O jornalismo de implicância, por Luís Nassif

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Jornalismo brasileiro parece ter perdido totalmente a noção de relevância. O que se tem é um palpitômetro vazio

Por Luis Nassif, compartilhado de seu Blog




Na foto: Presidente Lula durante café da manhã com jornalistas, no Palácio do Planalto. Foto: Ricardo Stuckert / PR

Há muito o que se criticar em Lula. Pode-se discutir a fala de indicação de um caminho claro de desenvolvimento, a desarticulação ministerial, as seguidas concessões à Câmara, ao mercado e às Forças Armadas.

Mas o jornalismo brasileiro parece ter perdido totalmente a noção de relevância. O que se tem é um palpitômetro vazio, superficial, palpite de rede social, de quem não parece dispor de mínima condição de uma crítica fundamentada, praticando exclusivamente o jornalismo de implicância.

Alguns exemplos.

Lula e o terrorismo de Israel

Na Folha, a colunista que se julga ferina, propõe ironicamente “Lula para o Prêmio Nobel da Paz”. Qual a crítica? 

“Para Lula, “Israel também está cometendo vários atos de terrorismo”. Confunde supostos crimes de guerra, aos quais Israel poderá responder no futuro, com terrorismo puro”.

Qual a definição de terrorismo pela ONU (Organização das Nações Unidas):

“Atos criminosos pretendidos ou calculados para provocar um estado de terror no público em geral […]“

E, aí, a conclusão fantástica, filha direta do “mata mas não estupra” de Paulo Maluf:

“Não há notícias de que o Exército de Israel, por mais letal e condenável que seja sua ação, esteja estuprando mulheres, arrastando-as pelas ruas, assassinando pais na frente de filhos e vice-versa, queimando e decapitando gente ainda viva, com o único objetivo de aterrorizar as pessoas e pelo prazer de matar”.

Nem se discuta a maneira como endossa acriticamente todas as versões de Israel, do Hamas comedor de criancinhas – dados que são questionados até pelos setores liberais do país. Mas, segundo a douta comentarista, Israel pode ser taxado de genocida, assassino, criminoso. Mas não de terrorista. Nunca ouviu falar do conceito de terrorismo de estado. Ah, bom!

O caso Márcio Pochman

Essa tese, do terrorismo de Israel, só é superada pela inacreditável reportagem, : “Afirmações de presidente do IBGE sobre China e mudança em comunicação preocupam ala de ex-técnicos do órgão”. E o subtítulo: “Pochmann também disse que atual forma de comunicação com imprensa ficou para trás”

Segundo a matéria, as preocupações são de uma ala de ex-técnicos do órgão e pesquisadores de fora do Instituto” – sempre no genérico. Na verdade, é um artigo chupado de um artigo de uma ex-diretora do IBGE, e, depois, utilizado em copy-paste por diversos veículos.

Mas, afinal, o que Pochman falou de tão grave:

  • avaliou que a produção de estatísticas do IBGE foi construída somente a partir de práticas respaldadas em países do Ocidente, como InglaterraEstados Unidos e França. Para ele, há uma “mudança de época” em vigor, e boas experiências também partem hoje do Oriente. Nesse sentido, o economista citou trabalhos desenvolvidos pela China.

Alguma dúvida sobre a que ele se refere? Mudanças fundamentais ocorrendo na economia e na sociedade, e ele propõe que se busquem mais modelos para se agregar aos indicadores do IBGE.

Mas, segundo o jornal,  “a fala deixou em alerta pesquisadores que veem falta de transparência do país asiático na área estatística”.

Outra afirmação de Pochman, questionada, foi a de que:

“A comunicação do passado era aquela em que o IBGE produzia as informações, os dados, fazia uma coletiva e transferia a responsabilidade para o grande público através dos meios de comunicação tradicionais. Isso ficou para trás”, disse Pochmann.

“Hoje cada um de nós tem a capacidade de comunicação, é um produtor de informação também, de análise, de opinião. Isso tem gerado uma sociedade complexa, inclusive pelo fato da difusão de fake news, de mentiras”.

As grandes discussões econômicas se dão em cima de indicadores. E a mídia explora compulsivamente apenas os indicadores de mercado. É óbvio que o acesso de mais pessoas aos indicadores do IBGE é uma medida de democratização da informação.

Para o jornalismo de implicância, a declaração de Pochman é uma maneira de não se submeter ao escrutínio  do “jornalismo profissional”.

Enquanto isso, nenhuma matéria sobre o desmonte do órgão no período Temer-Bolsonaro, com suspensão de concursos e restrição de salários.

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