Por Murilo C. S. Oliveira, publicado no Portal Jurídico Justificando –
Em tempos de reforma trabalhista e plataformas digitais de trabalho, a luta contemporânea dos trabalhadores assalariados em busca de dignidade no trabalho encontra ainda mais dificuldades. Isto porque a cena trabalhista pode ser bem sintetizada por uma profusão, de caráter global, do desmoronamento da proteção ao trabalhador assalariado.
A seara política-jurídica é guiada, infelizmente, pela conjunção de ultraliberalismo e Estado Pós-democrático[1] que forja a contextualidade do retorno empoderado da desregulação e flexibilização no Direito do Trabalho. Não mais o projeto constitucional ou o respeito aos direitos fundamentais importam, basta a eficiência econômica, cujos resultados são naturalmente apropriados pela minoria da elite econômica.
A compreensão de que o neoliberalismo age como “sistema normativo”[2] indica que os momentos de crise econômica vivenciados no capitalismo ocidental têm servido como oportunidades de fortalecimento deste ultraliberalismo, graças à hegemonia que esta racionalidade alcançou sobre Estados, burocracias, poderes, partidos, sociedade civil e indivíduos.
Tal racionalidade constitui uma subjetivação do trabalhador como “homem-empresa”, ou seja, empresa de si mesmo em competição com os demais no mercado de trabalho e, assim, disposto a sujeitar-se a constantes avaliações, numa naturalização da subserviência e uma assimilação interna da disciplina.
Pela lógica deste Estado mínimo para realizar os Direitos Sociais e, antagonicamente, máximo no discurso da promoção da segurança pública e seu seletivo sistema de justiça criminal, o Direito do Trabalho deveria ser reformulado para incorporar as novas razões empresariais e concorrenciais, eliminando-se o seu caráter protecionista e glorificando a autonomia individual como se o contrato de emprego se desse entre contratantes em situação equânime.
A conseqüência instantânea deste ultraliberalismo no Estado Pós-Democrático é o refazimento legislativo do Direito do Trabalho. No Brasil, a contemporaneidade tem sido de contínua desconstrução do sistema protetivo trabalhista.[3]
Primeiro, uma apressada e pouco debatida tramitação da reforma trabalhista em tempo recorde, o que torna razoável, no campo da opinião política, considerá-la como ilegítima e não representativa. Não cabe aqui pormenorizar, mas a reforma representou desproteção trabalhista no campo individual, coletiva e processual. Há, ainda em 2019, uma possibilidade de uma segunda “reforma trabalhista” com suspensão de direitos em razão da crise econômica, como resultado da conversão em lei da Medida Provisória denominada de “liberdade econômica”.
Segundo, a extinção do Ministério do Trabalho neste ano. Ora, a eliminação do Ministério específico que cuidava da fiscalização do ambiente de trabalho, cumprimento da legislação e do acompanhamento dos Sindicatos, é claro indicativo do esvaziamento da ação estatal sobre o mundo do trabalho.
Trata-se de um enfraquecimento da política pública estatal – a qual não deveria ser modificada por governos passageiros, inclusive porque está assentada no texto constitucional – de intervenção nas relações de trabalho. Se esse desmonte prosseguir – oxalá que não ocorra – também tornará obsoleta ou desnecessária tanto a Justiça como o Ministério Público especializados na área trabalhista.