O indiscreto e muito burro charme da burguesia

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Por Ângelo Cavalcante, Economista e professor da UEG –

Quase morri de tanto rir! Gargalhei que meu vizinho da frente me enviou mensagem com simpático e irônico “Você está bem?”. Respondi que “sim”; bom, explico… É que vi e todo mundo viu o vídeo que se alastrou nas redes sociais onde militantes pró-Lula carimbavam dinheiros “merrequentos” com o rosto do ex-presidente e o já universal “Lula Livre!”.

Então… Na mesma hora, conservadores/atrasados/mumificados emendaram críticas ou quase críticas ao estilo: “cretinos, estão destruindo patrimônio público”; “criminosos!” ou com alguma sorte, comedidos “arruaceiros”.




É o fetiche do fetiche! Por sinal, a palavra “fetiche” vem de “feitiço”; é esse ardil que hipnotiza, que controla e manipula sensações, percepções, sensibilidades e o indivíduo fetichizado passa a ser, por conseguinte, um ser dominado por algo que só ele vê; que só ele percebe ou identifica. Ninguém mais!

Foi justamente isso! Vamos para a economia monetária! O dinheiro ao qual somos apaixonados, viciados e  presos é, na verdade, “meio de troca”. Dinheiro, esse nosso dinheiro e que usamos todos os dias, é título, um papel com valor fiduciário; quer dizer, um ente, no caso o Estado, por intermédio de seus órgãos de gestão monetária, lhe atribui respectivo valor.

Quero dizer que aquela nota de “cem reais” vale cem reais porque o Ministério da Fazenda/Banco Central lhe conferiu o valor de “cem reais”; da mesma forma, aquela notinha de “um real” vale um real exata e precisamente porque o Estado lhe conferiu este valor. É mera convenção!

De outro modo, a nota de “cem reais”, de “cinquenta reais” ou “um real” é exata e precisamente, papel impresso! Por mais bonito que seja, por mais estilizado e artístico que nos pareça é, enfim, papel impresso. Nada, além disso!

Aliás, a cunhagem de uma moeda de “um real” com seus detalhes, entremeios, insígnias e escritos é bem mais cara do que a feitura de uma rebuscada nota de “cem reais”. Dinheiro é, enfim e geralmente, papel! Mero instrumento de troca, de intermediação e sem qualquer valor de uso em si. O que quero dizer? Quero dizer que não há ouro, rubis, esmeraldas ou ametistas na nota de cem reais; não existem pérolas nos acabamentos da nota de cinquenta reais; não existem brilhantes acabados e extraídos da minas do Níger ou do Gabão nas notas de cinco reais. É papel, papel e mais papel! Sacaram?

Me entendem? Os custos de produção da nota de “cem reais” são, grosso modo, os mesmos custos de produção da nota de “um real”. No que se refere aos seus valores intrínsecos “um real é igual a cem reais”.

A grita foi geral! Baixou a pior loucura patrimonialista, usurária e rentista.  Me impressionei! Por dez mil anos a humanidade jamais conheceu dinheiro! As pessoas trocavam as coisas! Trocavam gado por sal; trigo por lã; galinhas por farelos; tecidos por montarias; conchas por ferramentas.

Ainda hoje, mesmo no Brasil a prática do escambo é recorrente! Pessoas trocam comida por algum serviço no quintal, na manutenção elétrica ou hidráulica; a vizinha olha o filho da outra e em troca ganha uma faxina; o pai do lado leva as crianças na escola e na semana seguinte o outro pai faz do mesmo.

As pessoas usam ‘tickets’, vale-refeições, bilhetes de ônibus e fazem compras, realizam seus abastecimentos e assim vivem. É que (me entendam!), dinheiro jamais foi importante para o conjunto da população brasileira e; por razões básicas! O povo jamais o teve; as rendas e sua expressão objetiva e fenomênica na forma de dinheiro sempre esteve devidamente posta e concentrada nas mãos de meia dúzia de “eleitos”; de alguns gatos pingados “superiores” e bem “melhores do que nós”, o povo.

Deem uma “googlada” e vejam como índios, ciganos, ribeirinhos, feirantes, povos das periferias, camponeses, cerradeiros, agricultores familiares, geraizeiros, ‘biscateiros’, informais, detentos e outros segmentos fazem suas trocas! São segmentos que simples e, tão somente, trocam coisas por coisas; coisas por serviços! Mas sempre foi assim… O povo sempre produziu sua própria economia, com seus meios de troca, suas formas de valoração e, olha… Sempre foram mais democráticos e justos do que qualquer lógica monetária estatal!

E no fechar do dia de ontem, vendo militantes carimbando este “papel” estilizado e que chamamos de “dinheiro” onde clamam pela libertação do único presidente que deu alguma confiança para pobre, pipocam vídeos da soldadesca dos ricos do país, nossa horrenda classe média, denunciando este “grave crime” contra o patrimônio “nacional”. Patrimônio de quem, “cara pálida”? Como sempre defendendo o patrimônio dos ricos… Só se for!

Por sinal, ontem um prédio desabou sobre pobres no centro da principal cidade do país; as ‘carpideiras do dinheiro alheio’ nada disseram! Criminosos fascistas meteram tiro de “ponto nove” contra o acampamento artístico e completamente pacífico de apoio ao Presidente Lula em Curitiba, de novo, nada disseram mas… Alguns carimbos em cédulas/papel de troco causam o maior alarido do ano! Pirei…

Lula Livre!

Ângelo Cavalcante – Economista, professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), campus Itumbiara.

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