O amor de nossa imprensa pelas irrelevâncias é o maior combustível das vaidades jurídico-policiais das subcelebridades da lei em nosso país.
Hoje de manhã, dois “assuntos” foram ímãs para curiosidade fútil dos leitores dos sites da Folha e do Estadão: a “investigação” do Ministério Público sobre “os objetos que teriam sido levados” pelos últimos quatro ex-presidentes (Collor, Itamar, FHC e Lula) e uma carta precatória para que Lula seja ouvido sobre uma menção sobre um suposto favor que teria feito a um empresário italiano amigo de Silvio Berlusconi.
Começo pela segunda nota. Brizola depôs não uma, mas dúzias de vezes nos anos em que eu o acompanhei diariamente como seu assessor de imprensa. Tendo ou não tendo a ver com casos, todo mundo o citava, aqui e ali e ele cumpria o seu dever de dar esclarecimentos, a maior parte das vezes para dizer que nada sabia sobre o assunto.
A coisa mais comum na política é algum esperto dizer que é amigo, faz ou recebe favores de alguém importante. Lembro-me que, no início dos anos 90, quando o Governo do Estado fazia uma licitação para a escolha de agências de publicidade, um certo cidadão me ligou pedindo que eu ajudasse uma agência tal, porque seria do interesse do General Figueiredo (ele mesmo, o João Batista de Oliveira).
Óbvio que era cascata. Mas em lugar de arranjar uma encrenca ou dizer desaforos, simplesmente falei: “Claro, fulano, sem nenhum problema, é só o general me ligar que vou ter o máximo prazer de atendê-lo”.
Nem é preciso dizer que jamais houve um telefonema, porque o General não estava pedindo coisa alguma, mas tinha um esperto usando o nome dele.
Dito isto, à primeira notícia. A nota é tão “sensacional” que nem sequer diz o que teria “sumido”.
Será que os nobres integrantes do Ministério Público não têm o que fazer? Por acaso os ex-presidentes levaram alguma estátua do Victor Brecheret, lindas, lá do Salão Nobre? Ou levaram os quadros do Di Cavalcanti para pendurar na parede de casa?
Francamente, não seria melhor pedir-se logo que os doutos procuradores, na hora das mudanças de presidente, ficassem lá, na porta, igual àquelas patroas escravocratas que revistam a bolsa da empregada na saída do trabalho e vissem se não está indo um cinzeiro, um par de talheres, um jogo de fronhas de linho?
É obvio que ex-presidentes são, perante a lei, cidadãos iguais a todos. Mas, politicamente, não são, porque – pelo menos em relação a alguns, mas nem tanto àquele que os mandava engavetar tudo, há uma multidão de procuradores e delegados que sabem que isso vai “render” na mídia, pouco lhes importando a exposição asquerosa de pessoas ou da memória de pessoas. Para que sejam iguais a todos, ser discreto é um dever da autoridade pública que com eles tenha de lidar, porque esclarecimentos pedidos a qualquer qualquer pessoa o são sem que isso vire chamada nos jornais, porque absolutamente normais.
Digamos que são como aquele “delegado do bombom” sem ridículo midiático, porque a mídia aceita, sobretudo em relação a Lula o “fulano disse que o beltrano lhe contou que o Lula…”.
Nunca achei que ia ficar com saudade do tempo em que abobrinha se comprava na feira e os Mexericos da Candinha eram só uma seção da Revista do Rádio.