Binóculos e telescópios, no entanto, pemitem acompanhar o escurecimento da superfície lunar.Uma última informação que pode ser do interesse geral: o número máximo de eclipses ao longo de um ano varia de mínimo de quatro a máximo de sete com combinações que se alteram no tempo como cinco eclipses solares e dois lunares ou cinco lunares e dois solares. Ou ainda quatro solares e três lunares e quatro lunares e três solares.

Os eclipses lunares deixaram de fornecer informações científicas. O avermelhamento lunar, no entanto, ainda dá algumas pistas interessantes mas não imprescindíveis: quanto mais intenso mais poluída a atmosfera da Terra atravessada pelos raios solares.

Atividades vulcânicas, por exemplo, podem alterar o avermelhamento de um eclipse lunar total.Eclipses foram previstos desde a antiguidade, mas isso não eliminou o medo que costumavam provocar, em especial os eclipses solares. Na Roma antiga tochas costumavam ser acesas numa mescla de fascínio e medo.

Na China, rituais com batidas de tambores tinham como propósito “assustar o dragão que tentava devorar o Sol”, ainda que, aqui também, haja um misto de temor e ritual inseparável de uma cultura. De qualquer maneira a previsão acertada de eclipses foi e ainda é uma forma de afirmação do conhecimento científico.

Na última das quatro viagens para a América Cristovão Colombo manipulou com astúcia indígenas (29 de fevereiro de 1504) para controlar uma revolta a bordo por conta de abastecimento negado por eles. E, um eclipse solar visto como total em Sobral, Ceará, em 29 de maio de 1919, confirmou a previsão de Einstein de que um corpo de grande massa desvia a direção de raios luminosos.

Eclipses lunares estão presentes em um dos álbuns mais clássicos da história do rock: “Dark Side of the Moon”, da banda inglesa Pink Floyd onde se canta, entre outras frases: “Voe nas asas da fantasia/mais alto que os olhos possam ver/enviamos a nossa música favorita/do lado escuro da lua/ do lado escuro da lua…” enquanto uma voz ao fundo previne: “Não existe um lado escuro da Lua”, o que é verdade. O que existe é um lado oculto da Lua, com uma face sempre voltada para a Terra por razões de natureza gravitacional, mas não um lado escuro.

Quando a Lua está em fase nova, por exemplo, o lado oposto à Terra é plenamente iluminado pelo Sol. Uma ótima observação a todos que, neste próximo fim de semana, levantarem os olhos para o céu.

Há muito tempo andamos cabisbaixos, olhando, com postura derrotada para o chão. É hora de levantar os olhos para o céu.

Imagem: estágios de um eclipse total da Lua como o que ocorre na noite de 15 e madrugada de 16 próximos. Neste caso, eclipse observado em 25 de novembro do ano passado. Jean-François Gout/APOD.

Dados de horários citados: Time and Date.

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