“O melhor que podíamos fazer”, um diálogo entre a literatura e o Direito

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Por Maciana de Freitas e Souza, publicado em Justificando

“O melhor que podíamos fazer”: através desse relato autobiográfico, Thi Bui deixa a mensagem de que o encontro com a diferença é uma tarefa ética/política

A leitura desse livro de pouco mais de 300 páginas chamou muito a minha atenção… e por vários motivos. Em primeiro lugar, pela forma como ele é escrito. “O melhor que podíamos fazer”, da escritora Thi Bui, chegou as minhas mãos, através do projeto Leia Mulheres Apodi. Apesar de ser um quadrinho, ao longo da narrativa o leitor encontra fortes críticas ao regime vigente. A partir de suas memórias, Bui narra a experiência da infância e o processo de imigração de sua família após a queda do Vietnã do Sul, na década de 1970.

Em segundo lugar, pela temática abordada. A leitura é muito relevante para o atual momento. A história tem como pano de fundo a Guerra do Vietnã e os desafios da família de estar longe da sua cultura e terra ao fugirem para os Estados Unidos. A leitura fica ainda mais rica quando se percebe que The Bui faz referência a atual crise dos refugiados, que deslocam-se por conta de perseguições políticas e religiosas, violações de direitos humanos e questões econômicas. Ao se propor a refazer a memória de sua família, Bui, na verdade, conseguiu falar sobre esse fato que deixou suas marcas permanentes na história – e que o mundo não aprendeu muito com o passado.




Ilustração da capa do livro O melhor que podíamos fazer da escritora vietnamita Thi Bui.

Thi Bui consegue despertar reflexões, tratando de temas que exigem uma sensível e tocante maturidade. Por meio da narrativa, é possível perceber que,para sobreviver, estas famílias fogem em busca de segurança. Mas, suaspreocupações ao chegarem em outro país – a procura de trabalho e melhores condições de vida – acaba automatizando a comunicação. Nesse processo, a narrativa mostra que, muitas vezes, a transmissão da figura paterna é um processo de atenção, cuidado e, principalmente, disponibilidade – não só de tempo, mas de afeto. A autora relata as agressões do pai contra a mãe – e relata que também sofreu com essa violência. Os episódios relatados revelam situações que iriam marcá-la pelos anos que estavam por vir. Da mesma forma que na narrativa, no cotidiano inúmeras crianças estão em um contexto de relações não simétricas, de violações de direitos.

“O melhor que podíamos fazer”: ao final, terminei a leitura com a sensação de ter lido não apenas uma história em quadrinhos sobre a infância. Me chamou a atenção a capacidade que a autora tem de falar sobre as configurações familiares – algumas das quais podem se tornar um espaço denso quando não há dialogo e escuta de fato –, bem como sobre o processo de perda de identidade de indivíduos forçados à deixarem seu país em uma sociedade repleta de preconceitos contra os refugiados.

Além de permitir uma imersão nos conflitos internos das personagens, há uma perspectiva política, ao falar sobre a questão migratória e as lembranças devastadoras de uma guerra. Thi Bui, nos deixa a mensagem que o encontro com a diferença é uma tarefa ética/política que deve ser mantida e, através desse relato autobiográfico, nos ensina muito não só sobre fatos históricos, mas também sobre a importância do respeito aos direitos humanos.

Maciana de Freitas e Souza é bacharela em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN).

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